Maria João Camolas: “As autarquias fazem milagres no trabalho cultural”

Maria João Camolas: “As autarquias fazem milagres no trabalho cultural”

Maria João Camolas: “As autarquias fazem milagres no trabalho cultural”

A vereadora com o pelouro da Cultura foca a aposta diminuta da tutela no sector para realçar a excelência da oferta promovida pelos municípios com parcos recursos financeiros. E Palmela, garante, é disso “um grande exemplo”

 

Em Palmela, cinco por cento do Orçamento Municipal é anualmente afectado à área da Cultura. O que representa “cerca de 2 milhões de euros”, revela Maria João Camolas, responsável pelo pelouro na Câmara Municipal.

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A vereadora critica o reduzido investimento da Administração Central no sector para sublinhar que os municípios, em colaboração com os parceiros, fazem muito mais com muito menos. Debruça-se sobre a estratégia seguida em Palmela, os diversos eventos que marcam a programação no concelho, as infra-estruturas e os promotores culturais ali instalados. E avalia com 8 (em 10 pontos possíveis) a oferta cultural existente no concelho.

 

Qual é o investimento anual do município na Cultura? Que percentagem representa esse valor no Orçamento Municipal?

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Aproximadamente 2 milhões de euros por ano, o que representa globalmente 5% do Orçamento Municipal.

 

Ao olhar para o município de Palmela, sente-se plenamente satisfeita pela oferta cultural que é apresentada à comunidade ou acha que essa oferta deve ser maior e mais alargada a outras áreas?

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Naturalmente que não me sinto plenamente satisfeita, desde logo por considerar muito escasso, diminuto até, o peso que representa a Cultura no dito Orçamento do Estado 2023, entenda-se aproximadamente 0,43% do orçamento global.

Portanto, com este quadro, as autarquias fazem milagres com os seus orçamentos e sobretudo no trabalho cultural que desenvolvem nos seus territórios com os seus parceiros. Palmela é disto um grande exemplo, uma terra riquíssima na sua história, com um forte movimento associativo centenário, com uma indelével e incontornável marca social e cultural que contribuiu ao longo de muitas gerações para o acesso, fruição, produção cultural e recreativa, em especial no ensino da música, do teatro, na dança e das artes de palco. As múltiplas parcerias, o apoio continuado ao tecido associativo e as redes partilhadas reforçam a Cultura, tão importante e essencial para a vida comunitária. A responsabilização entre pares é uma força no processo de desenvolvimento do local e de resiliência, num quadro particularmente adverso, onde o município é mediador activo, parceiro de proximidade na defesa da Cultura pública, onde a oferta deve ser sempre o mais alargada possível a fim de criar sempre mais e melhores novos públicos.

 

De 1 a 10 como classifica a oferta cultural do município, englobando também a dos agentes e promotores do sector?

Oito e quero chegar a dez!

 

Ao longo do ano são vários os eventos promovidos. A Festa das Vindimas assume um carácter diferente das demais festividades populares, por aquilo que representa para um sector em que Palmela é bastante forte?

A Festa das Vindimas celebra 60 anos, foi a primeira festa das vindimas em Portugal, teve como primordial objectivo a promoção dos vinhos produzidos em Palmela, das suas casas agrícolas, dos pequenos viticultores aos grandes produtores e representa a expressão máxima da cultura de um povo, do movimento associativo e forças vivas. Palmela é sem dúvida o berço de uma região vitivinícola sem igual na Península de Setúbal, onde o culto da vinha e do vinho é ancestral, como as suas tradições musicais, reafirmando Palmela como terra mãe de vinhos.

 

O Festival Queijo, Pão e Vinho, organizado pela ARCOLSA mas com o apoio do município, é outro dos eventos de referência e, tal como os fins-de-semana gastronómicos, promove os produtos locais e regionais. Este ano voltou a bater o recorde de visitantes. O evento pode crescer muito mais?

