Dulce Pontes: Quando o termo “World Music” (ou música do mundo) faz todo o sentido

Dulce Pontes: Quando o termo “World Music” (ou música do mundo) faz todo o sentido

Dulce Pontes: Quando o termo “World Music” (ou música do mundo) faz todo o sentido

Capacidades artísticas e talento da artista reflectem-se grandiosamente no estrangeiro

 

“O milagre desta voz, que parece chegar de um mundo, no qual a dor não existe”. As
palavras pertencem ao jornal Granada Hoy, a propósito da participação de Dulce Pontes
no Festival Internacional de Música daquela cidade espanhola. Se a frase diz muito, no
universo mundial de elogios a Dulce Pontes, ele diz muito pouco. Porque as suas capacidades artísticas, o seu talento, são de uma dimensão tal, com reflexos internacionais gigantes, ainda que por cá desconhecidos da maioria das pessoas.

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Razões mais que justificadas para trazer aqui um resumo da vida e obra e Dulce Pontes,
em tempo de aniversário de O Setubalense.

A menina nascida no Montijo em 1969, aprendeu a tocar piano, estudou no Conservatório de Música de Lisboa e começou – profissionalmente – pela pop, andou pelas televisões, fez musicais e ganhou o Festival RTP da Canção.

Foi em 1991 e “Lusitana Paixão” deixou marcas na Europa e por cá assumiu o papel de
tema lendário. Dois anos depois, em 1993, “Canção do Mar”, incluída no álbum “Lágrimas” confirma a sua dimensão como fadista – tornar-se-ia um êxito á escala mundial, com a inclusão nas bandas sonoras de uma telenovela brasileira e de um filme de Hollywood, com Richard Gere – e como intérprete de música de raízes populares. “Povo que lavas no rio” de Amália tem uma abordagem única (á falta de melhor classificação). É curioso, hoje, 30 anos depois, recordar como Dulce Pontes se apresentava neste disco: Família: Pai: Zeca Afonso, Mãe: Amália Rodrigues, Avô: Folclore Português, Primos: Folclore Búlgaro e Música Árabe. Estava tudo apresentado. Em 1995 é editado “Brisa no Coração”, um álbum gravado ao vivo no Porto, nesse mesmo ano. No ano seguinte, o álbum “Caminhos” consolida uma carreira ascendente, com a inclusão de temas clássicos como “Gaivota”, “Fado Português” ou o tema popular “Senhora do Almortão” (também ainda hoje um tema incontornável na careira de Dulce Pontes.

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No final da década de 90, dá-se a mudança definitiva: “O primeiro canto”, entre por outros universos musicais portugueses. Aliás, Miguel Sousa Tavares na brochura de apresentação do disco, refere que “muitos insistem em a classificar como a nova Amália Rodrigues, a grande referência do fado português.

Mas neste disco, Dulce Pontes mostra, uma vez mais, que o fado é apenas uma das suas
referências, mas está longe de ser o único espaço disponível para a sua fantástica voz”.
O disco, gravado em Inglaterra e na Holanda, contaria com as presenças de Maria João,
Jaques Morelenbaum, Wayne Shorter, Trilok Gurtu, Kepa Junquera, e Waldemar Basto
e todos os textos foram apresentados em português e inglês. Estava apontado ao universo da World Music.

A entrada no século XXI, vai cruzar o seu caminho com o do Maestro Ennio Morricone. E apetece dizer que o “mundo”, pelo menos da música, nunca mais foi o mesmo. Deste encontro nasce “Focus” um disco genial, no qual Dulce Pontes cantou alguns dos clássicos do maestro italiano, para além de temas escritos por Morricone especialmente para a voz da Dulce Pontes, com a qual estabeleceu uma comovente relação (bem visível) de admiração, respeito e amizade.

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Fariam vários concertos nas maiores salas mundiais em concertos absolutamente
memoráveis. Tive o privilégio de ter assistido a dois concertos de Ennio Morricone com
Dulce Pontes, o primeiro em 2004, no auge de “Focus” e em 2019 na tour de despedida
do maestro em 2019, então com 90 anos. Momentos que ficaram para a vida. “Focus”, que vendeu mais de 300.000 cópias, é hoje um disco intemporal, idolatrado pelos italianos.

Retomando o percurso de Dulce Pontes, em 2006 surge o álbum “O coração tem três
portas”, um disco que inclui duas gravações ao vivo. Uma durante a tour mundial, outro
gravado na Igreja de Santa Maria em Óbidos e no Convento de Cristo em Tomar. O disco inclui ainda a gravação em DVD de um concerto em Istambul, na Turquia. Mas era muito mais que uma compilação de gravações ao vivo, era o retomar de vários caminhos, que iam do fado tradicional ao folclore e às emoções da world music, depois da fantástica aventura que tinha sido a vivida a partir de “Focus”.

As grandes salas de Espanha, França, Alemanha, Inglaterra, Bulgária, Áustria, Itália, Turquia (entre muitos outros países) e da América, abrem-se de par em par, para grandes concertos.

Faz história no mítico Carnegie Hall, com o Jornal New York Times a dizer que “Mrs Pontes tem uma voz extraordinária, ácida, compreensiva, delicada e arrasadora, que se estende acima do nível de uma cantora soprano”. Actua na mítica sala londrina Royal Albert Hall, onde só os grandes pisam o palco.

Caetano Veloso, Cesária Évora, Carlos Nunez, Andrea Bocelli, José Carreras, são alguns dos grandes que com Dulce Pontes fizeram parcerias nos palcos do mundo.

Em termos discográficos regressa em 2017 com “Peregrinação”, um disco duplo no qual, para além de vários originais da própria Dulce Pontes, assume uma viagem pelo universo de Amália, com passagens por José Afonso, Charles Aznavour, Astor Piazolla entre outros. Quase um resumo, estou aqui, e faço isto. E fê-lo de forma arrebatadora na apresentação oficial em Lisboa no Teatro Tivoli BBVA. Memorável concerto.

Em 2022, Dulce Pontes surge com “Perfil”, um regresso “ás origens”, mesmo quando tudo pode parecer óbvio. Ricardo Ribeiro foi o convidado especial de um disco também ele especial.

Ver um concerto de Dulce Pontes é uma experiência emocional que não tem comparação com qualquer outra experiência musical. Pode não ser correcto afirmar que é a melhor experiência, mas que é de uma dimensão única, sem dúvida, porque se trará de uma das melhores e mais verdadeiras cantoras de “world music”. O caminho de Dulce Pontes começou no Montijo e continua no… Mundo.

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