Naufrágios, epidemias e a relevante indústria conserveira têm marcado Sesimbra. Uma vila das mais procuradas no País como destino turístico
O município de Sesimbra já existia desde século XII/XIII, com foral atribuído por D. Sancho I em 1201, porém, só com a Constituição de 1976 ganhou autonomia para gerir os seus serviços, orçamento, pessoal e regulamentos locais através dos seus órgãos eleitos: Câmara Municipal e Assembleia Municipal.
Ao longo dos tempos, o concelho tem sido palco de momentos históricos marcantes, que moldaram a sua identidade e a vida das suas gentes. Entre conquistas sociais, desastres naturais e revoluções económicas, vários acontecimentos marcaram, em definitivo, o território e a memória colectiva do concelho.
Além da tragédia do ciclone de 1941, outras datas relevantes têm registo no concelho de Sesimbra entre 1855 e os dias de hoje.
Em 1856/57 Sesimbra foi profundamente afectada por duas grandes epidemias no contexto da pior pandemia de Cólera que atingiu Portugal e de um surto de Febre Amarela que grassou em Lisboa, com repercussões no concelho.
A epidemia de Cólera, parte da terceira pandemia global (1833 – 1860), teve a segunda vaga a chegar a Portugal em 1855 e atingiu Sesimbra no Verão de 1856. Boa parte da população rural e costeira sofreu imenso. Foi elevado o número de casos e mortes, embora os registos locais sejam escassos, o impacto foi sentido.
Na epidemia de Febre Amarela, embora o surto mais grave tenha ocorrido em Lisboa, no Verão e Inverno de 1856 – 57, as medidas de controlo como lazaretos, quarentenas em portos, desinfecção, também foram aplicadas ao território distrital e marítimo, envolvendo concelhos costeiros como Sesimbra. O internamento de viajantes e tripulações nos serviços de saúde pública do Reino e a ênfase no combate ao vector (ainda ignorado na época) exerceram impacto directo em Sesimbra, principal tomada marítima e pesqueira da região.
Naufrágios nas águas sesimbrenses também são destaque na informação fornecida pelo Chatgpt desde 1855. Em 1894, o caíque “Santa Catharina” naufragou na Praia da Baleeira devido a tempestade, felizmente toda a tripulação foi salva.
A 16 de Dezembro de 1916, foi resgatada a fragata espanhola Numancia com os pescadores de Sesimbra a salvaram a tripulação após o navio encalhar devido a tempestade. O episódio reforçou a reputação da bravura dos sesimbrenses no mar.~
A 26 de Fevereiro de 1989 o naufrágio do River Gurara tornou-se um marco para o mergulho local e deu origem a um ecológico destroço subaquático.
A década de 1950 a 1960 no concelho foi um marco de modernização da pesca ao serem realizados Fortes investimentos na frota pesqueira e construção naval, com destaque para a pesca do peixe-espada preto e atum, com isto a economia de Sesimbra passa a girar em torno do mar: fábricas de conserva, armações, cooperativas e aumento populacional ligado à actividade piscatória.
Em 1976, o Castelo dos Mouros de Sesimbra é classificado como Monumento Nacional. Com origem islâmica passa a ser oficialmente protegido como património nacional, potenciando o turismo histórico.
Os anos 1980 marcam Sesimbra com a crise da pesca e reconversão económica. Devido à sobrepesca, escassez de recursos e novas políticas europeias, dá-se o declínio da indústria piscatória. Nesta mesma década, o concelho inicia transição para economia de turismo e serviços, com aposta em hotelaria, gastronomia e desportos náuticos.
Em 1998 é inaugurado o novo Porto de Abrigo de Sesimbra. Uma infra-estrutura moderna e segura para a pesca e recreio náutico, substituindo o antigo porto danificado por décadas. Vem potenciar a actividade náutica e a transformação da marginal sesimbrense.
A 14 de Outubro de 1998 é criada a Área Marinha Protegida Luiz Saldanha, em que parte do Parque Natural da Arrábida, protege mais de 50 espécies de peixes e promove o turismo sustentável e a ciência marinha. A costa de Sesimbra torna-se uma referência de conservação ambiental marinha em Portugal.