O evento cresceu muito, mas mais do que crescer importa qualificar e dar continuidade a um evento que acima de tudo é uma montra dos produtos de excelência produzidos neste maravilhoso território. Ainda na freguesia de Quinta do Anjo, no contexto do programa “Palmela é Música” nasceu em 2022 um novo festival tomando e tomado pela aldeia de Quinta do Anjo, um festival de co-produção com as gentes locais, que é marca do município de Palmela, o de capacitar, fazer com as pessoas e transformar, que muito surpreendeu na promoção daquele território, da música tradicional, popular e de fusão que o folk traduz e com um nome que foi ganho por todos os que por lá passaram: o “Méee Festival Folk” já conquistou.

 

Outra das expressões culturais que costuma atrair muita gente é a Feira Medieval de Palmela. Que balanço faz a esta iniciativa, tendo em conta as edições decorridas?

O balanço é bastante positivo, Palmela conquista pela sua beleza natural e bem receber e tem no seu Castelo, classificado como monumento nacional, marca do seu território, assumindo papel de relevo na dinâmica cultural do concelho, sendo palco de diversas actividades, cenário privilegiado da Feira Medieval, que atrai milhares de visitantes, mas também das exposições e concertos na Igreja de Santiago, também ela monumento nacional, passando pela demonstração de esgrima histórica, das visitas encenadas ao Castelo que têm vindo a conquistar e atrair a curiosidade de quem nos visita.

É no Castelo de Palmela que se encontra sediado o Gabinete de Estudos sobre a Ordem de Santiago (GEsOS), o que também tem permitido reunir em Palmela investigadores das mais diversas proveniências, seja nos Cursos sobre Ordens Militares ou Castelos ou na preparação do IX Encontro sobre Ordens Militares, que se realizará em 2023.

Com este enquadramento também o Palmela Wine Jazz, que é já uma referência cultural quer para os amantes do vinho de Palmela quer para os amantes do Jazz, uma combinação perfeita.

 

Como vê o Festival Internacional de Gigantes e o Festival Manobras, de marionetas? Acha que já alcançaram dimensão, escala, sufi ciente?

O FIG é uma iniciativa do município de Palmela com os parceiros Bardoada – O Grupo do Sarrafo, ATA – Acção Teatral Artimanha, Associação Juvenil COI e PIA – Projectos de Intervenção Artística. Cruza as artes tradicionais e as expressões contemporâneas. Ainda pode crescer mais, alargar fronteiras e sobretudo envolver mais actores locais e comunidade educativa. A completar 30 anos de existência, é presença bienal no calendário cultural da região e do País e conquistou também o seu reconhecimento na Europa, tendo recebido o selo de qualidade, que identifica o festival como parte integrante da plataforma EFFE (Europe for Festivals, Festivals for Europe), criada pela Associação de Festivais Europeus.

Outro conceito é o Festival Manobras, que é um festival internacional que inclui espectáculos de marionetas nacionais e internacionais, percursos pelo território, residências artísticas e oficinas. É uma organização da Artemrede em parceria com os seus municípios associados e com o co- -financiamento do programa Centro 2020. Palmela acolhe o festival desde a sua origem no quadro de membro da Artemrede e da sua direcção há mais de uma década, em vários locais do concelho e equipamentos culturais. Mas ao longo do ano, além destes, sucedemse outros dois festivais incluídos nas acções de calendário regular, no concelho: o FIAR – Festival Internacional de Artes de Rua e o FISP – Festival Internacional de Saxofones, organizado por Sociedade Filarmónica Humanitária, Conservatório Regional de Palmela e ARTEMSAX, reconhecidos pela DGArtes, são algumas das mais conhecidas e participadas acções que decorrem no concelho e no centro histórico da vila.

 

De todos estes festivais, festas e feiras, o que tem maior retorno em termos turísticos?

Todos deixam incontornavelmente a sua marca no território, nas nossas gentes, e no olhar e usufruir da cultura.

 

Vamos às infra-estruturas. O Museu “A Estação”, em Pinhal Novo, é um dos ou o projecto mais recente que veio preservar a identidade e dinamizar a Cultura local. Até porque, é mais do que um mero espaço onde se pode apreciar o espólio recolhido. Está a ter a procura que era esperada, no que toca a visitantes?

O Museu – A Estação tem vindo a impor-se como uma referência, pela temática que aborda, pelo envolvimento dos antigos ferroviários e pela preocupação com a acessibilidade e inclusão. São muitos os visitantes, aproximadamente nove mil por ano. As visitas orientadas “No meu tempo” que decorrem uma vez por mês no Museu – A Estação são igualmente muito participadas.

