Até onde sabemos, nunca o mundo se modificou tanto como nos últimos anos nem de forma tão avassaladora e abrangente. Os avanços tecnológicos, aplicados a diversas áreas, continuam a trazer impactos incontornáveis ao nosso quotidiano, traduzidos numa enorme melhoria da qualidade de vida e convidando a olhar cada vez mais para o futuro na expectativa do que o amanhã trará.
Contudo, na ânsia de avançar nessa direcção, muitas vezes acabamos por esquecer a importância do passado e da nossa História, colocando em causa a preservação do património, parte da nossa memória a longo prazo.
Recentemente, têm sido diversas as notícias sobre a destruição do património arqueológico, seja devido a projectos de valorização de espaços – como foi o caso da Sé de Lisboa e dos vestígios islâmicos aí encontrados -, a trabalhos agrícolas ou de florestação – como os casos de destruição de uma anta em Évora, alegadamente na sequência da plantação de um amendoal intensivo, ou de uma antiga mina romana em Vila Nova de Ródão, devido a um projecto de florestação na zona.
Mais estendida no tempo, é a situação das novas instalações do Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática, cujo término das obras tem sido constantemente adiado e sobre as quais questionei a Ministra da Cultura, no final do ano passado. Inicialmente previsto para o final de 2018, encontrar-se-á finalmente em fase final de conclusão, segundo nos foi dito, sendo os adiamentos justificados por melhorias ao projecto inicial. Este Centro tem ao seu cuidado um espólio de valor incalculável – serão cerca de 14 mil peças, desde pirogas com mais de 2 mil anos, restos de galeões do século XVI e materiais de naufrágios do século XVII – em relação ao qual existe da parte dos especialistas uma preocupação agravada pela possibilidade de apodrecimento. Manifestada essa preocupação, não conseguimos contudo ficar esclarecidos acerca das condições exactas em que se encontra nas instalações do Mercado Abastecedor da Região de Lisboa.
Por outro lado, também o lado humano importa considerar. Os profissionais da área são os principais curadores desta nossa memória, porém isso não invalida que se achem em número insuficiente. O próprio Director-Geral do Património Cultural mencionou, muito recentemente, a dramática falta de trabalhadores na Direcção-Geral do Património Cultural, referindo estarem a decorrer 20 processos de contratação, quando nos próximos quatro anos, se prevê a perda de “300 recursos por aposentação”, entre funcionários da entidade e serviços dependentes, nomeadamente museus.
Talvez, neste momento de viragem da Humanidade, pouco importante pareça um investimento nesta área mas convém lembrar que são a memória e o património que nos trazem referência e nos permitem conhecer de onde vimos e quem somos, enquanto grupo social e cultural, além de nos oferecer uma compreensão mais profunda das razões que se encontram na construção que resulta no que somos hoje e no que levaremos para o amanhã.