O autarca lembra que a transferência de competências da Administração Central para os municípios não está a ser acompanhada do devido envelope financeiro. E diz que a breve prazo poderá agir judicialmente. Aborda o hospital do Seixal, os problemas sentidos com a Fertagus e a Transtejo e revela as conversas mantidas com o ministro das Infraestruturas e a secretária de Estado da Mobilidade
Paulo Silva, presidente da Câmara do Seixal, iniciou o ano a bater à porta dos governantes. Em cima da mesa estão os problemas com a mobilidade, nos transportes públicos ferroviário e fluvial, bem como os investimentos futuros previstos e anunciados pelo Governo. Em entrevista concedida a O SETUBALENSE e à Rádio Popular FM, o edil debruça-se também sobre a construção do hospital do Seixal, que não pode ser mais adiada, sob pena de se perder financiamento ao abrigo do PRR. E deixa uma garantia: “Não me canso de bater a todas as portas que forem precisas para defender os interesses do concelho e dos munícipes do Seixal”.
Com que sensações é que saiu da Assembleia da República, após a entrega da petição pela construção do hospital do Seixal?
A construção do hospital do Seixal é urgente e só não vê quem não quer. Agora, tem de haver vontade política. Saí com a certeza de que esta petição vai ser discutida em plenário da Assembleia da República ainda este ano. É mais uma pressão sobre o Governo, para que essa vontade política venha a surgir. De momento, o projecto está pronto, falta a última fase, que é a revisão do projecto para depois avançarmos para o concurso público. Não posso deixar de dizer que o processo esteve parado mais de quatro anos, porque aquando do concurso público para a elaboração do projecto a empresa que ficou em segundo lugar impugnou judicialmente o mesmo.
Não é um investimento de grande monta para o Governo…
… É um investimento de cerca de 60 milhões de euros, mas os seixalenses pagam em impostos para o Poder Central, por ano, mais de 400 milhões de euros. Portanto, é 15% dos impostos que os seixalenses pagam, não estamos a falar de muito. E se não formos rápidos na construção, também vamos perder os fundos do PRR para o equipamento do hospital.
Então acredita que pode estar construído até final de 2026?
Acredito que o processo tem de andar e que é urgente. Está inscrita verba no Orçamento do Estado, portanto, não há constrangimentos orçamentais para o processo não andar. Tem é de haver vontade política. Tenho uma reunião pedida há vários meses à sra. ministra da Saúde. No próximo dia 17, vamos lançar a primeira pedra do Centro de Saúde de Foros de Amora, com financiamento PRR, mas também com forte investimento da Câmara, na ordem de 1 milhão de euros. Se a sra. ministra estiver presente, voltarei a falar na questão do hospital. Ou então, quando estiver num evento do Ministério da Saúde, também ainda em Fevereiro, para o qual me convidou.
Que leitura faz do anúncio da ministra sobre um eventual fecho da maternidade do hospital do Barreiro?
Já há problemas de funcionamento na maternidade do Garcia de Orta. Se vamos concentrar tudo no Garcia de Orta, os problemas vão aumentar. Consideramos que não devia fechar a maternidade no hospital do Barreiro.
Os comboios da Fertagus passarem a circular de 20 em 20 minutos acabou por ser um presente envenenado, para os utentes do Seixal? O senhor reuniu-se com o ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, e com a secretária de Estado da Mobilidade, Cristina Pinto Dias. Não se tem cansado de bater à porta do Governo neste início de ano…
Andei de comboio à hora de ponta, estive ao lado dos meus munícipes para ver como é feito o serviço. Não me canso de lutar pelo concelho do Seixal e de bater a todas as portas que forem precisas para defender os interesses do concelho do Seixal e dos munícipes. Para isso tenho pilhas Duracell.
Como costumo dizer, o Seixal está sempre do lado da solução e de encontrar soluções para os problemas, mas também está sempre do lado da reivindicação por aquilo que não é feito. Tenho recebido muitas queixas dos munícipes e decidi ir ver como está a ser feito o serviço. As pessoas estavam como sardinhas enlatadas. Não é um serviço com o mínimo de qualidade, não é o modo como as pessoas devem de ir para o trabalho. Tem de haver uma solução.
Também está em causa a segurança?
Sem dúvida. Aliás, no dia em que fiz estas viagens, o INEM foi chamado para socorrer três utentes que se sentiram mal durante o trajecto do comboio. Tudo isto tem consequências para a saúde e para o próprio movimento pendular.
Mas a circulação de 20 em 20 minutos foi um presente envenenado?
Não tenho dúvidas de uma situação… sei que é necessário mais material circulante e que o Governo veja rapidamente onde o consegue ir arranjar para se fazer o serviço. A Fertagus disse-me que lhe tinha sido prometido, quando alargou a operação a Setúbal, mais cinco comboios, o que dava mais 20 carruagens. O sr. ministro das Infraestruturas disse-me que isso não era verdade. Tenho aqui duas versões, não sei qual é a correcta.
