Candidato socialista propõe governação mais próxima das pessoas para promover a diversificação económica e valorizar o território de forma sustentável
Com uma vida dedicada ao associativismo local e à intervenção cívica, Luís Vital Alexandre, de 52 anos, avança com a candidatura à presidência da Câmara Municipal de Grândola pelo Partido Socialista, motivado por aquilo que considera ser um ciclo de estagnação autárquica após doze anos de governação comunista.
Em entrevista a O SETUBALENSE, o vereador traça um duro diagnóstico ao estado actual do concelho, aponta a falta de estratégia, a centralização de decisões e a excessiva dependência do turismo como factores que têm acentuado as desigualdades entre o litoral e o interior.
Habitação inacessível, escolas degradadas e falta de investimento social são alguns dos problemas identificados por Luís Vital Alexandre. Como resposta, propõe uma governação mais próxima das pessoas, que devolva capacidade de intervenção às freguesias, promova a diversificação económica e valorize o território de forma sustentável. Com uma forte crítica à gestão financeira da autarquia, acusa o actual executivo de guardar dinheiro “no banco” em vez de o investir no bem-estar da população.
O que o motivou a aceitar o desafio de se candidatar à presidência da Câmara Municipal de Grândola?
Nasci, cresci e fiz toda a minha vida em Grândola. Estive sempre envolvido socialmente, em colectividades, associações e também participação política. Foi a forma que encontrei de devolver tudo o que me deu esta terra da fraternidade e que fez de mim o homem que sou hoje. Estes 12 anos de ciclo autárquico, em que a CDU dirigiu os destinos do nosso concelho, trouxeram Grândola a uma situação de impasse. Fala-se muito de Grândola, mas de uma Grândola que não é dos grandolenses. E é por um concelho que invista nas suas pessoas que me candidato.
Tendo já sido vereador e estando ligado ao movimento associativo, como descreve a sua trajectória política até agora e a preparação para este novo desafio?
Desde cedo que me envolvi no movimento associativo e essa trajectória acabou por culminar na presidência da Sociedade Musical Fraternidade Operária Grandolense, uma instituição com uma história de resistência à ditadura e de exercício da liberdade que o 25 de Abril nos trouxe. Não confundo esses dois planos: o meu trabalho no associativismo teve um propósito, a minha candidatura à Câmara tem outro. No associativismo faz-se muito pela nossa terra, pelos nossos jovens, por aqueles que mais precisam. Mas é um trabalho direccionado. A candidatura à Câmara é a afirmação de que Grândola precisa de visão, de estratégia, da coerência que esta gestão foi incapaz de ter nas suas decisões.
Quais são as principais necessidades do concelho que o levaram a avançar com esta candidatura?
O concelho é muito grande e a assimetria entre litoral e interior agravou-se imenso. O distanciamento em relação aos problemas concretos das pessoas é enorme, parece que a política municipal se centrou apenas num modelo de desenvolvimento turístico que em nada beneficia os grandolenses. É incompreensível que, com o nível de investimento que há neste momento no nosso concelho, a autarquia não exija aos investidores uma verdadeira política de responsabilidade social. O turismo tem imensas vantagens, na criação de emprego e investimento, mas deixa uma pegada que se reflecte no aumento do preço das casas, ou na pressão sobre os serviços. Competia à Câmara garantir que esse crescimento fosse acompanhado de casas a preços acessíveis, escolas e creches para o aumento de procura que temos sentido no concelho. Ou lares e cuidados de saúde. Nada disso foi feito. A Câmara guarda o dinheiro no banco, onde tem 50 milhões de euros, sem se preocupar em investir nas pessoas. Se conseguirmos dotar a gestão municipal de uma estratégia coerente, com esta disponibilidade financeira podermos suprir muitas das lacunas que hoje sentimos no nosso concelho.
Quais são as suas propostas para garantir um desenvolvimento urbano sustentável e equilibrado?
Primeiro que tudo centrar a política nas pessoas. Na requalificação das escolas, no aumento da oferta de creches, no reforço da oferta de serviços sociais como os lares, mas também no apoio aos mais necessitados. O dinheiro que tem chegado ao concelho tem de ser canalizado para beneficiar quem aqui vive e quem aqui quer trabalhar. Tudo o que não tem sido feito, na verdade. Depois, uma verdadeira estratégia de promoção de habitação, que terá de ter a intervenção da Câmara, mas também dos privados e do sector cooperativo. E, muito importante, a diversificação da economia local. O turismo é um dos sectores mais vulneráveis a crises económicas. Este Executivo não só não fez nada tendo em vista a atracção de investimento além do investimento turístico, como desdenha um pouco dessa ideia. Precisamos de investir no sector primário, mas também na pequena indústria, na logística, na economia digital. Note-se que Grândola tem uma localização geográfica estratégica, mas nada tem sido feito para a capitalizar.
