Líder palmelense revelou total abertura para trabalhar em conjunto com as populações na preparação para o combate aos incêndios
A última reunião de câmara no município de Palmela foi tensa, com cerca de três dezenas de moradores das zonas afectadas pelo incêndio a falarem olhos nos olhos com Álvaro Amaro, presidente da Câmara de Palmela. Na passada quarta-feira, na Biblioteca Municipal de Palmela, eram muitos os nervos à flor da pele com os moradores a quererem perceber quais os planos da autarquia para o pós-tragédia, no apoio a quem perdeu tudo e quem perdeu muita coisa, e também se foi feito o suficiente no combate ao fogo da passada semana, que queimou mais de 400 hectares, tendo destruído floresta e algumas habitações no seu caminho.
Álvaro Amaro, que foi alvo de muitas críticas, e também de algumas sugestões, não se esquivou a nenhuma pergunta, tendo confessado que o sistema de combate aos incêndios não é um processo perfeito. “Só porque alguma coisa correu mal”, como os problemas com algumas bocas de incêndio, “não se pode generalizar”, comentou o autarca da CDU.
O presidente da autarquia palmelense acredita que, com o envolvimento das populações, o modelo “pode melhorar significativamente”, e deixou a garantia de prestar apoio a todos os afectados de forma imediata. Sobre uma preocupação transversal a todos os moradores, relativamente à remoção da matéria ardida, nomeadamente o grande número de árvores vencidas pelo fogo espalhadas em terreno aberto e nos quintais junto às casas afectadas, Álvaro Amaro assegurou que a autarquia irá proceder a esse trabalho.
Medo de sair à rua depois dos incêndios
Nas intervenções, os moradores tiveram abordagens muito similares, sendo a deficiente limpeza de terrenos e a falta de diálogo as principais críticas dirigidas ao executivo palmelense. Nalguns testemunhos a tragédia vivida pessoalmente impressionou os presentes como foi o caso de Rute Perdigão e Pedro Matos, com a primeira a apelar ao apoio psicológico.
“O que nós vivemos foi algo de terrível que não passa de um dia para o outro”, relatou. Já Pedro Matos, morador na Quinta da Glória, depois de imigrar voltou a Portugal no início de 2021 para viver um sonho que se tornou pesadelo, revela ter três filhos que “têm medo de sair de casa pelo panorama que têm à frente dos seus olhos”. Por sua vez André Amaro, proprietário de uma casa perto do início da Estrada Cobra, queixou-se da falta de água nas bocas de incêndio que “podia ter evitado tudo isto”. “Fui eu e os meus vizinhos que salvamos as nossas casas e os nossos terrenos, porque os bombeiros não tinham água para combater o fogo. As bocas de incêndio não tinham água”, e a isto acrescentou: “Se não for reconhecido que há um problema técnico qualquer ali, não sei como vou dormir à noite, porque por trás da minha casa até ao Centro Social, está uma área que pode arder a qualquer momento”.
Jéssica, moradora na mesma artéria, criticou a autarquia pela demora na resposta às preocupações dos moradores em zonas de alto risco de incêndio. “Desde 2017 que enviamos dezenas de e-mails, fomos pessoalmente várias vezes à câmara para pedir a limpeza do caminho que liga a estrada até ao Vale de Barris. A câmara diz que o caminho é privado e que não tem qualquer responsabilidade, no entanto estão lá duas fossas em pleno Parque Natural a correr a céu aberto”.
Aida Correia, moradora na baixa de Palmela, acusou a autarquia no capítulo da prevenção. “Na resposta a um e-mail que enviei à câmara em Maio, a alertar para a limpeza de terrenos aqui na zona, fomos informados que estava nos planos fazer a limpeza na zona a 9 de Julho, o incêndio, deu-se a 13. Muita gente perdeu muita coisa, o Parque Natural da Arrábida também e, no caso da minha família, não foi pior porque estivemos lá a defender o que é nosso. Fomos nós que os colocámos aí e exigimos respostas”, enalteceu.
Na resposta, Álvaro Amaro afirmou que, em relação a quem cabe a limpeza dos terrenos, o problema resolve-se com “uma alteração na legislação, por parte do Governo, que deixe tudo claro relativamente a quem tem de fazer o quê, como e quando e com que responsabilidades”. O autarca sublinhou ainda a dificuldade da fiscalização e do jurídico em encontrar os proprietários.
Para o futuro, o líder do executivo quer criar um plano de intervenção e prevenção construído com a participação dos moradores. “A ideia é percebermos efectivamente o que foi feito, o que está feito e o que temos de fazer para estarmos mais preparados para enfrentar estas situações”, disse na reunião. Álvaro Amaro pegou na agenda e avançou com uma data para uma primeira reunião de trabalho nesse sentido, apontando para 17 de Setembro. “Queremos iniciar com os moradores das regiões afectadas uma cronologia de trabalho que envolva também especialistas. Nós todos sabemos um pouco mas há, de facto, quem trabalha nesta matéria há alguns anos. São professores universitários, são pessoas que aprovam os regulamentos e os planos para todos os municípios, e nós temos de perceber se a perspectiva destas pessoas nos ajuda a melhor intervir no plano da intervenção, prevenção e resiliência”, concluiu.