Nunca como agora tivemos acesso a tantos vinhos brancos portugueses de qualidade. Aqueles que defendem peremptoriamente que “vinho é tinto e branco é refresco” ,respondo que alimentam um estigma que está, não em vias de extinção, mas feliz e praticamente extinto. Por um lado, se recorrermos à historia e considerarmos uma linha de tempo de consumo de vinho de mais de 2000 anos para o território que corresponde à nossa Lusitânia, sem contar com o período de ocupação muçulmana, o vinho tinto só começou a ser consumido há menos de 50 anos, e que os antepassados dos acérrimos defensores destas falaciosas verdades feitas bebiam os afamados palhetes, reservando os brancos somente para os dias de festa. Por outro lado, não podemos ignorar a nossa rica e diversa palete ampelográfica, que viabiliza que se façam vinhos brancos em quase todas as regiões do país. Se atendermos à nossa geografia, os vinhos brancos espelham muito mais as nossas cambiantes geográficas do que os tintos, são por isso mais identitários. Cada gole de vinho branco é um mergulho nos vales e encostas, nas planícies ondulantes, no céu feito de um azul imaculado que se perde no horizonte infinito Portugal enológico
Nunca houve brancos tão diferentes e originais como actualmente. Seja pela parcela de vinha ou pela casta esquecida, seja pela aplicação de um estilo menos óbvio, que vão dar origem uma miríade de declinações e nuances, sejam vinhos verdes com barrica, brancos do Algarve, com lotes de vários anos ou brancos de curtimenta como se de tinto se tratassem.
Se aliarmos a tudo isto, o fator gastronómico acabamos por enterrar um estereotipo alimentado ao longo destes anos. Nós somos atlânticos, e como tal, as nossas ameijoas, pescada, lulas, lagostas vão fazer uma festa à mesa com um bom arinto ou alvarinho fresquinho no copo. E o nosso bacalhau? Aos que juram que o fiel amigo só com tinto, respondo com um inflamado não. Salvo raríssimas excepções que se aplicam a receitas muito específicas, o bacalhau encontra sempre melhores maridagens com brancos do que com tintos.
Termino a puxar à brasa à sardinha setubalense, e aproveitar que ainda estamos em tempo delas. Para os mais cépticos, deixo ficar uma sugestão: Quinta do Piloto Collection Síria Branco 2018, eis um vinho arrebatador, fresco e vibrante, perfil fino e envolvente, com imensa capacidade gastronómica.
Experimentem e depois contem-nos.
Vanessa Schnitzer, aluna de PhD na EU
Gestora Comercial na Quinta do Zambujeiro