Limpeza deficitária em Afonsoeiro, Areias e Esteval. Junta deixou de assegurar serviço em 1 de Janeiro. Câmara estava informada, mas necessitava de deliberação dos órgãos de freguesia
O executivo municipal aprovou por unanimidade, na última quarta-feira, a reversão da competência atribuída à Junta da União das Freguesias de Montijo e Afonsoeiro para limpeza urbana das áreas de Afonsoeiro, Areias e Esteval.
A deliberação vai ter agora de ser ratificada pela Assembleia Municipal, de forma a que a Câmara possa então abrir um concurso público para adjudicação do serviço a uma empresa. Até lá, porém, os moradores nas três zonas afectadas vão contar com um serviço de recolha de lixo que, conforme admitiu Maria Clara Silva, presidente da Câmara Municipal, “não está a ser feito nas devidas condições”, desde 1 de Janeiro deste ano, altura em que a Junta deixou de assegurar a tarefa, alegando que a verba recebida para o efeito ao abrigo do auto da transferência dessa competência era insuficiente.
A Junta comunicou em 28 de Dezembro passado, através da sua página no Facebook, que deixaria de ser responsável pela varredura, deservagem e recolha de monos nos referidos bairros e justificou que a situação fora consensualizada com a Câmara Municipal.
O problema é que o fez sem que houvesse deliberação, nesse sentido, quer do executivo da Junta quer da Assembleia de Freguesia, para posterior envio à Câmara, tendo em vista o desencadeamento da necessária formalização do acto.
A deliberação do executivo da Junta só ocorreu a 23 de Janeiro e teve aprovação da Assembleia de Freguesia a 28 de Janeiro.
Acresce que, até à data, a Junta não entregou o relatório de execução do auto de transferência da competência, acompanhado dos documentos de despesas, referentes ao serviço realizado em 2024, a justificar como foi gasta a verba – mais de 430 mil euros – que a Câmara lhe transferiu, através da Direcção-Geral das Autarquias Locais (DGAL) no ano anterior.
A Junta de Montijo/Afonsoeiro pretendia da Câmara mais cerca de cem mil euros para continuar com a competência da higiene urbana nos três bairros, face à actualização dos custos do serviço contratualizado externamente.
Ilídio Massacote defende Junta
Segundo o vereador Ilídio Massacote (ex-PSD), Fernando Caria solicitou à Câmara a “16 de Agosto, em nome de todos os presidentes de Junta do concelho, uma reunião conjunta” para debater os autos de transferência de competências, a qual só viria a realizar-se em “15 de Novembro”. “Pela primeira vez, as Juntas não foram ouvidas antes da elaboração do Orçamento Municipal, apesar do pedido de reunião e das preocupações manifestadas. Não tiveram possibilidade de discutir possíveis alterações aos autos de transferência”, disse Ilídio Massacote.
No entender do autarca, a Câmara “podia e devia ter assumido ao longo de Janeiro [último] a higiene urbana” nas três zonas. “Não era ilegal. Só é ilegal, quando há usurpação de poderes. E aqui não havia”, considerou, para mais à frente juntar que a Câmara só comunicou em 19 de Dezembro passado à Junta que não era possível acautelar os recursos financeiros necessários para a execução da competência.
Mas, Maria Clara Silva rebateu a argumentação, ao sublinhar que a questão nada tem a ver com orçamentos ou reuniões. “O executivo da Junta e a Assembleia de Freguesia é que têm de vir, por deliberação, dizer à Câmara que a verba é insuficiente e que não há interesse em continuar [com a competência]”, frisou a edil, para sustentar que só a partir desse momento é que a Câmara poderia deliberar sobre a reversão da competência.
“Eu só podia trazer aqui esta proposta depois de o sr. presidente da Junta me informar que os órgãos de freguesia tinham deliberado sobre esta matéria. Porque só isso é que permite que a Câmara, por urgência imperiosa, vá fazer uma prestação de serviços com uma empresa para a limpeza daqueles bairros. De outra forma não havia capacidade legal para o fazer”, vincou, antes de reforçar que a Junta “continua a não cumprir com o que deve, que é entregar o relatório [de execução]”, referente ao serviço realizado em 2024.
Correia e Afonso arrasam Caria
Mais cáustico em relação à intervenção de Ilídio Massacote foi Joaquim Correia, vereador eleito pela CDU. “Fiquei muito espantado de ver você [Ilídio Massacote] entrar de pés juntos a fazer campanha eleitoral. Tem cá um moral. E depois ainda vem aqui como moço de recados do presidente da Junta”, disparou o autarca da CDU.
“Quem está a sofrer com isto são os munícipes. E a responsabilidade é do sr. presidente da Junta e também um bocado da Câmara Municipal. Quando eram todos amigos, corria tudo muito bem. Depois houve qualquer coisa que começou a correr mal. Agora andam em guerra e a verdade é que não há contas [relatório de execução]. Os homens que falam em transparência, que querem mudar o Montijo, não apresentam as contas. Isso é que é bonito”, adiantou.
Pelo PSD, o vereador João Afonso não poupou nas críticas duras a Fernando Caria. “Só em Janeiro se deliberou [na Junta] uma coisa que se anunciou em Dezembro [último]. Isto é ao nível de uma tasca, não de uma entidade pública. A Câmara só sabe oficialmente a 13 de Fevereiro de uma coisa que aconteceu a 1 de Janeiro [passado], sem deliberação nenhuma. É assim que a Junta está a funcionar”, criticou o social-democrata, que salientou também que a reversão por acordo entre as partes (Junta e a Câmara), segundo a Lei, “implica formalização”.
“A Junta unilateralmente cancelou o serviço. O acordo de reversão está a vir a esta sessão de Câmara, não veio antes de 1 de Janeiro [quando o serviço foi cancelado]”, observou. A terminar, João Afonso subiu o tom das críticas. “A Junta tem de dar prioridade à higiene urbana ou estoirar cem mil euros por ano nos Sons no Montijo, um festival a que quase ninguém vai? Há dinheiro para tudo, não há é para a limpeza. O serviço [de higiene urbana] da Câmara funciona mal, mas nunca vi a Câmara fazer birra e dizer que já não limpa. Isto é ao nível da indigência moral”, afirmou, antes de lembrar que das cinco Juntas do concelho só a do Montijo cortou o serviço. “É um dos episódios mais lamentáveis da vida autárquica do Montijo”, concluiu.
A reversão da competência atribuída pela Câmara à Junta vai agora ser submetida a votação na Assembleia Municipal.