Alexandre Pinheiro já sabia de tudo. A participação no golpe contra a Ditadura é das boas recordações, que ajudam viver com as más, da Guerra Colonial
Os burburinhos da Revolução não foram uma surpresa para todos. Enquanto uns teciam em segredo os fios da mudança, outros simplesmente concordavam em saudar, o que traria a tão ansiada liberdade a Portugal. Alexandre Pinheiro, 73 anos, conheceu o plano engenhoso deste dia histórico antes mesmo da sua concretização, afirmando ter sido o seu camarada, Pina Monteiro, quem o abordou em voz baixa: “Estamos a preparar um movimento, quero saber se tu alinhas?”, relembrou euforicamente.
O então militar que viria a contribuir para a libertação da Ditadura, já tinha comandado um grupo de 25 homens na Guerra Colonial, em Angola, durante dois anos. Salientando as dificuldades que ultrapassou, recorda inquieto o momento traumático em que pela primeira vez, disparou mortalmente sobre um jovem guerrilheiro.
Controlando as suas emoções, cita ainda ter memória do rosto e das palavras daquele rapaz, o que o motivou a escrever o livro “A Arma”, eternizando as suas memórias em homenagem e a todos aqueles que sofreram com a guerra”, acrescenta. De regresso a Portugal, o ex-combatente não era o mesmo de antigamente. “O rapazinho que eu era, bem-disposto, jovem estudante e que cantava com os amigos, foi se transformando num menino quase sem emoções, frio”, confessa. Aponta ter sido o percurso como
professor de Educação Física que o ajudou a dissipar muitas dessas imagens que recordava da guerra.
O seixalense revive a participação no 25 de Abril e nos dias posteriores, preenchendo o amplo gabinete com inúmeras lembranças. A sua primeira missão foi dirigir-se ao Ministério do Exército para prender Alberto de Andrade e Silva, o que acabou sendo rotulado como fracassado, pois o ministro escapou. Foi ainda neste dia, ao dirigir-se ao Ministério das Finanças para tomar rédeas, que se sentiu bastante respeitado, entre os funcionários públicos. “Aí eu convenci-me, tínhamos isto nas mãos.”, descreveu entusiasmado.
Cinco dias após o golpe de Estado, Pinheiro integrou a guarda militar incumbida de receber e proteger Álvaro Cunhal, dirigente do PCP papel. “A imagem deste rapaz perturbou-me imenso, daí a necessidade que eu tinha de fazer-lhe uma na época. Recorda vividamente o Alexandre Pinheiro momento em que conduziu Cunhal para uma “salinha” reservada após o seu desembarque, descrevendo depois o trajeto até uma chaimite, onde Cunhal proferiu o seu primeiro discurso.
Entre o encontro com Mário Soares e Salgueiro Maia, reforça a devoção do povo aos militares no dia primeiro de Maio. Por detrás de inúmeras vivências, Alexandre ainda se deixa tomar pelas memórias da Guerra Colonial. “Hoje ouvi um helicóptero perto de casa e automaticamente entrei em transe”, disse, recordando que nem tudo se foi com o tempo.
*Estudante de Jornalismo da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal (ESE-IPS)
Rui Morais*
Patrícia Teixeira*