Estamos novamente no Verão, mas não foi preciso sequer chegarmos aos dias mais quentes para ouvirmos falar das dificuldades que algumas regiões do País, como o Algarve, preveem enfrentar este ano, para conseguir que a água continue a correr nas torneiras e não falte para as maiores necessidades das populações. Em paralelo, o último grande projeto para a cultura de abacate, que pretende instalar-se em Alcácer do Sal, deve em breve ser apresentado, após reformulação permitida pelas autoridades, de forma que se possa atenuar os seus impactos ambientais.
Poderá pensar-se que as duas questões não estão relacionadas, porque ocorrem em diferentes zonas do País, mas a problemática é a mesma: as alterações climáticas prometem que teremos anos tendencialmente menos chuvosos e mais quentes. Num País como o nosso, onde periodicamente já se verificavam secas severas, o expectável é que estas sejam mais permanentes.
Ora, se chove pouco, temos de nos consciencializar que é necessário tratar e preservar o máximo possível a água disponível, quer encontrando formas criativas e eficazes de armazenar a água da chuva, quer monitorizando e protegendo as águas subterrâneas de uma utilização excessiva, que ponha em risco as reservas que temos.
Não é preciso passar por situações de carência para sabermos os riscos que corremos. Em Espanha, a exploração desmedida dos recursos hídricos transformou milhares de hectares em terreno estéril e sem vida, que agora é preciso tentar reverter, com investimentos avultadíssimos, custos ambientais incalculáveis e talvez não recuperáveis.
Áreas de extraordinária riqueza natural, como o Parque Doñana, têm o seu futuro em risco, vendo os planos de água – em torno dos quais se acolhiam milhares de aves e outros seres vivos – secos e em agonia.
Duvido que seja isto o que queremos para os nossos territórios, principalmente para o Alentejo Litoral, visado, quer pela pressão urbanística e turística, quer pela promoção de explorações agroalimentares de grande exigência no que toca à mobilização de vastas áreas de terreno e ao consumo de água, com culturas tropicais e subtropicais, que dificilmente se coadunam com os recursos existentes.
Por muito que se promova e acarinhe o investimento externo, tal não pode ser a qualquer preço.
Escasseando a água no subsolo, como ficam as culturas e os produtos tradicionais que criam riqueza e respeitam o terreno, porque estão a este ligados desde sempre ou há muitos séculos? Como resistirão os sobreiros que nos fornecem a cortiça, um dos mais emblemáticos bens que produzimos; ou os pinheiros, responsáveis pelo “ouro branco” de Alcácer do Sal, o inigualável pinhão daquele concelho?
Ao contrário do arroz, por exemplo, que utiliza água de superfície, vinda das barragens, estas são espécies que se alimentam em exclusivo da água subterrânea e, os primeiros sinais de perigo são conhecidos e já estão registados.
Como ficará a fauna e a flora da costa alentejana e do estuário do Rio Sado?
E, finalmente, que água restará para bebermos? Haverá quantidade e qualidade suficientes para que consigamos assegurar a nossa vida e a das próximas gerações?
Estamos a tempo de salvar a vida natural e a paisagem. Estamos a tempo de ser mais exigentes com os investimentos que acolhemos no nosso território e de exigir isso mesmo aos poderes políticos, nacionais e locais.