Alexandra Nascimento: “Queremos colocar as pessoas no centro da política local”

Alexandra Nascimento: “Queremos colocar as pessoas no centro da política local”

Alexandra Nascimento: “Queremos colocar as pessoas no centro da política local”

A candidata do LIVRE à Câmara do Montijo aposta num modelo de gestão municipal que inclua órgãos consultivos de cidadãos. Defende espaços públicos capazes de congregar a comunidade e a construção de mais escolas. E desvaloriza a implementação de polícia municipal ou videovigilância. “Montijo é uma cidade segura”, considera

O partido LIVRE vai apresentar-se pela primeira vez a votos em eleições autárquicas no Montijo. Alexandra Nascimento é a cabeça-de-lista à Câmara Municipal. Natural do Montijo, a jurista e mãe de quatro filhos identifica-se como uma mulher de esquerda, progressista, feminista e ecologista.
Em entrevista conjunta a O SETUBALENSE e à Rádio Popular FM, debruça-se sobre os eixos do programa eleitoral do partido para o concelho: “Participação cívica e transparência; valorização do espaço público; reforço da relação da cidade com o rio; e reorganização do governo e política municipal”.

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Como surgiu a hipótese de ser a cabeça-de-lista do LIVRE e quais as razões que a levaram a assumir este desafio?
Esta candidatura não surge com uma motivação individual, surge com base numa motivação colectiva de um núcleo de pessoas do LIVRE, que pretendem trazer ao concelho a implementação das ideias que o partido defende: um desenvolvimento progressista, suportado por valores de sustentabilidade, ecologistas e humanistas.

O LIVRE estreia-se a ir a votos no Montijo, em autárquicas. Juntamente com o seu nome foram anunciados os dos cabeças-de-lista à Assembleia Municipal e à Junta de Montijo/Afonsoeiro. E aos restantes órgãos autárquicos do concelho?
Estamos a fazer esse esforço, porque realmente há uma vontade muito grande de termos representatividade em todos os órgãos. Estamos a contar conseguir apresentar listas a todos os órgãos.

Quais são as prioridades do LIVRE e de Alexandra Nascimento para o concelho?
O LIVRE está a elaborar um programa político que está neste momento em [fase de] conclusão. Está a ser desenhado há muito tempo. Aproveito para dizer que está em fase de formalização a constituição do Grupo Intermunicipal do Núcleo de Montijo e Alcochete, do LIVRE…

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O equivalente a uma concelhia? Uma concelhia conjunta?
Exactamente. Vai ser um núcleo conjunto. Acho que faz sentido, cada vez mais, pensarmos em políticas que são articuladas a nível intermunicipal. Há problemas que não se resolvem só concelho a concelho.
Voltando ao nosso programa [para o Montijo], temos desenhados quatro eixos, que assentam na participação cívica e transparência, na valorização do espaço público – e dentro desta valorização do espaço público há áreas que se tocam, como a higiene urbana, a requalificação do espaço público e a própria segurança –, no reforço da relação da cidade com o rio e, finalmente, um eixo que ainda está por fechar, que é reorganizar o governo e a política municipal, para tornar os serviços mais eficazes. E neste eixo agrupamos outros subtemas, como a educação, a cultura, o desporto, as associações que fazem parte da identidade da terra.

O que entende que pode ser feito para melhorar a participação cívica e transparência no Montijo?
Este é um eixo que, no fundo, pretende reforçar a confiança das pessoas nas instituições e também trazê-las para a política local. Estamos a falar de um contexto de política local e faz todo o sentido que haja uma política de proximidade entre os autarcas e as pessoas. Ao olharmos para os resultados das eleições e para os níveis de abstenção, percebemos que as pessoas se sentem muito desmotivadas e sentem, de alguma forma, uma desacreditação muito grande nas instituições democráticas e na política, em geral, principalmente na pessoa dos políticos.
Temos algumas sugestões para colocar as pessoas no centro da política local, dizendo que o autarca não vai governar só para as pessoas, o autarca vai governar com as pessoas. Como se faz isto? Faz-se através de um modelo de gestão municipal, que promova mecanismos como órgãos consultivos de cidadãos, assembleias, que tenham efectivamente um peso de responsabilidade.
Estes processos de transparência também reaproximam a autarquia das pessoas e também devolvem às pessoas a confiança naquilo que está a ser feito pela administração. Se as pessoas souberem, tiverem acesso à informação, não há lugar a tanto ruído como por vezes existe. Portanto, envolvimento da comunidade nos projectos a desenvolver, plataformas digitais de participação pública, chamar o instrumento dos orçamentos participativos, que é muito importante.

