Se não lutar agora para aproveitar a nova NUT II, a nossa região ficará integrada na AML, com o centralismo de Lisboa a dobrar
Os últimos desenvolvimentos sobre as opções de divisão administrativa do país mostram que a Península de Setúbal não pode adiar mais a opção que precisa de fazer quanto à regionalização.
Na quinta-feira, os autarcas comunistas de Setúbal, Seixal, Palmela e Sesimbra denunciaram um corte drásticos nos fundos do Portugal 2030 para a Área Metropolitana de Lisboa (AML). A região mais rica de Portugal vai receber apenas 3,9% do bolo e, com isto, a Península de Setúbal, apesar de ser das regiões mais pobres, recebe mais uma forte machadada no seu direito a condições de desenvolvimento em pé de igualdade com as demais regiões do país e da Europa.
Este novo corte, previsto no acordo de parceria de Portugal com a Comissão Europeia, para o PT2030, faz todo o sentido, no quadro nacional e no âmbito das políticas europeias de coesão. O que está errado é que a região de Setúbal integre a região de Lisboa e, com isso, seja também considerada rica.
E este fim-de-semana, no XXV Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), o primeiro-ministro confirmou a disponibilidade para propor a Bruxelas a criação de duas novas regiões NUT II: a da “Península de Setúbal” e a do “Oeste e Vale do Tejo”. Estas novas NUT II juntam-se às outras cinco já existentes em Portugal Continental; Norte, Centro, Lisboa, Alentejo e Algarve.
Embora não admita que a regionalização avance com sete regiões, por entender ser “de bom senso que as regiões administrativas devem ser as actuais cinco regiões [quadro]”, António Costa abre essa porta e isso mostra que é possível, se a nossa região fizer o trabalho de casa que lhe compete.
Tanto na moção que presentou ao congresso do PS, em Maio, como agora no congresso da ANMP, o líder do PS e primeiro-ministro aponta para 2024 o referendo à regionalização que a Constituição impõe. António Costa defende, até, que se comece já o processo de integração das direcções-gerais (primeiro as da educação e cultura) nas CCDR.
Este calendário dá-nos o tempo suficiente – mas é preciso começar já – para fazer ver que a Península de Setúbal não pode ficar integrada na região administrativa de Lisboa. Todas as razões apontam para a necessidade dessa separação. Seja na perspectiva politica, económica ou social, a região de Setúbal só tem a ganhar em não ficar com Lisboa. Setúbal ganha em peso e autonomia política se tiver as instituições regionais mais próximas, em condições económicas, pelas vantagens no acesso aos fundos de coesão e na gestão das políticas de promoção e atractividade, e na capacidade de resposta social, em consequência dos ganhos de desenvolvimento obtidos pelos dois pontos anteriores.
Aliás, qualquer região à volta de Lisboa ganha se não integrar a região administrativa da capital do país. Basta olhar para os casos de outros países com regiões autónomas, a começar por Espanha, para perceber essa lição.
Ficar integrado na região de Lisboa é ficar sujeito ao centralismo da capital de forma dupla. O ideal para Portugal é que Lisboa (eventualmente uma Grande Lisboa, com Cascais e Oeiras) fique reduzida ao menor peso demográfico e geográfico possível. Pelas razões politicas evidentes mas também porque os fundos de coesão são calculados com base per capita. Para a União Europeia, cada cidadão das regiões desfavorecidas “vale” 7500 euros. Sendo assim, como podemos considerar acertado termos uma região administrativa de Lisboa (considerada rica) que, além de integrar duas regiões periféricas pobres, inclui um terço da população do país? Dos 3 milhões de cidadãos da AML, cerca de dois terços (2 milhões), vivem em áreas que precisam de continuar a receber apoios à convergência. Isto corresponde a muitos milhões de euros que Portugal deixa de receber de Bruxelas. É um erro tremendo.
Assim, mostrando-se necessário e possível que a Península de Setúbal tenha uma outra estratégia para a regionalização, é essencial que as forças locais e regionais assumam esta causa.
É fundamental que os autarcas percebam que não perdemos nada em alterar a actual AML, em dimensão territorial e quanto à sua natureza e atribuições. A organização entre as duas margens do Tejo faz falta para realizações específicas como os transportes, mas são domínios pontuais que podem subsistir enquanto tal. A autoridade de transportes metropolitanos pode e deve manter-se, mas não precisa de impedir a correcta divisão administrativa de todo este território.