22 Julho 2024, Segunda-feira

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Um vago rumor que se agiganta

Um vago rumor que se agiganta

Um vago rumor que se agiganta

, Mestre em Sociologia
19 Julho 2024, Sexta-feira

Começou por ser um vago rumor que se foi agigantando e, é já um clamor radical que se ouve e sente por todo o Mundo, sobretudo na Europa. Estranha-se este retrocesso aos extremismos sobretudo a uma dada direita radical.
Foi entrando devagar, com uma sabedoria próxima da sabedoria da água, infiltrando-se por interstícios quase insuspeitos, deslizou suavemente como se trouxesse calçadas umas sandálias evangélicas, entrou nas zonas do Terceiro Mundo e nas que habitam dentro do Primeiro Mundo, aqueles (os das bolsas de pobreza do Terceiro Mundo) muitos deles confinados em grande parte das suas vidas ao Bairro, do Bairro para a Prisão e de novo de volta ao Bairro sem formação, sem emprego, sem futuro. A Direita Radical viu como viviam, do “fazerem-se à vida” de “subsidios”, pois claro, para oportunamente o divulgarem!
Muitos dos ditos “subsidiodependentes” são no fundo o resultado do aparecimento de uma franja de indivíduos que apenas têm uma atividade irregular em ofícios não qualificados e mal pagos em que a sua origem terá sido talvez o resultado de um crescimento económico capitalista que desestruturou o mercado de trabalho tradicional e levou ao desaparecimento de muitas profissões levando a que muitos não tivessem a necessária força anímica para reiniciar um novo percurso profissional. Essas mudanças conduziram também a uma precarização dos vínculos laborais afetando as gerações seguintes as quais, contudo, foram crescendo sob a promessa de uma integração social que seria viabilizada pelas estruturas educacionais, o que uma vez mais não se verificou! De facto temos hoje a geração mais qualificada de sempre e não consegue sequer assegurar o pagamento da renda de uma casa.
Portanto, expectativas goradas!
Os outros – os do primeiro mundo e os do mundo financeiro – ostentando riquezas que não têm correspondência em trabalho produtivo, mas apenas em manipulação financeira e em juros, foram provocando em todos os outros uma incompreensão absoluta, intolerável e inaceitável face a essa riqueza sem função palpável.
Curiosamente os (então) caminhantes das evangélicas sandálias não parecem insurgir-se contra este mundo financeiro (que, aliás, também teve subsidios) e que sofregamente vai sugando uma classe média transformando-a numa classe de indivíduos que assistem a uma quase impossibilidade de comandar os seus destinos. É que o jogo financeiro das subidas dos juros para travar a inflação e vice-versa, é um jogo que afeta todos mas, obviamente de forma desigual. Viviane Forrester chamar-lhe-ia “Uma Estranha Ditadura”.
E o ressentimento vai crescendo, alastrando e assumindo formas de se manifestar que vão da intolerância face aos imigrantes culpando-os por todos os males, indo até aos habitantes dos bairros das zonas de bolsas de pobreza , quase como num ritual de catarse!
Hoje eles, vítimas da intolerância e do medo da diferença, amanhã talvez nós, os de uma classe média cada vez mais empobrecida nos tornemos uma despesa supérflua para o Estado, queremos desesperadamente mostrar que somos úteis à sociedade que podemos trabalhar e acrescentar valor, queremos que nos “deixem jogar” e apesar dos discursos inclusivos é cada vez mais difícil à classe média, sobretudo a uma juventude que vê goradas as expectativas de uma vida melhor que a de seus pais, ter esperança.
E pronto, parte do caminho está feito, trata-se agora de “apanhar” os destroços humanos e reciclá-los revisitando teorias ideológicas sustentadas na propaganda eficaz, na impostura e na hipocrisia, persuadindo e mobilizando os descontentes, os ressentidos e quem sabe, talvez até já, alguns desesperados, de modo a obter a sua adesão. Estarão porVentura a tentar calçar as botas opressoras por cá e pelo resto da Europa?
O mundo financeiro (talvez sem essa intenção) está a contribuir largamente para o descontentamento e ressentimento de uma imensidão de gente que, por esse mesmo ressentimento, se está a tornar presa fácil de extremistas e demagogos.
Que esse descontentamento e ressentimento existe, lá isso existe! Não vale a pena assobiar para o lado, como diz o poeta-cantor “Vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar”.
É que “A existência de tudo está a prolongar-se, ao negar que existe”, in Chesterton – The Return of D. Quixote.

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