O que propõe, em termos de intervenções, para o espaço público?
O espaço público, para nós, também tem uma importância determinante no desenvolvimento da cidade. O espaço público, por vários motivos, tem-se tornado num sítio de passagem, não há um espaço público que consiga congregar comunidade. Temos o exemplo do Parque Municipal. O que é que ele oferece às pessoas? Oferece aquilo que as pessoas levam para lá. Não temos um mobiliário urbano que convide as pessoas a ficar, não existe, por exemplo, um café… Mas, mais importante do que isso é aquilo que queremos trazer, é esta ideia de que o espaço público não deve ser só um espaço de passagem, pelo qual nós passamos, deve ser um elemento congregador de comunidade.

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Atrás, falou também na questão da higiene e limpeza.
Sim. E porquê? Porque um espaço público sujo não é convidativo. Esta questão da higiene urbana também tem sido uma preocupação ao longo dos tempos, porque realmente a cidade cresceu muito e estes serviços não acompanharam as necessidades da população…

Esse é um problema transversal a muitos concelhos.
Sem dúvida. Se calhar devíamos avaliar como se faz a recolha de lixo. O LIVRE propõe isso, que se deva repensar como se faz esta higiene urbana. Avaliar a implementação da recolha de lixo porta-a-porta e a reciclagem, melhorar esta eficácia de recolha, mas, claro, tem de passar também por se investir nos meios humanos e técnicos. Acho que é inevitável fazermos isto, nós ainda temos um sistema que é muito antigo, data para aí dos anos de 1990 e não tem sido muito actualizado.
O autarca muitas vezes quer deixar no concelho a sua obra. Então planeia muito os espaços públicos à imagem daquilo que ele acha que serve as pessoas. E, mais uma vez, não se pergunta às pessoas o que gostariam de ter nesse espaço.
“Placemaking” é um conceito que significa criar lugares, ou seja, transformar espaços públicos já criados em espaços vividos pelas pessoas. Isto significa trazer para esses lugares o que a comunidade quer ver ali. Dou sempre o exemplo das superilhas em Barcelona, e isto faz-se promovendo uma igualdade de acesso ao espaço público. Temos de pensar que não podemos ter maioritariamente o carro presente na cidade. É algo que tem de ser feito gradualmente, numa lógica também conjugada com a mobilidade suave, até numa perspectiva de estratégia intermunicipal, porque o Montijo já tem um problema grave de trânsito.

Defende o estacionamento privado?
Essa é outra questão que também temos de melhorar, parece que cada urbanização na cidade tem de ser feita obrigatoriamente com um espaço privado de estacionamento.
Depois a questão da segurança, também está ligada ao espaço público.

Montijo é uma cidade segura?
Sem dúvida. Há muita narrativa alarmista de que no Montijo o crime tem crescido imenso. Se olharmos para os dados, houve uma redução do crime nos anos da pandemia, mas a verdade é que voltou estatisticamente aos valores que existiam em 2018. Da análise que pude fazer, há um crescimento do crime de duas tipologias: temos o crime contra o património, essencialmente o crime contra veículos e os furtos, por assim dizer, e depois a segunda tipologia de crime que é o da violência doméstica, onde já se inclui o crime contra crianças. São duas abordagens que temos de tratar de forma completamente diferente.

O que defende para que seja possível melhorar a segurança no Montijo?
Abordei esta questão, por causa do espaço público. Acho que nada gera uma maior percepção de insegurança às pessoas do que um espaço público que parece abandonado, que não está requalificado, que está degradado, com falta de iluminação… nós abordamos a questão da segurança numa perspectiva de cuidado do espaço público. Um espaço público que tem comércio, que tem transporte público, não só nas horas de ponta, mas a circular durante a noite, que tem actividades lúdicas, culturais, em que a cidade se torna viva e em que há constantemente a presença de pessoas na rua, um espaço requalificado, limpo.

Não numa perspectiva de reforço de polícia ou até mesmo de criação de polícia municipal, como defendem outros candidatos?
O LIVRE não é muito fã do “autarca xerife”, que precisa de uma polícia ao seu serviço para policiar a cidade.

