Ao longo dos anos o Bloco de Esquerda tem sido solidário com a reivindicação de
autarcas, empresários e intervenientes no tecido social e económico da região por
melhores regras de acesso da Península de Setúbal aos quadros comunitários de apoio. A
razão é evidente: a pertença da Península de Setúbal à mesma Unidade Territorial para
Fins Estatísticos (NUTS) de Lisboa impede que a nossa região, mais periférica e mais
pobre do que a capital, tenha acesso a condições mais favoráveis nos fundos europeus
necessários para projetos de desenvolvimento económico e social.
Além do diagnóstico, que identifica a injustiça, a solução também parece recolher apoio
maioritário na região: a recuperação de uma NUTS III autónoma incluindo os nove
concelhos: Alcochete, Almada, Barreiro, Moita, Montijo, Palmela, Sesimbra, Setúbal e
Seixal.
No entanto, é importante lembrar que o acesso a fundos europeus não é a única razão
pela qual a Península de Setúbal sofre de problemas estruturais como a falta de
transportes coletivos públicos de qualidade e tendencialmente gratuito, a dificuldade na
mobilidade inter-concelhia, as debilidades na proteção ambiental, a desorganização
urbanística, a grave emergência habitacional ou baixos níveis de acesso a cuidados de
saúde primários, a par da fragilidade social que se revela em taxas de pobreza,
desemprego e até de violência doméstica, superiores às de Lisboa.
Tanto o Partido Socialista, agora com mais responsabilidades governativas, como o
Partido Social Democrata têm feito do acesso aos fundos comunitários o alfa e o ómega
do desenvolvimento da região, sem assumirem responsabilidades pela privatização ou
quasi-desmantelamento de empresas estratégicas como o Arsenal do Alfeite ou a EMEF
(para não ir mais atrás); pela ausência de uma política de portos coerente; pelos atrasos
persistentes em grandes investimentos como o Hospital do Seixal, a ponte Seixal-Barreiro
ou a expansão do Metro Sul do Tejo (só para citar alguns); pela explosão de precariedade
numa área industrial que em tempos orgulhou as lutas operárias; pela irresponsabilidade
de investimentos avulsos e de curto-prazo como a construção de um aeroporto no
Montijo.
Regressando à questão das NUTS, também aqui é preciso memória. Desde logo, para
lembrar que a integração da Península de Setúbal na região mais rica do país foi feita a
pedido do Governo PSD/CDS sem o acordo dos municípios da região, uma decisão que
não tem merecido o devido reconhecimento por parte dos autarcas destes partidos que
agora reivindicam a sua reversão.
Por outro lado, ao longo dos últimos anos, e não obstante todos os pedidos de
esclarecimento e declarações de intenções de autarcas e deputados do PS eleitos por
Setúbal, o Governo de António Costa não se comprometeu em fazer chegar esta
reivindicação a Bruxelas. Em 2017, o ex-Ministro do Planeamento Pedro Marques
declarou que a pretensão era impossível à luz das regras de Bruxelas, tendo sido
desmentido por representante da Comissária Elisa Ferreira quando respondeu que cabe
aos Estados-membro iniciar o processo de mudança e que “nenhum pedido foi submetido
por Portugal nesse sentido aos serviços da Comissão no prazo regulamentar previsto –
até 1 de fevereiro de 2019”.
No final de 2020, a Ministra da Coesão, Ana Abrunhosa, considerou que era urgente
constituir a NUT III. No entanto, já em janeiro de 2021 defendeu uma “nova estratégia
“específica e especial para a Península de Setúbal, sem necessidade da criação de uma
NUT III” e que “qualquer alteração a ser feita às NUT não seria feita em tempo útil para
aplicar ao Portugal 2030”.
Depois de tantos avanços e recuos, é tempo de tomar uma posição firme. O Bloco de
Esquerda considera que a reivindicação dos municípios da Península de Setúbal para a
constituição de NUTS autónoma que permita reforçar o acesso a fundos europeus é justa
e merece apoio. Essa alteração não deve pôr em causa a articulação estratégica no âmbito
da Área Metropolitana de Lisboa, nem substituir-se às responsabilidades de investimento
público que têm falhado em sucessivos governos, pelo contrário, deve promover a coesão
com políticas de igualdade e reforço do investimento público.