 

Dizer também que concluiu-se em 2022 o processo de revisão do Programa Museológico, importante documento orientador para o programa cultural, e o município foi reconhecido pelo seu trabalho no âmbito do património cultural, com a atribuição de uma Menção Honrosa pela Associação Portuguesa de Museologia, na categoria Inovação e Criatividade, com a maleta pedagógica “Hermenegildo Capelo”. Foi ainda distinguido entre os melhores na categoria de Inovação na 5.ª Edição do Prémio Cultura21, da Organização Mundial de Cidades e Governos Locais Unidos, que reconhece as cidades com as melhores práticas mundiais na promoção dos direitos culturais, e pela conquista do prémio Finisterra Arrábida Filme Art & Tourism Festival, pelo filme “Balmalla”- Palmela, uma fortifi cação com mais de 1 000 anos de história.

 

Palmela tem o Cine-Teatro S. João, a principal sala de espectáculos do concelho, há também o Auditório Municipal Rui Guerreiro, em Pinhal Novo, entre outros espaços. Considera que o concelho está bem servido ou fazem falta outros equipamentos para responder à oferta cultural existente?

Os investimentos na requalificação de equipamentos culturais são uma necessidade e realidade. Exemplo disso foi a recente inauguração do Monte do Francisquinho na freguesia de Pinhal Novo, do Centro Comunitário de Águas de Moura e ainda as intervenções de efi ciência energética no Auditório Municipal Rui Guerreiro e no Cine-Teatro São João em Palmela, este último, classificado como monumento de interesse público pela Direcção Geral do Património Cultural e acreditado pela Rede de Teatros e Cine-Teatros Portugueses (RTPC) pelo Ministério da Cultura. E ainda na aquisição pelo município do edifício do Cineteatro São Gonçalo em Cabanas, freguesia de Quinta do Anjo. A intervenção municipal, além da gestão e programação nestes equipamentos, passa pela gestão, estudo e promoção do Património Cultural, como são exemplo a recuperação de espaços como o Salão Nobre dos Paços do Concelho, a Capela de São João Baptista ou o antigo posto da GNR de Palmela, futuro Centro de Investigação do Património Cultural.

 

Se olharmos para o espectro da dinâmica de grupos, sobretudo de teatro, existe mais de uma mão cheia de companhias ou projectos residentes no concelho. O Bando, Ensaiarte, Teatro sem Dono, Acção Teatral Artimanha, Projectos de Intervenção Artística (PIA), Tela… A “cena” em Palmela, concelho, está bem representada?

É verdade. Desde as companhias de teatro amador às profissionais, todas desenvolvem um papel extraordinário. A presença no território de estruturas profissionais, como é o caso do Teatro O Bando, a PIA, a DançArte, ou o Conservatório Regional de Música de Palmela, são de grande importância para a afirmação cultural e artística local e projectam o nome Palmela além das suas fronteiras. O envolvimento que as estruturas profissionais têm estabelecido com os agentes culturais locais constituem um forte contributo para o reconhecimento de Palmela como terra de cultura.

 

 

Desejos “Uma bienal de artes tradicionais e digitais, um festival literário ou um de música clássica”

São três os eventos que a autarca gostaria de ver implementados no território. Até porque, justifica, Palmela é um “território com grande tradição cultural”.

 

O que gostava de ver concretizado no domínio cultural pelo município, que ainda não tenha sido realizado?

Uma Bienal de Artes Tradicionais, Contemporâneas e Digitais. Eventualmente um grande Festival Literário, já dizia José Saramago: “Somos as palavras que usamos. A nossa vida é isso”. Ou um grande Festival de Música Clássica, para os amantes desta arte, que são muitos. Somos um território com uma grande tradição cultural e temos de oferecer uma variedade musical sem barreiras, desde a música barroca, contemporânea, à música de vanguarda, ópera… não importa!

Palmela é um laboratório, onde se dinamizam novas iniciativas e novas políticas, que transformam a música e a cultura numa estratégia de desenvolvimento, que não necessita de hipotecar o futuro e o ambiente, apenas carece de criatividade e inovação. É este o desafio que perseguimos.

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