Caro leitor, o PRR (com 147 páginas, 3 dimensões estruturantes ― Resiliência; Transição climática e Transição digital ―, 19 componentes, 36 reformas e 77 investimentos) é crucial para reanimar a economia após a devastação da pandemia, pois disponibiliza avultados recursos financeiros, uma parte a fundo perdido, outra em empréstimos com juros muito baixos. Estes recursos financeiros excepcionais ― que privilegiam as infraestruturas (833 milhões) e a mobilidade sustentável (1032 + 300 milhões) ― são ainda acompanhados pelos fundos europeus dos quadros comunitários em vigor. O país tem, portanto, uma oportunidade única para resolver alguns dos problemas que persistem.
A importância e a complexidade do PRR exigiam uma consulta pública mais longa do que de 15 de Fevereiro a 1 de Março. Mesmo assim, teve 200 contribuições da cidadania. Mas se os cidadãos tiveram esta limitação, as instituições e entidades (públicas e privadas), não tiveram, pois dispõem de meios e de saberes para responderem em tempo útil à consulta pública.
Vou referir-me agora ao que quero abordar hoje ― dois problemas da Península de Setúbal com quase vinte anos ―, por estranhar que deles não se fale a propósito do PRR. São a extensão do MTS-Metro Transportes do Sul aos concelhos do Barreiro e Moita (prevista em 2007, quando foi inaugurado) e a conclusão da Estação Ferroviária do Pinhal Novo (obstaculizada pelos autarcas de Palmela em 2004).
O estranho silêncio das autarquias que têm populações afectadas (e das associações como a AMRS-Associação de Municípios da Região de Setúbal e a AML-Área Metropolitana de Lisboa), assim como das associações empresariais e outras (que são, além dos populações, também afectadas, directa ou indirectamente), é para mim um enigma.
Há dias, este jornal referia a estranheza da presidente da Câmara de Almada que o MTS não constasse nas candidaturas ao PRR e prometia intervir junto da AML. Não ouvi mais ninguém falar de nenhum destes dois problemas prementes e essenciais para a melhoria da mobilidade sustentável na região. Sobre a Estação do Pinhal Novo, eu tenho escrito vários artigos, cuja reação dos que obstaculizaram a sua conclusão é dizerem que falo sempre do mesmo. Esquecem-se de que sofremos, todos os dias, há 17 anos, as nefastas consequências da sua absurda acção. Quererão que fiquemos calados e, talvez, agradecidos? Sobre isto, dos autarcas aos dirigentes partidários locais e aos deputados do distrito, tem havido um alheamento (ou desconhecimento), de que resultou um silêncio de cemitérios.
É inegável a importância do MTS na interligação entre vários núcleos populacionais dos concelhos do Barreiro e Moita aos concelhos servidos por este meio de transporte, Almada e Seixal (mas nestes é necessário cobrir melhor a malha urbana), e, também, na intermobilidade que essa expansão e interligação permitiria com os modos de transporte ferroviário, rodoviário e fluvial, ajudando a aliviar o intenso fluxo diário de carros particulares nas duas pontes para Lisboa.
A conclusão da Estação do Pinhal Novo permitiria aos dois comboios que, em cada hora, terminam (e invertem) o percurso entre Lisboa e Coina chegarem ao Pinhal Novo (como estava previsto em 2004) e pôr a funcionar o terceiro comboio da Fertagus que chega a Setúbal em complementaridade com os dois da CP que, em cada hora, a ela chegam e dela partem para o Barreiro. E acabar com o outro absurdo destes três comboios circularem entre Setúbal e o Pinhal Novo (onde se separam) apenas em trinta minutos de cada hora e nos outros trinta não haver nenhum.
Como resultado final, a oferta para (e de Lisboa) seria aumentada de três para cinco comboios por hora. Lembro que na extensão da Fertagus a Setúbal se gastou 255 milhões de euros e na Estação do Pinhal Novo 25 milhões para se ter um comboio por hora. Uma grande estação interface a funcionar em pleno seria uma mais-valia para o concelho de Palmela e para a vila do Pinhal Novo.
Será o PRR mais uma oportunidade perdida para estender o MTS ao Barreiro e Moita e concluir a Estação do Pinhal Novo?