28 Abril 2024, Domingo
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Octávio Machado: “Não admiti que os ‘palmeletas’ mandassem nos palmelões”

O palmelão passa em revista os tempos actuais e o passado. E arrasa a entourage do PSD no concelho. Critica a tutela por fazer do distrito um ‘apêndice’ de Lisboa e recorda o Vitória europeu

 

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É a prova provada de que os homens não se medem aos palmos. Apesar da sua baixa estatura física, afirmou-se pela fibra e qualidade do seu futebol, conseguindo no desporto-rei, primeiro como jogador e depois enquanto treinador, destacar-se como vulto maior no nosso país. Aos 74 anos, Otávio Machado – que chegou a ser vereador na Câmara Municipal e que preside aos Bombeiros de Palmela – acaba de ser condecorado com a Medalha de Honra do concelho.

Em entrevista a O SETUBALENSE e à rádio Popular FM, explica por que se demitiu do PSD quando ocupava um lugar na vereação, aponta o dedo a alguns social-democratas que classifica de “palmeletas” e confessa-se “insatisfeito” por o Distrito de Setúbal ter passado a ser “uma freguesia da Área Metropolitana de Lisboa”.

Quanto aos bombeiros, admite que o município tem sido o maior parceiro das corporações do concelho. Mas isso tem estória…

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O que representa para si ter sido condecorado com a mais elevada distinção do município de Palmela, a medalha de honra?

É sempre bom sentirmos o reconhecimento. Mas acho que isso é consequência de alguma coisa. Consequência do meio onde nasci, cresci e me fiz homem, onde me integrei numa sociedade e numa Palmela que é detentora de um património histórico enorme, de um património cultural que é referência nacional. É uma terra que me viu nascer, de que gosto muito, onde me sinto bem. Sou fruto desta terra, destas gentes e dos valores e dos princípios que me transmitiram durante toda a minha infância. E diria que me sinto sempre honrado do meu passado.

Foi vereador do PSD na Câmara Municipal de Palmela ainda antes do final da primeira década de 2000. Ao olhar para trás que análise faz ao concelho de então e ao concelho de hoje? Evoluiu positivamente?

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E fui deputado da Assembleia Municipal logo a seguir ao 25 de Abril. Desempenhei cargos políticos, mas não sou político, tentei levar aquilo que era a minha visão de vida… Digo-lhe que neste momento sou um insatisfeito. Não pelo meu concelho, por este distrito e se quiser por este País. E porquê? Porque quando concorri havia palmelões, palmelenses e “palmeletas”.

Palmelões são aqueles que nasceram em Palmela. Palmelenses são os que vêm viver para Palmela, integram-se na nossa vida, muito disso acontece através do movimento cultural, do movimento associativo. Depois há os “palmeletas”, que são aqueles que vêm para cá, não sabem o que é que são e querem representar-nos politicamente.

Palmela tem tido alguns “palmeletas”, que mais não são do que simples servidores, não das causas de Palmela, não da promoção deste concelho, mas no sentido de aproveitarem toda essa projecção de Palmela para subirem dentro dos partidos a que pertencem. Não tenho problema nenhum em reafirmar isto muitos anos depois. A minha satisfação foi muito maior quando, enquanto vereador, estive em cerimónias como por exemplo a da plataforma logística…

… de Poceirão?

Estruturante! A união dos portos de Lisboa, Sines e Setúbal, bitola europeia através do comboio… Onde é que está? Quantos milhões se gastaram? Quem foram os políticos que deixaram cair este projecto? Agora quando passo lá está um pomar de citrinos. Não faz sentido nenhum. O aeroporto, Rio Frio… Tantos anos passados, ainda não tomaram decisão nenhuma.

Mas aquilo que mais me preocupa é olhar agora e ver que alguns políticos são subservientes em relação aos seus partidos e incapazes de perceber que foram eleitos pelo povo deste distrito para o defender. E nos últimos anos temos assistido à desvalorização do Distrito de Setúbal, que tem três áreas protegidas: Arrábida, Costa Vicentina e Estuário do Sado. Uma zona turística maravilhosa, uma gastronomia que é de referência. E a que é que assistimos? Passámos a ser uma freguesia da Área Metropolitana de Lisboa [AML]. Isto a mim desagrada-me completamente. Repare, o Distrito de Setúbal tinha a Costa Azul. Promovia tudo o que era evento, todos os produtos da região. Quem é que promove agora? Zero.

A Administração Regional de Saúde? Pertencemos à AML e o que ganhámos com isso? Nada. Saímos prejudicados. Há pouco tempo, [a questão dos] bombeiros para a AML. E aqui não há cá secretária de Estado [da Protecção Civil] nenhuma que tenha influência – é uma senhora do Barreiro [Patrícia Gaspar] –, se tivesse influência não tinha deixado pensar que iríamos todos para a AML. A sub-região foi criada única e exclusivamente porque Palmela, Setúbal e Sesimbra e a Federação dos Bombeiros de Setúbal falaram muito alto.

