12 Maio 2024, Domingo

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Funerárias preocupadas aguardam há um mês por directiva da Direcção-Geral da Saúde

Funerárias preocupadas aguardam há um mês por directiva da Direcção-Geral da Saúde

Funerárias preocupadas aguardam há um mês por directiva da Direcção-Geral da Saúde

O presidente da ANEL diz que as famílias têm de compreender que a tradição de velório tem de ser alterada

 

Há um mês que a Associação Nacional de Empresas Lutosas (ANEL) aguarda instruções da Direcção-Geral da Saúde (DGS) sobre procedimentos a tomar pelos operadores funerários durante este período pandémico da Covid-19. O pedido foi enviado a 2 de Março, quando foi anunciado o primeiro infectado em Portugal, e só a 16 de Março a DGS produziu um documento sobre os cuidados post mortem, autópsia e casas mortuárias a ter com cadáveres de infectados com o novo coronavírus, mas deixou de parte os outros funerais.

Entretanto, a ANEL, que representa mais de 50% do sector, já estava um passo avançado sobre as medidas a tomar, quando, a 15 de Março, produziu um guia com nove recomendações de procedimento para os seus associados nesta fase de crise pandémica. Instruções que não se destinam apenas a funerais de pessoas infectadas, mas a todos os funerais.

“O nosso guia é mais abrangente, porque entendemos que, actualmente, todas as mortes são suspeitas; entre as patologias que a causaram pode estar, despercebida, uma infecção por Covid-19”, comenta Carlos Almeida, presidente da ANEL, a O SETUBALENSE.

Com a falta de resposta da DGS a sustentar, ou não, as razões esplanadas no guia da associação, este responsável admite que tem ouvido algumas críticas de alguns operadores funerários, mas mantem-se firme de que “é necessário sermos cautelosos”. Aliás, as críticas que tem ouvido aponta-as em muito pela pressão das famílias dos falecidos sobre as funerárias, e à falta de autoridade das mesmas para refrearem a cerimónia fúnebre. “Algumas famílias não querem abdicar da tradição do funeral. Compreendo que alterar tradições, nestes casos dolorosos, não é fácil, mas os operadores funerários têm de ser firmes”.

Carlos Almeida não tem qualquer dúvida sobre o procedimento que os operadores têm de ter, e dá o caso da sua própria empresa. “Nós cumprimos todos os procedimentos do guia da ANEL, incluído o da não realização do velório público e que o funeral seja realizado directamente do local do óbito para o cemitério pretendido, o qual deverá ser o mais próximo possível do local do óbito”, portanto, “se as famílias não estiverem de acordo, não há contrato”. E a isto acrescenta: “ninguém tem o direito de colocar em risco a saúde e, neste caso, a vida de outros”.

E estabelece, mais uma vez, as suas razões: “Estamos em Estado de Emergência com obrigatoriedade da população permanecer em casa e, depois, temos velórios com as pessoas todas juntas num mesmo espaço, isto não faz sentido, nem pode acontecer”.
Na sua opinião, a presença em todos funerais deve ser limitada a “um máximo de dez pessoas” e apela às autarquias que tenham espaços de velórios municipais que os “encerrem nesta fase”, e o mesmo apela para a eclésia para que “não permita velórios nas suas capelas”, assim como outras confissões religiosas.

Um sinal no sentido do que defende Carlos Almeida, veio já do imã da Mesquita Central de Lisboa, David Munir, que disse que os mortos da sua comunidade vão directamente para o cemitério dentro do caixão, onde é feita a oração fúnebre.

“A oração fúnebre é feita no cemitério. Antes, o corpo ia para a Mesquita, onde fazíamos a lavagem, vestíamos um pano próprio e depois fazíamos a oração fúnebre”, e “só após estes processos, o corpo era levado para o cemitério, onde “era enterrado sem o caixão”. Agora tudo mudou.

Quanto tempo para exumar um infectado Covid-19?

Entretanto o presidente da ANEL levanta outra questão, esta relacionada com os inumados em coval. É certo que a DGS recomendou que os mortos por infecção Covid-19 fossem cremados, mas é apenas uma recomendação, até porque crematórios há que não fazem este procedimento em determinadas circunstâncias. Caso do crematório do Cemitério de Vale Flores, em Almada, em que a Câmara Municipal, através de despacho, já veio dizer que não procede à cremação de corpos em que tenham sido implantados “pacemakers ou outro dispositivo alimentado por bateria”, e que não seja provado que estes dispositivos tenham sido retirados, isto sobre pena de “causar danos no equipamento”. Portanto, também os infectados com o SARS-coV-2, nesta condição, não serão cremados.

Entretanto, Carlos Almeida antecipa que os corpos infectados com este vírus e inumados em coval vão ter de ser geridos pelas autarquias com cuidados acrescidos. O normal, diz, é que os corpos sejam exumados passados cinco anos, mas os infectados, – que são “embrulhados num lençol absorvente” e num saco resistente até cerca de 150 quilos, degradável”, como recomenda da DGS – deixam dúvidas ao presidente da ANEL.
Considera este responsável que esses covais não vão ficar disponível em “menos de 10, 15 ou mesmo mais anos”, é que “ninguém ainda sabe as capacidades de sobrevivência deste vírus”. Por isso, as autarquias “poderão ter problema de gestão dos cemitérios”.
Mas entende que a disponibilidade dos crematórios “pode não ser suficiente” por isso concorda que a DGS “recomende a cremação, mas não obrigue”.

Setúbal: Corpos saem da morgue com “risco biológico nível 3” mas oficialmente não há mortos

No Hospital de S. Bernardo, em Setúbal, onde até á data não há, oficialmente, qualquer morto por Covid-19, alguns corpos são entregues às agências funerárias com indicação de “risco biológico 3”. “Temos feito levantamento de casos suspeitos, que são tratados como se tivessem, mas que até agora, pela informação não se terá confirmado a infecção” disse a O SETUBALENSE um empresário do sector.

“A certidão de óbito o que indica é risco biológico nível três, mas ter risco não quer dizer que tenha a doença”, explica a mesma fonte.

Os funerais estão a ser feitos com condicionamentos, não apenas devido ao protocolo exigido, mas também porque os crematórios e cemitérios fixaram limites ao número de pessoas que podem entrar. Por exemplo, em Setúbal o funeral só pode ter até dez pessoas, no Barreiro cinco, e na Quinta do Conde quatro.

Com o protocolo Covid-19 tem de haver autorização municipal para que possa ser feito o enterro. Quando o cemitério não tem condições para isso, o corpo terá de ser cremado. No Barreiro há um talhão próprio só para suspeitos de Covid-19.

Nos casos de infecção confirmada, o pessoal da funerária e dos cemitérios está equipado com fatos de protecção individual, o que confere uma carga emocional ainda mais carregada à cerimónia. O próprio luto sofre também impactos porque, não havendo velório e não vendo o corpo, as pessoas ficam privadas de algumas fases do processo.
Os embalsamamentos e tratamentos especiais de preparação dos corpos estão proibidos.

Em Setúbal, as funerárias têm sentido neste último mês um aumento do número de óbitos, que pode, no entanto, não estar relacionado com a Covid-19. “Não tenho ideia que a causa seja essa. Tivemos um Inverno ameno, a chuva e frio carregaram agora, e pode ser essa a causa.”, disse o mesmo empresário.

O responsável alerta que os funerais são socialmente sensíveis. “Não podemos perder o humanismo e com isto há um risco efectivo de desumanização das vítimas.”, avisa.

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