Trouxe consigo alguma garantia por parte do ministro ou da secretária de Estado?
A secretária de Estado disse-me que está a fazer todas as démarches para conseguir, no mais curto espaço de tempo, aumentar o material circulante. Estou a aguardar, sendo que vou continuar activo nesta luta por melhores condições na Fertagus. Do modo como está a ser feito o transporte, não pode continuar.
Equaciona voltar a bater à porta do ministro ou da secretária de Estado?
Claro que sim. Irei bater a todas as portas que sejam necessárias. Tenho ainda de dizer o seguinte: tive uma reunião com a Fertagus, na qual me foi dito que entre as 7 e as 9 da manhã a taxa de ocupação dos comboios era de 65%. Contraria tudo aquilo que eu vi. Pedi aos munícipes para enviarem fotografias de como está a ser feito o serviço e tenho recebido dezenas e vídeos também. Já recebi vídeos de agressões físicas das pessoas a tentarem entrar para o comboio. Isto demonstra o serviço caótico que está a haver na Fertagus.
No transporte fluvial as coisas também não estão melhores. Houve a aquisição de barcos eléctricos. Esperava-se que, por esta altura, as coisas navegassem em águas calmas, mas isso não se tem verificado.
Não viajei apenas na Fertagus, também viajei na Transtejo. Decidi ir para Lisboa, para a reunião com o sr. ministro Miguel Pinto Luz, no barco das 8h55. Foi suprimido. Durante essa manhã, foram suprimidas quatro carreiras. E isto não dá confiança à população. Vi o desespero da população. Apanhei o barco das 9h15, que me fez chegar 10 minutos atrasado à reunião com o sr. ministro. Mas, enquanto lá estive, houve três carreiras que foram feitas. Duas delas iam à volta dos 70% da capacidade da embarcação. A carreira onde fui não devia de ir a 50% da sua capacidade. Ou seja, enquanto temos o serviço da Fertagus sobrelotado, depois temos o serviço fluvial com capacidade para levar mais pessoas. E por que não leva? Porque as pessoas não têm confiança na fiabilidade daquele serviço, face às constantes supressões.
Tinha sido prometido que com os barcos eléctricos os problemas existentes no Seixal seriam resolvidos. A Câmara Municipal, para incentivar as pessoas a aderirem ao transporte fluvial, ficou com o parque da Transtejo e transformou-o gratuitamente. Mas os problemas mantêm-se. E mantêm-se porque está a haver problemas no carregamento [das baterias] destes barcos.
Mas, a presidente do Conselho de Administração da Transtejo garantiu que o carregamento das baterias demoraria 7 minutos.
Não tenho dúvidas de que demoram muito mais tempo a carregar. Faz-se uma carreira, o barco entretanto chega e a carreira seguinte é suprimida porque o barco ainda não está carregado. Está a demorar muito mais tempo.
A sra. secretária de Estado disse-me que iria ter uma reunião com a empresa que fabrica os barcos e com a empresa do sistema de carregamento para ver se conseguiam resolver os problemas. O mais ridículo é que às vezes o sistema de carregamento não funciona mesmo e tem de se fazer o carregamento recorrendo a geradores a gasóleo.
Pelo que sei, a administração da Transtejo ainda só recebeu cinco barcos. Diz que não recebe os outros cinco, que estão prontos, sem estarem a funcionar devidamente, sem os problemas estarem resolvidos.
Na ordem do dia tem estado a extensão do Metro Sul do Tejo (MST) à Costa de Caparica. Mas o senhor tem vincado que o Seixal deve ser a prioridade. Porquê?
No contrato de concessão está que o MST irá até ao Barreiro em três fases. A fase 1, que vai até Corroios, que é a única que está construída; a fase 2, que irá até ao Fogueteiro; e a fase 3, Fogueteiro-Seixal e depois Seixal-Barreiro. É o que está no contrato de concessão, não está mais nenhuma outra linha. Estão agora a desenvolver-se estudos para o MST ir até à Costa de Caparica. Não contesto que vá até à Costa de Caparica. O que digo é que primeiro tem de se fazer o que está no contrato de concessão. Vamos primeiro levar o MST até ao Fogueteiro, depois até ao Barreiro, e a seguir avancemos para outras linhas que são necessárias, que fazem falta, como estas também fazem. Agora, não se pode é não avançar com o que está contratualizado desde 2002 ou 2003 para se avançar em outras linhas que, no meu entender – e agora aqui vou ser polémico – não são tão prioritárias. Se o MST chegar ao Fogueteiro, vai servir mais de 50 mil pessoas da freguesia de Amora. Se for até à Costa de Caparica, o MST, que já chega até à Universidade [FCT], nem 20 mil vai servir. O grande fluxo vai ser no Verão, com as idas para a praia. O que se vai priorizar, quem vai para o trabalho ou quem vai para a praia?