Isso no plano distrital, mas perguntei-lhe como vê o concelho actualmente?

Estava a falar destes projectos estruturantes, que a Câmara abraçou mas que depois outros deixaram cair. Por exemplo, os centros de saúde. Fui vereador, fui eu que fiz a escritura do terreno para o Centro de Saúde da zona sul, salvo erro, de Pinhal Novo. Até Quinta do Anjo, onde é que está o novo centro de saúde? A Câmara disponibilizou sempre terrenos para todas as infra-estruturas…

O concelho de Palmela tem sofrido na pele um abandono por parte dos sucessivos governos? É isso?

Não tenho dúvida nenhuma. Merecíamos muito mais atenção, até porque a Câmara esteve sempre atenta e fez a cedência, inclusivamente, para o novo Centro Distrital de Operações de Socorro, ao qual agora deram uma nova reorganização e deixaram cair também. Não se percebe esta gente. Alimentam grandes esperanças, a autarquia responde com cedência de terrenos para as infra-estruturas e estas ficam pelo caminho.

A actividade política é para si passado, morto e enterrado, ou não diz ‘nunca’ a um eventual regresso?

Não, não regresso. Mas não vou deixar de ter intervenção. Habituei-me desde sempre a não permitir que me tapem a boca. Vamos comemorar 50 anos do 25 de Abril e quero dizer que o 25 de Abril chegou ao futebol um ano antes, ao Vitória de Setúbal. O Vitória, quando tentaram impor um regulamento aos jogadores que dizia que não podíamos sair fora de Setúbal sem pedir autorização, não podíamos dar entrevistas sem autorização, José Maria Pedroto [então treinador dos sadinos] não aceitou e saiu. Eu disse ao director do Vitória: “Se tiver um jornalista lá fora, dou já uma entrevista”. E dei. Porque nunca permiti, nem vou permitir, qualquer tipo de ameaças. Não me vou calar nunca, em defesa dos valores e dos princípios que acho justos.

Ficou algo por dizer quando pediu a demissão do PSD, quando foi vereador?

Era o que faltava. Dei a cara por um projecto, fui eu que me apresentei e era o que faltava era aceitar que outros, que até são “palmeletas”, quisessem impor o meu voto. Não. Era incapaz de votar contra qualquer situação que fosse ao encontro da vontade e das necessidades do povo do concelho de Palmela por motivos políticos. Não admiti que os “palmeletas” mandassem nos palmelões.

Ou seja, foi por uma questão de não querer seguir uma disciplina de voto?

Só quem não me conhece é que poderá pensar que alguma vez trairia os meus princípios e os meus compromissos com alguém. Depois tiveram uma grande lição logo nas eleições a seguir, em que concorri por um partido que tinha meia dúzia de votos e eles passaram para quarto lugar. E não aprenderam a lição. Alguns desses senhores continuam cá ainda, por isso o PSD é um partido completamente desvalorizado. Mas eles continuam cá. O insucesso é do PSD, que não sei como é que ainda não correu com esta gente.

Está a referir-se a Paulo Ribeiro, vereador na Câmara Municipal de Palmela e presidente da distrital do PSD?

Paulo Ribeiro, de quem sou amigo pessoal, conheço há muitos anos, mas ele devia pertencer às listas de Setúbal. Palmela tem de deixar de ser lugar para quem quer exercer cargos políticos, mas que não tem lugar nas listas da terra deles.

Há mais alguém, além de Paulo Ribeiro?

Sempre houve. Era o Bracinha Vieira e companhia limitada… os Vitorinos, essa gente toda que monopolizou Palmela. E os grandes perdedores são o PSD e a população de Palmela.

Está de costas voltadas para o PSD?

Não, tenho uma relação óptima com o Paulo, respeito o Paulo, os outros não respeito de maneira nenhuma. Não respeito quem não me respeita. O Paulo é diferente. É alguém que conheço há muitos anos, com quem caminhei durante um percurso, que estimo e a quem desejo as maiores felicidades.

Para quem já viveu por dentro de dois mundos de enorme exposição pública, o da política e também o do futebol, qual aquele em que é mais difícil de navegar?

Nada é difícil. Depende de como nós quisermos estar. Se quisermos estar direitos, com coluna, as coisas são fáceis. Não andamos aos ziguezagues.

Já aflorou os bombeiros. Há quem defenda uma taxa municipal de protecção civil, cuja receita reverteria para os bombeiros. Concorda com esta medida ou não adiantaria de nada?

Não adiantaria nada. Tem aí mais uma área em que me envolvi porque o meu avô foi comandante interino quando os Bombeiros de Palmela apareceram. O meu pai e o meu tio foram bombeiros fundadores do corpo activo, portanto nasci também nessa causa. Para dizer que não tive problema nenhum em bater o pé e dizer que há 25 anos o presidente da Câmara de Palmela não se sentou na mesa de honra no aniversário dos bombeiros. O que aconteceu a seguir foi pioneiro em Portugal. A Câmara de Palmela passou a ser pioneira na criação de bombeiros em regime de permanência. A Câmara pode dar-se por feliz, porque os bombeiros aqui têm um cartão social que muitos não têm. A associação que dirijo gratifica os piquetes voluntários, dá refeições ao fim-de-semana e à noite. É o mínimo que se pode fazer…

E os bombeiros podem dar-se por felizes pela Câmara que têm?

