Fundos comunitários, não queimem cartuxos

Fundos comunitários, não queimem cartuxos

Fundos comunitários, não queimem cartuxos

26 Agosto 2020, Quarta-feira
Nuno Carvalho

O acesso transversal a fundos comunitários na AML (Área Metropolitana de Lisboa) não é um assunto novo. Contudo, com o embate económico provocado pela COVID-19 tornou-se óbvio que não existe nenhum território que possa dispensar a alavanca dos fundos comunitários para recuperar da crise económica que se instalou globalmente.

O Ministro do Planeamento anunciou que a AML terá “via verde” no acesso a fundo comunitários. Não se consegue perceber destas ou de outras palavras do Ministro Nelson de Sousa como se irá materializar o apoio. O peso no financiamento às empresas da AML, aos investimentos públicos ou ao setor social ainda não está quantificado
Estes esclarecimentos apenas poderão ser obtidos quando o Governo apresentar o plano nacional de recuperação e resiliência.

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Pode ser compreensível que o Ministro do Planeamento ainda não tenha esta informação para prestar. Mas consumir o espaço mediático para informar que a AML terá acesso a fundos comunitários de forma diferente do passado é redundante. A devastação económica e social que os efeitos da COVID-19 provocam exigiria sempre mudanças em mecanismos de investimento público, como os fundos comunitários. Saber que existirão mais fundos comunitários na AML é a parte óbvia de uma resposta à crise, falta saber como chegarão à economia.

O governo já deveria ter orientações quanto à forma de aplicação dos fundos. Uma delas refere-se às empresas que tinham investimentos em curso no momento em que Portugal foi atingido pelo surto epidemiológico. São milhares as empresas que investiram sem recorrer a fundos comunitários. Fizeram-no com capitais próprios ou com financiamento bancário e se esses investimentos não forem elegíveis muito provavelmente perder-se-ão. A informação empresarial que as empresas prestam às finanças permite saber quando esses investimentos se iniciaram, qual o capital amortizado e quantos postos de trabalho estão afetos à investigação e desenvolvimento. É fundamental usar essa informação para apoiar os projetos que mantiveram e criaram valor em Portugal com recursos próprios, fora do “radar” dos fundos comunitários, até ao surgimento da COVID-19

Uma “via verde” para de fundos comunitários que não alcance quem tem investimentos em curso pelas empresas significaria a extinção de uma grande fatia da capacidade produtiva da AML.

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Outra das linhas orientadoras que está ausente no discurso do governo é o desequilíbrio entre concelhos da AML. Existem três realidades distintas: uma que compreende Lisboa, Oeiras e Cascais. Outra composta por Sintra, Odivelas, Loures, Mafra, Amadora e Vila Franca de Xira. E entre os rios Tejo e Sado a península de Setúbal com os concelhos Barreiro, Moita, Montijo, Palmela, Seixal, Alcochete, Almada, Sesimbra e Setúbal.

O reconhecimento de realidades diferentes não implica excluir concelhos do acesso a fundos comunitários, mas antes saber incluí-los com as linhas de apoio mais adequadas. São exemplificativos os dados do INE de 2015 sobre o pib per capita indicando um valor de 12.519 euros para a península de Setúbal e 27.382 euros para a restante AML.

É fundamental criar emprego fora do concelho de Lisboa. E muito particularmente na península de Setúbal. O emprego num concelho gera economia local, reduz a utilização de transportes públicos para outros concelhos e potencia a qualidade de vida os cidadãos que trabalham e residem na mesma localidade. Sem a existência desta orientação a rede de transportes públicos continuará saturada e os desequilíbrios do pib per capita dentro da AML manter-se-ão.

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O Estado é o primeiro a dar um mau exemplo com a concentração de serviços públicos no concelho de Lisboa. É incompreensível, até os serviços da região de Lisboa e Vale do Tejo estão maioritariamente concentrados em Lisboa.

Está na altura de corrigir assimetrias, é fundamental não “queimar cartuxos”. Não deixar sem apoio quem investiu e apoiar quem quer investir em regiões como a península de Setúbal.

Por Nuno Carvalho

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