Alexandrina Pereira e Sebastião Fortuna: entre versos e telas

Alexandrina Pereira e Sebastião Fortuna: entre versos e telas

Alexandrina Pereira e Sebastião Fortuna: entre versos e telas

, Professor
11 Março 2022, Sexta-feira
João Reis Ribeiro

Da junção dos versos de Alexandrina Pereira com os quadros de Sebastião Fortuna (fotografados por Paulo Alexandre Ferreira) nasceu uma obra pintada de palavras e versejada com cores, graças a vinte e seis telas e outros tantos textos que as reinterpretam a partir do título que o pintor lhes deu.

O trabalho está reunido sob o título “Sebastião Fortuna – O Pintor de Sonhos”, acabado de aparecer, em edição de autor apoiada pelas Juntas de Freguesia de Palmela e de Quinta do Anjo.

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Entre “Leva-me contigo para ver o mar”, título da primeira imagem e do correspondente poema, e “Coerência”, que baptiza a última tela e respectivo poema, há um itinerário que se cumpre, balizado por símbolos recorrentes como a água, a casa, a árvore, o vento, os animais ou os barcos, sempre num enquadramento espacial em que a Natureza domina.

De diferente forma se mostram as flores, outra assídua presença, enquadradas como elemento decorativo, envasadas, a transportarem a Natureza para os espaços interiores. Os poemas correm atrás das cores e dos motivos pictóricos, quase variações do visível, glosas dos títulos, que assim se afirmam como motes responsáveis pela recriação.

Em várias circunstâncias, o universo sugerido apresenta-se como próximo do sonho, um pouco a fazer justiça ao epíteto trazido para título da obra – se dúvidas houvesse, uma designação como “Eu vou nas asas do vento”, puxada para legenda de quadro, provaria esse rumo para uma utopia, logo ajudado pelos versos correspondentes – “o meu sonho / é figura de proa / é rosa dos ventos / e carta de marear / meu norte / que me impede / de vergar”.

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O tom lírico sugerido pelas telas, onde vingam a ausência da figura humana e os espaços de afastamento ou de isolamento, pauta a emotividade espelhada em cenários de infinito conducentes a certa dose de introspecção (“Dos meus dedos / caem lágrimas inúteis // gritos que guardo / bem dentro de mim”), embora alguns poemas denotem a presença da segunda pessoa ou de um “nós”, que também pressupõe o outro – “E no alvo caminho / que abraça / o voo dos pássaros / repousamos os lábios / no regato do silêncio”.

O trabalho poético, inseparável da labuta do pintor, apresenta-se lento e pessoal – “Borda-se um poema / de sons e matizes / envolto em segredo / e nasce Poesia” -, num percurso que pretende conferir vida, mesmo nas circunstâncias em que ela parece não existir – “Ao chegar o Outono / todas as folhas / adormecem no chão // (…) os dedos esguios / da poesia / erguem-nas de novo / singrando poemas.”

Os poemas que Alexandrina Pereira constrói para este livro surgem como metáforas do retrato que o texto prefacial por si assinado faz de Sebastião Fortuna, um artista com a “capacidade para criar beleza e arte em tudo o que toca e, com uma permanente naturalidade, dizer aos outros que das coisas mais simples podem nascer maravilhas capazes de tornar as nossas vidas num momento de felicidade.”

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Afinal, outra forma de explicar aquilo que o pintor afirma de si próprio, ainda que universalizando o sentimento – “É acreditando no nosso sonho e lutando pela sua realização que as coisas acontecem.”

De imediato, somos levados a associar aqueles versos de um outro Sebastião, que anunciou: “Pelo sonho é que vamos. / (…) Chegamos? Não chegamos? / (…) Partimos. Vamos. Somos.”

De Sebastião da Gama, claro. Ao conferir-lhe o título de “pintor de sonhos”, Alexandrina Pereira descobre a maneira como Sebastião Fortuna construiu a sua utopia…

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