A Câmara tem sido nossa parceira. Tem sido referência a nível nacional. Os bombeiros do concelho de Palmela são referência, as suas associações e a sua autarquia são referência a nível nacional. Agora tivemos a satisfação do reforço das verbas para reequipamento, que passou para 300 mil euros.

“O Vitória marcou muito o futebol europeu”

O hoje comentador televisivo de futebol recorda o início da carreira, o desejo do Atlético de Madrid na sua contratação, a promessa feita ao FC Porto e a conversa com o então presidente do Benfica Borges Coutinho. E realça a qualidade do Vitória de 1971/72, que espantou a Europa e que no plano doméstico foi 2.º classificado no campeonato.

Palmelense, Vitória Futebol Clube, Porto e Sporting. Tem um trajeto impressionante, repleto de conquistas. Qual a principal marca com que ficou do futebol?

O primeiro recorte de jornal que tenho no meu álbum é do jornal O SETUBALENSE, da autoria de Domingos Roque, em que ele dizia: “O que vem este gajo fazer para aqui? Este gajo é um miúdo, é o melhor do Palmelense, mas temos tantos craques”. Passados dois anos tive o privilégio de ganhar o troféu para o jogador mais regular do Vitória. Depois tive um contacto com o Atlético de Madrid, e as coisas cá complicaram-se politicamente. Os dirigentes do Vitória na altura cometeram um erro enorme que foi enviar-me uma carta a dizer que eu tinha de ir para Espanha, queriam era ver os milhões de pesetas, não achei graça nenhuma. No ano anterior tive contactos com o Futebol Clube do Porto. Eu e o Rebelo… Prometi que se não fosse para Madrid iria para o Porto. Depois tive um contacto com Borges Coutinho, presidente do Benfica, pela primeira e única vez, e disse-lhe que ia pensar. Mas cumpri a minha palavra com o Porto.

O Vitória europeu de que fez parte está hoje arredado dos holofotes máximos do futebol nacional. Acredita que será possível o Vitória poder voltar a esses tempos áureos?

Não é fácil… para não dizer que é impossível. Estamos a falar do Vitória de Setúbal, que mandou para canto, como se costuma dizer, grandes equipas europeias (Inter de Milão, Fiorentina, Leeds).

Esse Vitória podia ter trazido um troféu europeu para Portugal.

O Vitória era um convidado assíduo dos famosos torneios em Espanha. Hoje ouvimos dizer: o Benfica não perde há 15 jogos, o Porto não perde há 16… O Vitória, num campeonato de 30 jornadas, esteve 25 jogos sem perder. Perdeu um na terceira jornada com o Benfica em casa e perdeu na última jornada com a CUF, também em casa [1971/72]. Não perdeu um jogo fora de casa. Foi segundo classificado. Falar nesse Vitória de Setúbal é falar de uma das grandes equipas portuguesas, que marcou muito o futebol português e o futebol europeu. Eu e outros, ao serviço do Vitória, fomos chamados à Selecção Nacional, o que não é fácil, não sendo dos “três grandes”, e que diz bem do prestígio do Vitória de então.

Podiam ter trazido um troféu europeu, se tivessem um pouco mais de sorte?

Penso que sim, houve uma eliminatória que nos podia ter catapultado, mas foi uma viagem muito turbulenta, à Roménia para jogar com o UTA ARAD, foi das piores equipas que efectivamente nos calhou. Um dia de gripes, tivemos de ir de autocarro de um país para o outro, depois um treino muito enlameado… Perdemos por 3-0. Mas em Setúbal podíamos ter dado 8. Batíamos uns nos outros e não fazíamos golos, ganhámos 1-0. Foi um ano que nos podia ter catapultado para outros níveis.

Infância “Fui admirador do Benfica, sim senhor”

Octávio chegou a treinar dos encarnados. Acabou por ingressar no Vitória e o resto é história, com um percurso repleto de títulos conquistados, sobretudo, ao serviço do FC Porto, mas também do Sporting. Quis o destino, por ele conduzido, que abraçasse as cores dos rivais da águia. Aquele que foi o seu amor de meninice, nunca viria a dar em casamento e o sentimentos mudaram.

Há quem diga que com essa dedicação toda aos dragões e aos leões, havia lá no coração do Octávio a cor vermelha do Benfica. Em pequenino, qual era a sua preferência clubística?

Isto é como o amor. Pode ter namoros de infância, mas no futuro isso depois não lhe diz nada. Fui um admirador do Benfica? Fui sim, senhor! E porquê? Na minha infância, quem eram as referências? O Eusébio da Silva Ferreira. O Benfica Campeão da Europa. Na minha infância era o Benfica.

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