DGAV: a emenda e o soneto

DGAV: a emenda e o soneto

DGAV: a emenda e o soneto

20 Abril 2021, Terça-feira
José Luís Ferreira

A intenção do Governo de retirar da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária as competências na área do bem-estar dos animais de companhia pode vir a revelar-se um erro histórico e um retrocesso no caminho que temos vindo a fazer em torno da defesa do bem-estar-animal.
Com efeito, mesmo com a gvisível falta de recursos humanos, a DGAV, tem vindo ao longo do tempo a melhorar substancialmente as regras do bem-estar animal e a fortalecer a defesa da saúde pública, nomeadamente controlando e evitando a propagação de doenças animais transmissíveis aos humanos.
O problema está, portanto, na falta de recursos humanos, e o Governo, ao invés de dotar a DGAV de meios humanos, faz o mais fácil, retira competências à DGAV e transfere-as para o ICNF, que também continua com uma gritante falta de profissionais, apesar dos reforços que, por propostas dos Verdes, conheceu nos últimos anos. Ora, com a acumulação de mais estas competências, o problema da falta de pessoal no ICNF vai naturalmente agravar-se, com reflexos ao nível do bem-estar animal dos animais de companhia, como também no que diz respeito às restantes competências em matéria da conservação da natureza. Ficamos, portanto, a perder dos dois lados.
Mas mais, na área do bem-estar animal, enquanto matéria técnica estudada e regulamentada, é na DGAV que está o conhecimento acumulado e a experiência legislativa resultantes de anos de partilha de informação com as congéneres europeias e mundiais, e se o Governo está a pensar em transferir técnicos da DGAV para o ICNF, a situação da DGAV, ficará absolutamente insustentável e incapaz de dar resposta aos problemas que temos pela frente relativas às importantes competências que permanecerão na DGAV, nomeadamente ao nível do bem-estar animal dos animais que não sejam animais de companhia. Ficamos assim a perder dos ”três lados”.
É, de facto, necessário tomar medidas para que não se repitam as condições que levaram aos acontecimentos que vitimaram dezenas de cães em canis ilegais em Santo Tirso, mas procurar resolver os problemas, se é que se resolvem, criando outros problemas não é, de todo, solução.
É o que dá decidir em resultado do impulso imediato e das pressões populistas e até fundamentalistas, que procuram resolver os problemas, impondo comportamentos e até hábitos alimentares – sobretudo, sem assegurar uma transição sustentável dos sectores envolvidos, nomeadamente da produção animal para a alimentação humana no nosso país, que muito tem contribuído para não agravar a desertificação do interior e o abandono do mundo rural – fragilizando ainda mais a produção nacional e acentuando a nossa dependência alimentar, um pouco na tese do Ministro do Ambiente de que seria mais barato comprar carne no estrangeiro do que produzi-la cá, ignorando, não só, que se não produzirmos não conseguimos comprar, mas também a pegada ecológica promovida pelo transporte dessa carne.
Por tudo isto, a passagem dessas competências da DGAV para o ICNF representa um erro monumental, será pior a emenda que o soneto.

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