O que pensa sobre a questão da habitação em Grândola, especialmente no que diz respeito aos jovens e às famílias com dificuldades económicas?
O problema da habitação é um problema que vai muito além do concelho. E a solução não passa apenas pelo investimento municipal. É incompreensível que a autarquia não tenha envolvido os promotores imobiliários do concelho na busca de uma solução – dos quais os próprios são parte interessada. Sem casas acessíveis não teremos postos de trabalho suficientes para garantir o investimento que aqui está a ser feito. Em primeiro lugar, os filhos da terra saem porque não conseguem comprar ou arrendar casa aos preços que estão a ser cobrados, depois não conseguimos fixar população. Nos últimos cinco anos o preço por m2, na freguesia de Grândola e Santa Margarida da Serra, duplicou. No Carvalhal é mesmo mais caro do que em Lisboa, onde os salários são muito mais altos. Ou o Município promove a construção a custos controlados, e incentiva os privados a fazer o mesmo, e temos habitação para fixação de jovens e pessoas das classes médias, ou é o próprio turismo que sucumbirá fruto do seu crescimento não sustentado. É preciso juntar privados e sector cooperativo para investir em habitação não especulativa. Mas para isso é preciso visão, dinamismo e capacidade de intervenção, tudo o que uma Câmara, paralisada por um certo deslumbramento, não tem tido. A Câmara foi algo gulosa com o dinheiro que vem do turismo, as receitas de IMI e de IMT cresceram significativamente e hoje o orçamento é da ordem dos 100 milhões de euros, sendo que é notório que a Câmara não tem capacidade de execução de um orçamento desta dimensão, por falta de visão e por incapacidade administrativa. Acresce ainda o facto de termos uma câmara que se diz comunista, mas que se tem preocupado mais com os interesses do capitalismo intensivo do que os interesses do povo grandolense.
Que medidas tem para melhorar a qualidade de vida da população de Grândola, especialmente nas zonas rurais e nas freguesias mais afastadas do centro?
É preciso centrar as políticas nas pessoas. E para isso é preciso reforçar a capacidade de intervenção das Juntas de Freguesia. As Juntas de Freguesia estão mais próximas e têm a capacidade de resolver problemas do dia-a-dia, rápida e eficazmente. Incluindo a Junta de Freguesia de Grândola, que tem tido muito poucas competências e ainda assim é substituída pela Câmara em quase tudo. É impensável que uma Câmara com tanto dinheiro tenha as escolas Secundária e a EB2,3 completamente degradadas. Que ainda não tenha implementado um sistema de transporte urbano, que sirva os mais idosos que vivem nas zonas limítrofes e que não têm acesso ao centro da vila, por exemplo, para vir ao Centro de Saúde. É incompreensível que, em 2025, existam ainda aldeias onde faltam infra-estruturas de saneamento. Existe muito trabalho para fazer junto das pessoas, às vezes intervenções simples, de proximidade, mas que melhoram a sua qualidade de vida.
Como pretende apoiar a diversificação económica e criar mais postos de trabalho para a população local?
É preciso uma estratégia de captação e fixação de investimento. E infra-estruturas para isso. Temos uma zona de indústria ligeira em Grândola. Mas, por exemplo, Azinheira dos Barros tem uma excelente localização para a fixação de algumas unidades, nomeadamente na área da logística, e nada foi feito para o potenciar. E é impressionante que há anos esteja prometida uma zona de localização empresarial no Carvalhal, eternamente adiada. Há que criar essas condições, mas é preciso ir promover o território, mostrar o seu potencial, demonstrar aos investidores que existem condições e um plano de desenvolvimento para as actividades económicas. É preciso mostrar que Grândola tem uma estratégia que integra e é complementar ao que passa no Alentejo Litoral, no Baixo Alentejo, na Península de Setúbal. O desenvolvimento da economia requer esta integração e sinergias.
Que visão tem para apoiar os empresários locais e garantir que Grândola continue a ser um destino atractivo para o investimento, sem perder a sua identidade?
O comércio local, por exemplo, tem sofrido bastante com as alterações da dinâmica urbana. Quer em Grândola, quer nas freguesias. É preciso um programa de dinamização e modernização do comércio local. Apareceram novas lojas, e ainda bem, mas existia um comércio de proximidade que foi desaparecendo por não ter tido condições para se modernizar. E isso acontece também com a oferta de restauração. O desprezo da Câmara por questões destas é evidente em decisões muito simples: as iluminações de Natal foram claramente exageradas em espaços como o Jardim 1º de Maio, mas deixaram as principais artérias comerciais sem qualquer motivo natalício. Por outro lado, como já referi, falta uma estratégia coerente, de longo prazo, de captação e de fixação de investimento além do investimento turístico. É preciso apostar em sectores como a logística, a agro-indústria, a pequena indústria transformadora, bem como em serviços diferenciados. Temos grande tradição silvícola e, tirando um ou outro evento da associação de agricultores, é um sector de que praticamente não se ouve falar.