E videovigilância?
A videovigilância é um tema que não gera consenso na comunidade científica. Aquilo que os estudos nos vão dizendo é que [com videovigilância] há uma deslocação do crime para outras áreas que não são vigiadas e que o crime depois cresce exponencialmente. O que nos indica é que, por vezes, nessas zonas com videovigilância há uma diminuição, mas depois não temos os dados que nos comprovem que realmente esse crime não se desloca para outras zonas periféricas.

Portanto, não a mais PSP, não à polícia municipal e não à videovigilância.
Não digo não a mais PSP. Digo não a uma polícia municipal, até porque, num concelho onde temos muitas fragilidades e uma necessidade de reforçar serviços e de os tornar mais eficazes – como na área da educação –, adjudicar uma boa parte do orçamento para polícia municipal… Não sei que capacidade é que a autarquia teria para implementar uma medida destas. E, para mais, investir numa polícia municipal que tem competências muito restritas… Acho que a PSP e a GNR são perfeitamente capazes de voltar a um policiamento de proximidade, se houver necessidade dele.
Se existe falta de efectivos, há muitas soluções que podem ser encontradas, desde contratos locais de segurança que a autarquia pode negociar, ou exercer mesmo a articulação com o Ministério da Administração Interna. Primeiro, temos de perceber que temos uma esquadra, neste momento, que já não tem condições dignas para os efectivos que lá estão.

Então também defende a construção de uma nova esquadra?
Acho que é inevitável. Pelo menos, reestruturar.

Como pode o LIVRE marcar a diferença em termos da relação da cidade com o rio?
É um património que tem de ser aproveitado. Criar comunidade naquela zona virada para o rio é essencial. O que defendemos para ali é uma intervenção, que permita fruição, ciclovias, zonas pedonais, estruturas que não são onerosas para a autarquia e que permitem já uma intervenção, na parte que é pública.
Ouvi alguns dizerem que têm projectos para todos aqueles quilómetros [de frente ribeirinha], acho que realmente seriam necessários muitos anos, porque são requalificações que implicam um grande investimento financeiro e porque é uma área sensível. Quer queiramos quer não, é um ecossistema que podia ter zonas de fruição, tudo o que seja actividades leves, que não colidam com o ambiente. No fundo, defendemos uma renaturalização dessas áreas, onde não deve mesmo ser exercida uma pressão de edificação.

Quais são as principais carências que identifica na área da educação e o que pretende fazer para as suprimir?
Em primeiro lugar, será preciso rever a carta educativa, para termos um diagnóstico real de quais são as necessidades a nível de equipamentos. Sabemos que os que temos são insuficientes. As escolas estão sobrelotadas. Até porque, o que tivemos, a dada altura, foi o encerramento de algumas escolas do 1.º ciclo, que hoje se percebe que fariam falta estar abertas. Na altura foi uma opção política, porque se tinha muito a ideia de que, por um critério economicista, era bom concentrar em agrupamentos. Há áreas da sociedade e da política que são estruturantes e que não se podem reger por critérios economicistas. A educação é um deles. E temos o problema acrescido com a passagem das competências para os municípios, que herdaram um parque educacional muito degradado, com muitas necessidades de requalificação.
Destacaria também outras necessidades, como o reforço do pessoal técnico e operacional.

O que propõe em termos de investimento público para a habitação no Montijo?
Há um fraco investimento em habitação pública, não é só a nível do concelho, é um problema nacional, tem sido um problema também a nível europeu. O LIVRE, como é conhecido, tem a meta dos 10% de habitação pública.

E é isso que defende também para o Montijo?
Sim, costumo dizer que é uma utopia possível. No concelho, até acontece muito urbanismo. O que não existe é habitação acessível às pessoas neste momento. Habitação que as pessoas possam comprar. Já nem estou a dizer habitação pública, porque neste momento aquilo que existe é habitação privada, a maioria da classe média já deixou de ter acesso a essa habitação. É o problema da inflação do preço do solo, é o problema da especulação, da desregulação do mercado, e portanto as autarquias, a partir dos instrumentos que já têm, vão ter de começar a pensar como é que vão implementar uma estratégia. Mas, sim, claro que tem de existir maior investimento público. De quantas áreas de cedência é que a autarquia dispõe? Tem a oportunidade de as utilizar para construção de habitação pública.

Esta será uma estreia do LIVRE em autárquicas no concelho. Quais são as expectativas do partido?
A utopia possível seria ganhar, mas ficaria muito feliz, e acho que o partido também, se elegêssemos deputados municipais, deputados na Assembleia de Freguesia e um vereador.

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