Os anos 40 arrancaram vários clubes dos seus bairros em todo o país. As novas exigências, regras e despesas dessa década obrigaram alguns a fundir-se, mas muitos outros a fechar portas. O São Domingos Futebol Clube, em Setúbal, foi um deles. Foram necessárias quase três décadas para reunir coragem e condições para ressuscitar a coletividade verde-esmeralda e negra.
Os jovens do bairro iam jogando onde calhava no final dos anos 60, como os torneios populares no Campo do Extra (onde hoje estão as Águas do Sado) e no Ringue Antoine Velge, mas faltava uma identidade própria. Com o 25 de Abril, em 1974, o novo ímpeto do associativismo deu o “empurrão” decisivo. O entusiasmo dos jovens atletas e o sentimento de pertença dos antigos sócios juntaram-se para uma mobilização única, angariando fundos com rifas, leilões ou bailes.
Os mais experientes lembravam-se ainda do velho clube e começaram a “escavar” no passado, em busca dos velhos emblemas do São Domingos. Dos documentos ninguém sabia: os da antiga sede e da Federação Portuguesa de Futebol, em particular, foram apreendidos pela PIDE após o envolvimento de sócios e dirigentes do clube na oposição ao Estado Novo. As taças tinham ido parar quase todas ao ferro-velho. A bandeira foi encontrada no sótão de um sócio já idoso, e o primeiro equipamento recuperado foi uma camisola de corrida do São Domingos: verde com traço preto ao meio.
Só faltava a sede. Após saltar de casa em casa de cada dirigente, o São Domingos encontrou um espaço na Rua Gil Vicente, n.º 37, onde os próprios sócios puseram mãos à obra e o transformaram no coração do clube, que se refundou. Para além de ser o espaço de reunião dos dirigentes do renovado São Domingos e ponto de encontro dos velhos e novos sócios, a sede recuperou o papel de apoio à comunidade: o clube tinha balneários onde os moradores do bairro podiam ir tomar duche, quase um “luxo” nestes tempos.
Em 1976, com os primeiros órgãos sociais eleitos, o São Domingos inscrevia novamente uma equipa juvenil no campeonato da Associação de Futebol de Setúbal. O clube e o bairro voltavam ao desporto popular de Setúbal de queixo erguido!
Estas e outras histórias farão parte do livro do São Domingos Futebol Clube, a lançar no centenário do clube em 2021.
João Santana da Silva, historiador