Como planeia envolver a comunidade nas decisões que afectam o futuro de Grândola?
Esse é outro desafio que temos pela frente. A Câmara de Grândola é de uma falta de transparência gritante. Não existe um programa de visitas abertas às Freguesias. Não existe um orçamento participativo. Os licenciamentos urbanísticos são ainda todos feitos em papel. É inexplicável. Primeiro que tudo, precisamos de voltar a ter políticas de proximidade. Por exemplo, vamos convidar as Freguesias a fazerem os seus orçamentos participativos. E acompanhar essa iniciativa no ano seguinte. E reinventar esse modelo, aliando um lado pedagógico, de demonstrar o que é um orçamento e de que decisões estão na sua base, com um lado concorrencial, de disputa entre projectos emanados da cidadania. É preciso convidar as associações e as colectividades também para que, além dos apoios às suas actividades, possam ganhar capacidade de investimento em projectos de médio e longo prazo.
Tem propostas para melhorar a relação da Câmara com as freguesias e garantir que as necessidades de todas as áreas do concelho sejam atendidas?
Claro! As que já referi. Os orçamentos participativos, o reforço das competências e o aumento das participações financeiras da Câmara, mas também um novo impulso em relação àquilo que é o papel das freguesias na actividade municipal. Quando negociarmos os contractos de delegação e de transferência de competências, vamos negociar também a componente de investimento. As freguesias têm de ser dotadas de capacidade de investimento além da participação na despesa corrente.
Quais são as suas três principais prioridades caso seja eleito presidente da Câmara Municipal?
Investir nas pessoas, investir nas pessoas, investir nas pessoas. É inconcebível, como tenho dito, que o dinheiro que aqui chega não seja canalizado para reforçar equipamentos necessários, como as creches, escolas e lares, ou na garantia que existam casas que os grandolenses consigam pagar. Em cima disso, é preciso garantir a abertura do funcionamento municipal, transparência e contraditório. A democracia vive disso e é prioritário que em Grândola a opinião das pessoas possa voltar a contar.
O que acredita que o PS pode trazer de novo e diferenciado em relação à gestão anterior?
Antes de mais, transparência e abertura. Uma respiração que vem do povo, que este Executivo sempre desprezou. E uma dinâmica nova, ancorada numa estratégia nova, que olhe para o concelho, do interior ao litoral, que procure a coesão, que apoie as crianças, os jovens e os idosos e crie melhores condições para as famílias. Grândola perdeu população, o concelho como um todo. E por exemplo a freguesia de Melides. Vemos gente, mas é gente que passa, não fica. Os que cá estavam estão a sair. Significa que esta estratégia de desenvolvimento, que tem investimento, está a errar sucessivamente.
Como imagina Grândola daqui a 5 ou 10 anos, caso seja eleito presidente?
Imagino o concelho com outra vida, com outra dinâmica. Com melhores equipamentos sociais, com mais casas para os grandolenses e para aqui quem quer trabalhar, com uma rede municipal de transporte ligeiro, com investimento mais diversificado. Muito mais preocupado com a sustentabilidade. Sustentabilidade ambiental, mas também social. O concelho de Grândola precisa de reencontrar o equilíbrio que lhe foi sendo ceifado estes anos.
Que legado gostaria de deixar à população de Grândola após o seu mandato?
Antes de mais, espero ser eleito presidente para poder contribuir para o desenvolvimento da minha terra. E deixar o meu concelho em melhores condições do aquelas que vou encontrar no dia em que tomar posse.
Que mensagem gostaria de deixar aos cidadãos de Grândola, e o que pode esperar a população de si durante a campanha?
Ainda que, naturalmente, tenhamos de identificar os pontos fracos deste mandato da CDU e discuti-los com a população, a nossa aposta é fazer uma campanha positiva. Uma campanha com propostas na área da mobilidade, da habitação, de uma nova visão do desenvolvimento, onde as pessoas contam e têm de contar. Gostava que as pessoas se envolvessem, de facto, neste processo autárquico. Que se interessassem. As pessoas, de mim, podem esperar sobretudo disponibilidade para as ouvir. Para ouvir os seus problemas. E procurar soluções. Somos uma comunidade e é importante regressarmos a esse sentido comum, dos valores que nos unem. Isso, sim, tem-se perdido e é importante recuperar a ideia de terra da fraternidade.