Em 2008, Sesimbra tornou-se oficialmente reconhecida como capital nacional da pesca do peixe espada preto. Desde esse ano, o porto local lidera a pesca e comercialização desta espécie em Portugal continental, com mais de 95 % das capturas nacionais (Semmais.pt e Seesimbra.pt)
Este reconhecimento resultou do esforço contínuo da frota sesimbrense, que captura a grande maioria do peixe-espada-preto em águas nacionais. O mercado local celebra esta riqueza com eventos gastronómicos dedicados, assumindo o peixe-espada-preto como símbolo emblemático da sua identidade marítima.
Em 2020 registam-se os primeiros casos da pandemia covid-19 em Portugal, situação que se estendeu até 2022 e a vila de Sesimbra sentiu fortes impactos económicos e sociais, especialmente no turismo e na restauração. A Câmara Municipal aposta em medidas de apoio local, incluindo projectos culturais online, entrega de refeições e incentivo ao turismo interno.
Sesimbra é um concelho marcado por uma forte ligação ao mar, desde a bravura dos pescadores ao ciclone devastador de 1941, até à reconversão para o turismo sustentável e científico no século XXI. A sua história local reflecte resiliência, identidade marítima e adaptação constante aos desafios.
O poder da indústria conserveira da economia de Sesimbra
O lançamento e expansão da indústria conserveira no final do século XIX e início do século XX são o evento mais significativo em termos económicos no concelho de Sesimbra desde 1855. Esse momento transformou radicalmente o tecido económico, passando de um modelo artesanal para uma economia industrializada e exportadora, cimentando a importância do mar e da pesca na identidade e prosperidade da vila.
Com a introdução das “armações à Valenciana” na pesca de sardinha, carapau e cavala, Sesimbra apostou na captura em larga escala, o que atraiu a instalação de diversas fábricas de conserva de peixe, geradoras de emprego e ligadas às redes de exportação.
Assim, a vila transformou-se num centro económico dinâmico, impulsionado pela indústria transformadora do pescado e pelo comércio marítimo associado.
Este marco teve impactos estruturais na criação de empregos nas conservas e pesca industrial, dinamização de uma economia orientada para o mar, que reforçou a sua posição no panorama nacional e integração em mercados externos com exportação de conservas, ampliando as fronteiras comerciais de Sesimbra.
Embora menor que o impacto das conservas, é de destacar a evolução em meados do século XX com o cerco americano e construção do Porto de Abrigo, electrficando a pesca. Em 1954, o arranque do Big Game Fishing (pesca desportiva de espadarte) e a implantação do Hotel Espadarte, que introduziram o turismo como nova alavanca económica, contribuindo para diversificar a economia local.
Tradições e património no desenvolvimento cultural
Na área da cultura, o acontecimento mais relevante desde 1855 foi a preservação e valorização do património histórico e etnográfico local, com destaque para a Festa de Nossa Senhora do Cabo Espichel e o desenvolvimento do turismo cultural associado ao Santuário do Cabo Espichel e também a tradição, consolidando-se como um pilar da identidade cultural do concelho.
O Santuário de Nossa Senhora do Cabo Espichel, um marco histórico e religioso, tem sido um centro de devoção e manifestações culturais desde o século XVIII, mas a sua valorização cultural e turística ganhou força especialmente a partir do século XIX e consolidou-se ao longo do século XX, com iniciativas para preservar o conjunto arquitectónico e promover as festas tradicionais.
A Festa de Nossa Senhora do Cabo, celebrada anualmente, é uma das maiores manifestações culturais e religiosas da região, atraindo visitantes locais e estrangeiros, mantendo vivas tradições populares e religiosas.
Ao longo do século XX, Sesimbra apostou em museus e espaços culturais que valorizam a sua história marítima, artesanal e etnográfica, como o Museu do Mar e outras iniciativas de salvaguarda da cultura local.
A conservação de um património arquitectónico e imaterial único, com raízes profundas na história local veio permitir o fortalecimento da identidade cultural sesimbrense ligada ao mar, à pesca e à religiosidade popular, assim como o desenvolvimento do turismo cultural, complementando o turismo balnear e de natureza.