Para o MST chegar à Estação de Foros de Amora, e fazer a interface com a Fertagus, basta construir 1,8 quilómetros de linha. Não é muito. Os terrenos estão disponíveis. A solução de carril até Foros de Amora não tem grandes problemas, é fácil. Depois, a partir daí, penso que a solução terá de ser BRT. Hoje [sexta-feira passada] recebi a informação de que a Autoridade Metropolitana de Transportes e a Carris iriam também começar a fazer o estudo das fases 2 e 3 do MST. Exactamente como estão a fazer do MST para a Costa de Caparica. Foi uma boa notícia que recebi. Valeu a pena esta luta, em que não estive só, porque tive uma reunião também com o sr. presidente da Câmara do Barreiro para alertarmos que primeiro devem avançar as fases 2 e 3 do MST.
Aproveitou para abordar com Frederico Rosa a ponte entre Seixal e Barreiro. Esse também foi tema nas reuniões que manteve com os governantes?
Abordei esse tema com o sr. presidente da Câmara do Barreiro e também com o sr. ministro Miguel Pinto Luz.
O que lhe disse o ministro?
O contrato de concessão com a Lusoponte vai terminar em 2030 e estão a preparar o concurso para o novo contrato de concessão em que vão meter a terceira travessia Barreiro-Chelas e a ponte Seixal-Barreiro.
A ponte Barreiro-Seixal será apenas pedonal?
Não, não. Ponte rodoviária. Foi também dado conhecimento aos presidentes das câmaras municipais, mas numa reunião do Conselho Metropolitano, que iria também colocar o túnel Trafaria-Algés nesse contrato de concessão.
E uma ligação com Montijo não está equacionada?
Não foi falada na reunião. A nova travessia Barreiro-Chelas será muito para o Barreiro e Seixal. E conseguiremos aí desbloquear muito o trânsito. Se depois também avançar o túnel, como disse o sr. ministro Miguel Pinto Luz, será uma quarta travessia. Se avançar a terceira travessia sobre o Tejo, digo que já fico contente.
Qual o ponto de situação, ao dia de hoje, no que diz respeito à Educação, às escolas, com a transferência de competências do Governo?
Acho que, de momento, todos os municípios da península de Setúbal se queixam de que as verbas são insuficientes. Durante o tempo do Governo do PS, só os municípios da CDU se queixavam. Agora, queixam-se todos. Só para que se tenha uma uma ideia, o que nos transferem para pagamento de ordenados ao pessoal não docente termina em meados de Outubro. Parte substancial do mês de Outubro e os meses de Novembro, Dezembro e o subsídio de Natal é com recurso ao Orçamento Municipal.
Até quando a situação é sustentável para os municípios?
De momento o défice que temos no Seixal é de 8,1 milhões de euros, dos dois anos e nove meses desde que o processo… Foi dito pelo então primeiro-ministro António Costa que esta transferência de competências não tinha quaisquer encargos para os municípios, que seria acompanhada dos necessários meios financeiros. Portanto, estou cada vez mais a pensar em entrar com uma acção judicial contra o Governo para ser ressarcido destes valores. Não será a primeira vez que o Seixal mete uma acção contra o Estado.
A breve prazo?
A breve prazo. Já metemos uma acção contra o Ministério da Educação por causa da construção de um pavilhão desportivo escolar em que houve um compromisso escrito de cada uma das partes pagar 50% do pavilhão. A verdade é que a Câmara construiu o pavilhão e o Ministério da Educação nunca pagou os seus 50%. Metemos a acção em tribunal, ganhámos, o Ministério da Educação recorreu e ainda não pagou porque estamos à espera dessa decisão e, como o povo costuma dizer, “enquanto o pau vai e vem, folgam as costas”.
Quando é que o Seixal tenciona levar a reunião de câmara o processo relativo à constituição da Comunidade Intermunicipal (CIM) Península de Setúbal? Os municípios socialistas já levaram…
Foi uma matéria em que estivemos em diálogo entre todos. Inesperadamente, as câmaras do PS, quando ainda estava a haver diálogo, começaram a apresentar e a levar [os documentos] a reunião de câmara. Nós iremos levar, penso que ainda em Fevereiro ou Março. Para estar constituída e entrar [em vigor] depois das próximas eleições autárquicas, que é quando se justifica, no nosso ponto de vista, que a CIM comece a funcionar.
É unicamente uma questão funcional, porque, nos termos legais, a presidência da CIM terá de ser de um município da CDU. Mas não é isso que nos move. É unicamente a questão de necessidade de operacionalidade da CIM.
Está disponível para se candidatar à presidência da Câmara Municipal do Seixal, se for convidado pelo PCP? Sim ou não?
No próximo mês vamos ter a resposta.