Demora na passagem de receituários e na observação de resultados de exames levam doentes ao desespero. Presidente da junta ao lado da população
Para alguns pode não parecer muito, mas para quem precisa já dura há uma eternidade. Os cerca de seis a sete mil utentes do Centro de Saúde de Pinhal Novo, na Avenida Zeca Afonso, estão há meio ano privados de consultas por falta de médico de família. A passagem de receituário chega a demorar meses e a falta de meios materiais é arrepiante, diz quem sofre na pele com a falta de resposta dos cuidados de saúde primários.
“Vai para mais de seis meses que não temos consultas do dia. Como não há consultas, não temos médicos que vejam os exames dos doentes. Há utentes que têm exames para serem vistos há um ano. Não temos tido quem nos passe o receituário. Deixamos lá o pedido e leva um, dois, três e até quatro meses para o receituário ser passado”, lamenta Francisco Arzileiro, um dos responsáveis pela Comissão de Utentes de Saúde de Pinhal Novo.
“Há um médico a passar receituário, porque a situação estava atrasada. Foram detectadas 300 receitas por passar. E temos um médico apenas para passar as baixas clínicas. Não temos ninguém a dar consultas”, junta o pinhalnovense, ao mesmo tempo que recorda outro serviço que deixou de ser feito no centro de saúde. “Ainda tínhamos uma médica tarefeira que aparecia por aqui e que acompanhava as grávidas. Agora nem isso temos.”
A descrença entre utentes acentuou-se nos últimos dias, após uma reunião realizada com o presidente do Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde da Arrábida, Luís Pombo, admite Francisco Arzileiro.
“Reunimos no passado dia 12 com o responsável pela Unidade Local de Saúde da Arrábida, Luís Pombo. Fomos com muita esperança, viemos de lá com uma mão cheia de nada”, resume o membro da comissão de utentes. Até porque, justifica, o presidente do conselho de administração “manifestou desconhecimento” sobre o estado a que chegou o Centro de Saúde de Pinhal Novo.
“Disse desconhecer que os médicos nem sequer têm ali uma balança para pesar os doentes, que não têm um medidor de tensão, que não têm um medidor de oxigénio no sangue, que não têm nada de nada para trabalharem no centro de saúde. Fui a uma consulta em Dezembro passado à minha médica de família, que se foi embora, e ela é que tinha de levar tudo isso de casa, mais um aquecedor”, aponta.
GNR chamada ao local
Segundo Francisco Arzileiro, Luís Pombo nem estava ao corrente de que “a GNR costuma ser chamada ao centro de saúde por barulho feito pelos utentes, por reclamações”. “Eu próprio cheguei a chamar a GNR, numa altura em que não havia Livro de Reclamações no centro de saúde, situação que também disse desconhecer”, adianta.
A comissão de utentes já se reuniu também com a vereadora da Câmara Municipal de Palmela, Maria João Camolas, e tem sido acompanhada desde a primeira hora pelo presidente da Junta de Freguesia de Pinhal Novo, Carlos Jorge de Almeida.
“A junta apoiou a constituição da comissão de utentes, disponibilizou uma sala para os utentes se reunirem, até porque a luta pelo direito à saúde merece relevo especial. Apoiámos desde o primeiro instante, quando ainda no ano passado começou a existir acumulação de utentes, de madrugada, à porta do centro de saúde”, lembra Carlos Jorge de Almeida.
Segundo o presidente da junta pinhalnovense, apesar das “démarches” realizadas, entretanto, quer pela comissão de utentes quer por autarcas, facto é que a situação não conheceu melhoras. E Carlos Jorge de Almeida deixa uma promessa: “Os autarcas estarão ao lado dos fregueses.”
Os utentes preparam agora formas de luta para reivindicar direitos junto da tutela (ver caixa em baixo).
O SETUBALENSE tentou, sem sucesso, chegar ao contacto telefónico com o presidente do Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde da Arrábida e questionou o responsável, através de e-mail enviado para o Gabinete de Comunicação, que ao final da tarde informou da disponibilidade de serem fornecidos esclarecimentos, os quais não chegaram em tempo útil à redacção do jornal. O SETUBALENSE tentou ainda registar o comentário de Álvaro Balseiro Amaro, presidente da Câmara Municipal de Palmela, mas até ao fecho desta edição não obteve resposta.
Em curso Abaixo-assinado para levar caso à Assembleia da República
Para ontem às 18 horas, a comissão de utentes tinha marcada uma reunião nas instalações da Junta de Freguesia de Pinhal Novo, para decidir os próximos passos a serem dados, tendo em vista a resolução do problema de falta de médico de família e de recursos materiais no centro de saúde. “O que espero que resulte desta reunião? Aquilo que a população pinhalnovense quiser”, disse Francisco Arzileiro a O SETUBALENSE, horas antes do início da sessão. Certo é que a estrutura representativa dos utentes tem já a decorrer uma acção, com um propósito bem definido. “Temos neste momento cerca de 4 500 signatários num abaixo-assinado, para levarmos a questão à Assembleia da República. A situação é degradante. Os pinhalnovenses merecem ser tratados como gente e não da forma como estão a ser tratados pelo Serviço Nacional de Saúde ou por quem o dirige”, finalizou o membro da comissão de utentes.