Adília Candeias recorda os tempos antes do 25 de Abril, quando, ainda criança, lia texto proibido para a família
Adília Candeias cresceu num ambiente marcado por revoluções e linguagem revolucionária desde muito nova. Sendo a primeira pessoa da sua família a ser alfabetizada, ainda no segundo ano de escolaridade, começou a ser persuadida pelo pai a ler folhetos anti-regime que divulgavam, de forma clandestina, possíveis revoluções.
“Quando ele percebeu que eu sabia ler, pôs-me a ler documentos, na altura, da luta pelas oito horas de trabalho”, recorda Adília Candeias. Embora não compreendesse tudo o que lia, lembra-se particularmente da palavra “tariado”, que a irritava tanto que às vezes a pulava, rindo-se agora ao recordar. No entanto, compreendia a seriedade da situação quando os seus tios apareciam para ouvi-la decifrar os folhetos.
Adília, hoje presidente da Sociedade Recreativa e Cultural do Povo do Bairro Alentejano e antiga vereadora da Câmara Municipal de Palmela, admite que frequentemente pulava palavras ou parágrafos inteiros que achava difíceis de ler. No entanto, não conseguia enganar os seus tios e o pai, que, mesmo analfabeto, não era tolo. Eles sempre questionavam se ela tinha certeza do que estava a ler.
Lembra-se também de como seus tios ouviam “rádios proibidas” em casa, utilizando um truque para evitar que o som escapasse pelas paredes: colocavam um copo de água em cima da rádio, acreditando que isso impedia que o som se ouvisse do lado de fora. Adília não sabe se isso funcionava, mas seus tios acreditavam nisso.
Ao recordar o 25 de Abril de 1974, Adília sorri. Ela estava na fábrica de têxteis onde trabalhava e não tinha notado nada de diferente no caminho para o trabalho. Quando foi mandada para casa, continuava sem entender bem o que estava a acontecer. Em conversa com o pai, ele disse-lhe: “Olha filha, eu não sei o que é que isto vai dar, mas, pior do que já está, não vai ficar de certeza”. Nesse momento, Adília teve a certeza de que o 25 de Abril poderia ser algo muito bom.
Na época, com 19 anos, Adília e o seu marido foram para as ruas de Lisboa. Ela viu muita gente nas ruas, mas não conseguiu ver os militares, o que foi uma desilusão, pois era exactamente isso que queria presenciar.
A partir desse momento, Adília começou a envolver-se activamente em várias causas, passando a participar activamente na política, até chegar a ser vereadora na Câmara Municipal de Palmela. Descreve a Revolução como uma “transformação” e “uma coisa extraordinária”, que mudou completamente o rumo de sua vida. “Quando era mais nova, queria trabalhar no campo, porque era só isso que eu conhecia. Hoje, os jovens podem ser aquilo que quiserem.”
*Estudante de Jornalismo da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal
Daniel Ferreira*
Iara Silva*