De uma forma geral, as Urgências de Ginecologia e Obstetrícia dos hospitais públicos registam constrangimentos e encerramentos, por dificuldade em assegurar escalas de médicos especialistas, mas esta é apenas a face mais visível do caos generalizado que se verifica no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Com as longas listas de espera das consultas e cirurgias, fortemente agravadas no período da pandemia de Covid-19, muitos portugueses com patologias e doenças graves não tiveram o seu diagnóstico a tempo. Por isso, não admira que as estatísticas registem um aumento considerável da mortalidade por todas as causas.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), em maio último ocorreram 10 323 óbitos. Trata-se de um número de mortes mais comum nos meses de inverno, habitualmente com maior mortalidade do que os meses de primavera e verão, mas inédito para o mês de maio, pelo menos desde 1980, de acordo com dados do INE.
Por sua vez, no mês de junho, com 10 215 óbitos, registou-se uma subida de 26% face à média de mortes diárias entre 2009 e 2019, o intervalo de referência pré-Covid. Este número de mortes não se verificava, pelo menos, desde 1980, e até é possível que seja o número mais alto, desde sempre, num mês de junho.
A mortalidade por Covid-19 explicará parte do excesso de mortalidade que se registou em maio e junho de 2022, mas não explica todas as mortes a mais que ocorreram nestes meses, face ao que era comum em anos anteriores.
Esta considerável expressão da mortalidade não Covid tem, evidentemente, causas diversas, de entre as quais se pode destacar:
- o aumento do número de casos urgentes que não tiveram a resposta adequada e atempada;
- o aumento do número de doentes crónicos que deixaram de ser controlados;
- o aumento do número de pessoas que deixaram de ver as suas doenças diagnosticadas por dificuldade de acesso aos cuidados de saúde ou a rastreios, situação particularmente grave no caso das doenças cardiovasculares, oncológicas e do aparelho respiratório.
O Senhor Bastonário da Ordem dos Médicos, Dr. Miguel Guimarães, avança com uma explicação para o aumento da mortalidade: “Deve-se ao facto de, desde 2020, ter havido milhões de consultas e de exames complementares de diagnóstico por fazer”. Referiu, ainda, que a pandemia criou “um excesso de dificuldade de acesso aos cuidados de saúde”.
Ao aumento da mortalidade que se tem verificado nos últimos meses não é alheio o caos no SNS e que resulta, essencialmente, da inércia do Governo, fruto da cegueira ideológica da “geringonça”, que condicionou as políticas de saúde e que conduziu, por exemplo, à péssima decisão de acabar com as Parcerias Público-Privadas (PPP), que provaram funcionar bem. De facto, devolvidos esses hospitais à gestão pública, nas regiões de Loures, de Braga ou de Vila Franca de Xira, assistimos à degradação dos serviços de saúde, em termos de acesso e de qualidade.
Hoje, o Senhor Primeiro-Ministro, responsável máximo pela situação catastrófica do SNS, reconhece os problemas estruturais deste serviço público, mas a obsessão ideológica e o acantonamento, por oportunismo político, à extrema-esquerda, impediram-no de, ao longo de 7 anos de Governo, executar as reformas que o Serviço Nacional de Saúde exige.
A grave crise no SNS, que atinge, em maior escala, os portugueses com parcos meios financeiros, não decorre apenas de um problema de afetação de recursos. Trata-se de um problema de fundo, que só se resolve com reformas estruturais que permitam:
- assegurar o acesso universal dos portugueses à saúde;
- cumprir a meta tão reiteradamente adiada de atribuir médico de família a todos os portugueses;
- garantir a qualidade da resposta assistencial nos cuidados de saúde de proximidade.
Que seja este o principal foco nas reformas a implementar no SNS. Porque este, sim, para o PSD, deve ser um desiderato nacional.