26 Junho 2024, Quarta-feira

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“Confissões”: Prefácio ao livro de Mário Moura

“Confissões”: Prefácio ao livro de Mário Moura

“Confissões”: Prefácio ao livro de Mário Moura

6 Novembro 2023, Segunda-feira

Este é um livro surpreendente. Escrito por um autor quase centenário, Confissões, oferece ao leitor uma ampla perspetiva sobre o tempo e o espaço de uma longa e ativa existência. Mário Moura é um médico conhecido, respeitado e querido por todos aqueles que ao longo de muitas décadas beneficiaram do seu saber clínico e da sua sabedoria convivial na cidade de Setúbal. Foi junto ao Sado que, depois da formatura em Coimbra, se fixou como médico. Nessa condição, Mário Moura ganhou também uma projeção nacional e internacional, enquanto presidente da Associação dos Médicos de Clínica Geral e vice-presidente da Confederação Ibero-americana de Medicina de Família. A sua presença marcante na esfera pública encontrou outros canais de expressão e manifestação. No jornalismo, sem dúvida, mas sobretudo como católico convertido no período de esperança e renovação da Igreja de Roma suscitado pelo Vaticano II e pela ação reformadora do papa João XXIII.

Contudo, este livro, embora tenha uma dimensão biográfica, não constitui uma biografia. O cânone da biografia exige uma procura exaustiva e detalhada daquilo que dá valor e singularidade à vida biografada. Aqueles gestos e ações que nos elevam e nos distinguem, palavras e atos capazes de nos libertar do esquecimento, da “lei da morte”, como cantava o nosso grande Camões. Ora, o material a partir do qual Confissões foi forjado é deliberada e obsessivamente restrito e simples. Este livro narra-nos uma história de amor e paixão entre Mário e Ana Maria. Entre o Autor e a sua Mulher de toda a Vida.

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Confissões é uma criação rara, tanto por se encontrar na contracorrente da literatura biográfica, onde o centro do palco é geralmente ocupado pelas obras com ressonância coletiva e impacto na esfera pública e política, como também por entrar numa senda menos percorrida pela literatura erótica da nossa tradição ocidental. Do mito de raízes celtas, Tristão e Isolda, ao Romeu e Julieta de Shakespeare, passando pelo Werther do jovem Goethe, ou ainda nas páginas de Amor de Perdição, febrilmente escritas no cárcere por um apaixonado Camilo Castelo Branco, o amor é celebrado sempre na tensão que separa o sonho da realidade, o finito do corpo da infinitude do desejo. A tradição literária do Ocidente transforma os amantes em apaixonados Ícaros, que ao se elevarem até ao Sol platónico das ideias de Amor e Paixão, queimam as suas asas, e pagam com o sofrimento e a própria vida essa ousadia de frequentaram uma intensidade mais própria de deuses do que de pobres mortais. Na verdade, a escrita amorosa no Ocidente é um dos ramos principais da literatura trágica.

Nesta obra, Mário Moura fala-nos de uma relação amorosa que não só estruturou a sua existência como parece estar possuída por uma energia capaz de sobreviver à duração, à erosão, ao tédio e à entropia, que o tempo introduz inevitavelmente na vida da maioria esmagadora dos seres humanos. A presença do amor na vida do Autor e da sua Ana Maria atravessa todos os estados de consciência e fortalece-se perante todos os desafios existenciais. Aqui brilha uma luz que assume muitas cores. Da exaltação erótica juvenil ao cuidado e ternura de amantes maduros, que defendem o seu tesouro perante as acometidas de um mundo pejado de responsabilidades, com a família, com o trabalho, com a doença e o sofrimento que o peso dos anos sempre transporta no seu curso.

Este é um amor incomparável, também pela sua ligação ao sagrado, pela sua associação ao fenómeno da conversão tardia do autor ao catolicismo. Esta experiência do mais sensível e sensual com a vibração de uma fé num fogo benevolente e divino que se derrama, vivificando o mundo sem jamais se extinguir, confere ao amor um halo de grandeza ontológica e um pulsar dinâmico que não se confina aos amantes, mas antes se pretende e se oferece na partilha com todos os outros. O amor também é sede de justiça, semente de confiança, esperança de fraternidade.

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Pode existir algo de mais poderoso do que o Amor para resumir o bater do coração de uma vida inteira? Poderá haver motivo mais nobre para justificar uma vida plena do que o permanente serviço do Amor, sob todas a suas formas e dimensões?

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