Adoram os telejornais estatísticas e percentagens. Através de um deles fiquei há dias a saber que em Portugal, com 6,6% de taxa de desemprego nos pouco mais de cinco milhões de gente activa, existem aproximadamente 230mil, “Nem-Nem`s”.
Não fosse coisa séria e teria a sigla a sua graça, pois significa gente jovem, entre os 25 e os 34 anos, que, precisamente: “Nem” estuda, “Nem” trabalha. E se o número nos descontrai no contexto geral, ao vê-lo agora, dentro e apenas da referida taxa etária, um milhão, ganha certamente outro peso. E é bastante!
Ora; sem esta sigla engraçada e certamente algum estudo socio-económico que o explica e justifica, mas com outros nomes, justos ou não, nada abonatórios, sempre os houve. Houve na altura de meu pai e a sua 4ª classe, mas só quem podia. Ouve na minha, com o ciclo preparatório obrigatório, mas ainda não gratuito, uns quantos. Eram outros tempos e o esforço para estudar era maior, e maior o fosso, entre aqueles que academicamente atingiam o topo e os outros, que pelo caminho se ficavam.
E se por um lado, no tempo e progresso, fomos eliminando uma serie de actividades laborais entre medias, como o comercio tradicional, que muitas vezes de geração em geração dava emprego a famílias ou parte delas. Desindustrializado o país e em via de extinção a actividade fabril, descontextualizando o termo “operário”, foi-se deixando apenas os extremos. O confortável, mas escasso, competitivo e limitado ao nosso tamanho, e o outro, exigente, árduo e mal pago, nada atractivo para quem não as “queimando” todas, queimou algumas pestanas até ao 11º. Gratuito e em breve, livre de exames.
Por outro e em consequência, desenvolvemos nas últimas décadas uma mentalidade reflexa desse fosso, obsessiva pela formação superior, como única e possível forma de se, “ser alguém”, neste Mundo. Obrigando um pai que aos três anos do filho, o quer apenas feliz, e aos treze que se forme; seja no que for: -Pois é para isso que eu trabalho! Para que seja alguém! Sinonimo de ser feliz aos três, formado aos vinte e três.
Abandonou-se assim quase por completo o sentido, “vocação”, vocacionando-se hoje os jovens para muita coisa, que à porta da universidade pode ser esta, ou outra, havendo média. Resultando muitas vezes em gente, talvez entre os 25 e 34 anos, que se prepara para viver no resto da vida activa, em oito horas diárias, uma actividade de que nem gosta afinal. A uns, vemo-los depois mais tarde a descobrir noutra área a sua realização. Outros, acumulam frustração e cometem sucessivos erros médicos; por exemplo.
E depois, desculpem-me alguns, mas resulta dessa mentalidade uma consciência que por vezes chega tarde, de que nem tudo se faz com os polegares ou no computador e trabalhar com o corpo, é no ginásio. Paguei ferias, fazendo artesanato na beira da praia. Fui a concertos com dinheiro ganho a vender tralha na feira da ladra. Dependia, quanto a pedir aos pais, do “-Pode ser?”, e eles podiam pouco. Semanada, era coisa nova e só para alguns e mesmo esses, faziam uns extras a cortar a relva, lavar o carro ou arrumar a garagem. Não duvido que hoje, haja quem veja nisso, algum incentivo à cultura capitalista ou mercantil. Ou pior, exploração de menores. Pois certo, é a semanada, como compensação económica gratuita, hábito, de exigência errada perante a vida.
Chamem-me até retrogrado, mas penso e entendo ser socialmente difícil, perceber a onde a dificuldade refinadora e selectiva, passa a inibidora e exclusivista. Também, determinar a onde, o comum acesso passa a facilitismo desmotivador e errante, o é certamente. Mas nada me impede de achar, que preparar jovens para uma sociedade competitiva e em constante mutação e exigência; que sim, cada vez mais reserva um lugar para todos, mas a onde nem todos os lugares são igualmente confortáveis, facilitando-lhe a vida, seja inteligente. Pendurando-os na família, jovens e saudáveis, mas acomodados e incapazes de tal como outros, entre os 25 e os 34 anos, se fazerem ao rio às seis da manhã à cata de marés e marisco. Dobrarem a coluna na apanha de fruta, ou fazerem orgulhosamente um turno, num call-center ou caixa de grande superfície, enquanto lutam por melhor oportunidade. Alguns mesmo, estudando à noite. Pois é a esses, os que em justiça seriam os, “Sim”, trabalham, e “Sim”, também estudam, que eu presto homenagem: -Bom futuro!