Fomos, uns mais do que outros seguramente, surpreendidos esta semana com o resultado das eleições norte americanas.
Mesmo os que acreditavam na vitória de Donald Trump, terão sido surpreendidos pela dimensão da vitória e, sobretudo, pelo que foi a tendência dos resultados dos diversos segmentos da população. Já para não falar dos chamados “swing states” que “dançaram” praticamente todos para o mesmo lado.
Mais do que o Partido Republicano, Donald Trump conseguiu ganhar o chamado voto popular, ganhando muito do voto jovem, sobretudo masculino, não se verificando que o voto das mulheres tenha desertado daquelas paragens e, verdadeiramente decisivo, ganhou muito do voto dos latinos e afro-americanos.
Tendo Donald Trump um discurso tão incisivo quanto aos emigrantes, tantas vezes acusado de defender políticas xenófobas e extremistas como pode ter isto acontecido? Parece um contra-senso? Parece. Mas Bernie Sanders, insuspeito de fazer fretes a alas conservadoras, já se pronunciou dizendo: “Não devia ser uma grande surpresa um Partido Democrata que abandonou a classe trabalhadora, descobrir que a classe trabalhadora o abandonou. Primeiro foi a classe trabalhadora branca, e agora são os trabalhadores latinos e negros também”.
Disto se conclui que os democratas hoje, em traços largos obviamente, garantem essencialmente um voto urbano, de classes privilegiadas, de formação e rendimentos superiores.
Então mas não é suposto a esquerda atrair, maioritariamente, um outro tipo de eleitorado? Aqueles que se reveem mais em políticas de redistribuição de rendimentos, de criação de igualdade de oportunidades, de maior justiça e equidade fiscal, por exemplo?
Será assim. O problema é que os democratas norte-americanos foram de certa forma vítimas da percepção que se criou de que tinham sido capturados nos últimos anos por uma agenda política de direitos muito afunilada em minorias. A chamada agenda “woke”.
É isto verdade? Em parte, não, mas a política não trata só de realidades, também tem de tratar de percepções.
Fruto de um discurso muito polarizado, muitas vezes binário, aproveitador do imediatismo e limitação de caracteres imposto pelas redes sociais, muitas vezes parece que estamos encurralados entre um sim incondicional ou o não redondo. A direita, sobretudo a extrema direita populista, tem aproveitado isto. Um pequeno exemplo: quem gosta e defende touradas tende a achar que quem não as aprecia é porque quer erradicar ou enviar para um qualquer desterro quem as defende. O básico bom senso impõe um amplo campo de perspectivas entre estas duas posições…
Quando decidi o título deste texto quis indicar que os partidos da esquerda e muito especialmente o PS, que milito, devem procurar tirar ilações destas eleições americanas para que não se repitam resultados semelhantes que, como se costuma dizer, no final do dia, ninguém tenha dúvidas, só criam sociedades mais desiguais e injustas.