Quantas pessoas vivem em Portugal em bairros degradados? Quantas crianças? Quantas pessoas não têm uma casa que cumpra os mais básicos direitos humanos, como água, eletricidade ou esgotos? Esta é uma realidade que já não aparece nos telejornais e que julgamos ultrapassada desde o dia em que os concelhos mais ricos das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto conseguiram erradicar os principais problemas. Porém, estes bairros ainda existem no distrito de Setúbal.
Um, talvez o mais conhecido, é o bairro do Segundo Torrão, na Trafaria. Uma bolsa de miséria inaceitável, resultado de décadas de governação do PCP e para o qual o PS não tem solução. Enquanto noutros concelhos as barracas foram erradicadas, o Segundo Torrão manteve-se (e até cresceu). As oportunidades geradas pelo crescimento económico do final dos anos 80 do século passada, e mesmo as (poucas) que resultaram do crescimento económico medíocre que se seguiu, possivelmente capazes de tirar as pessoas da pobreza, não chegaram ao Segundo Torrão. E o fim das desigualdades, tão apregoado pela esquerda, foi alcançado com uma vergonhosa mancha de pobreza.
No bairro do Segundo Torrão, fruto da sua origem clandestina, ilegal, e do seu crescimento desordenado, não existem infraestruturas básicas. O fornecimento de eletricidade não está regularizado e os sistemas de saneamento e de recolha de lixo são deficientes. Os arruamentos são precários – com a chuva, transformam-se em autênticos rios de lama – a iluminação pública é, praticamente, inexistente e a acessibilidade, em caso de emergência, não está assegurada.
Como se já não bastassem todas estas dificuldades, recentemente, identificou-se um problema iminente na vala de drenagem de águas pluviais que passa por baixo do bairro. De acordo com a informação da Câmara Municipal de Almada, no seguimento das conclusões de um relatório dos Serviços Municipais de Proteção Civil, “as construções localizadas sobre o troço coberto da vala e da sua área de influência, se encontram em risco de ruir, em caso de colapso da sua cobertura, podendo vitimar os seus ocupantes”. Isto significa um despejo repentino de dezenas de famílias e a necessidade urgente do seu realojamento.
Quando está em causa a segurança das pessoas, é evidente a necessidade de uma atuação célere, que é muito difícil para todas as entidades envolvidas, mas, que, naturalmente, é mais difícil para todos os que são, diretamente, afetados – os moradores. Por este motivo não podemos ficar indiferentes aos seus relatos, do dia 21 de junho, na Assembleia Municipal de Almada. Assistimos a pessoas preocupadas com a forma como todo o processo está a decorrer, algumas com dúvidas sobre a alternativa proposta de procurarem uma casa pelos seus próprios meios, ao abrigo de um programa cheio de critérios burocráticos que, na realidade, bloqueiam qualquer solução, outras com dúvidas sobre a identificação das casas afetadas ou sobre a avaliação de risco realizada.
Relatos que ouvi, também, quando visitei o bairro, na passada sexta-feira, 29 de julho. Entre os moradores reina a incerteza sobre o seu futuro, mas, principalmente, sobre a escola das crianças e as deslocações para o emprego. Não podemos ficar indiferentes.