27 Junho 2024, Quinta-feira

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Padre Tiago Veloso: “O maior desafio foi sentir-me sozinho diante de uma igreja vazia”

Padre Tiago Veloso: “O maior desafio foi sentir-me sozinho diante de uma igreja vazia”

Padre Tiago Veloso: “O maior desafio foi sentir-me sozinho diante de uma igreja vazia”

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O padre confessa-se rendido às novas tecnologias e revela que Palhais/Santo António foi a primeira paróquia católica do Mundo a fazer online o curso Alpha

Tiago Veloso, 34 anos, Pároco de Palhais/Santo António, concelho do Barreiro, fala sobre a pandemia e a adaptação ao digital. O flagelo pandémico acabou por acelerar a concretização da aposta nas novas tecnologias. “[Foi] um momento único para colocarmos em prática tudo o que já estávamos a defender”, admite.

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Quais foram as maiores dificuldades no exercício das suas funções durante a pandemia?

Não vejo como dificuldades, vejo como desafios diários a ultrapassar. O maior desafio foi sentir-me sozinho diante de uma igreja vazia. Estava habituado a ter a igreja cheia e de um fim-de-semana para o outro ficou tudo vazio. Essa foi a maior dificuldade que tive a nível pessoal. Mas graças à equipa fantástica que está à minha volta e também com o apoio de outras paróquias, senti-me apoiado e surgiram muitas ideias. E, de repente, começámos a chegar a muito mais gente e a ver frutos a surgir em vários locais, o que foi fantástico.

Como surgiu a ideia de apostar no digital?

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Antes da pandemia, já estávamos a apostar no digital porque é lá que estão as pessoas. Eu, por exemplo, antes de entrar num restaurante a primeira coisa que faço é ir ao telemóvel ver a classificação desse sítio, antes de ir a um museu ou ver um filme vou à Internet ver o que dizem sobre. Acredito que se passe a mesma coisa com a Igreja, antes de ir ou entrar vou ver qual é a sua imagem no digital.

Em Fevereiro do ano passado, contratámos uma empresa de comunicação digital para nos ajudar a criar material para o online. E, logo a seguir, vem a pandemia como momento único para colocarmos em prática tudo o que estávamos já a defender a nível interno.

Qual dos programas existentes no vosso website acredita ter sido o mais importante no último ano?

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No nosso site temos uma perspectiva um pouco mais [direccionada] para o exterior. Nós vivíamos antes da pandemia o curso Alpha, o qual continuamos actualmente a viver, e foi algo incrível, porque fechou tudo, no caso da igreja, numa sexta-feira, e nesse mesmo dia já estávamos a trabalhar, pois estávamos preparados para isso. O curso Alpha está a ser uma ferramenta extraordinária, sendo que no último ano foram já mais de 600 pessoas que vivenciaram o curso connosco, graças ao online.

Este curso é a nossa maior aposta como ferramenta para chegar a quem não está na igreja, a quem não é crente, mas dá para toda a gente. Antes da pandemia era presencial, as pessoas tinham de vir aqui, logo só pessoas próximas é que podiam vir…

 

… E como funcionava ou funciona o curso?

Tem três momentos diferentes. Tem um momento à mesa em refeição. As pessoas estavam à mesa, conheciam-se, passavam tempo juntas. Depois desse momento, em que à mesma mesa podiam estar cristãos, ateus, agnósticos, passávamos para uma sessão de vídeo onde é transmitida uma mensagem com base cristã. A seguir voltavam a encontrar-se os pequenos grupos para falarem sem pressões, cada pessoa com a sua liberdade podia dizer o que tinha sentido ou achava sobre determinado assunto.

Com o confinamento…

Com a chegada da pandemia, estávamos a meio do curso Alpha e tínhamos três hipóteses: cancelávamos, adiávamos ou tentávamos online. Então tentámos, fomos a primeira paróquia católica do Mundo a fazer o curso Alpha online, pelo que as pessoas não tiveram interrupção no curso, passaram somente do presencial para o online. E o resultado foi tão bom que hoje já fizemos quatro ou cinco Alphas com muitas pessoas de vários pontos e tem sido uma experiência muito bonita.

No curso Alpha como ninguém é obrigado a ir, quem vai acaba por aperceber-se, sem pressões, que há um Deus, que está com a pessoa, que a ama. Acho que estas pessoas que se encontram ou são encontradas durante o Alpha são as que têm histórias mais bonitas para contar, porque não parte de algo que receberam na infância ou que foram obrigadas a acreditar, mas de algo que viveram, que experimentarem, e isso tem valor.

Qual é a ideia por trás do vosso segmento “Hoje é Quarta”?

A história do “Hoje é Quarta” surgiu a meio da pandemia, da minha cabeça, e foi uma forma de fazer uma ligação a meio da semana com as pessoas. Ou seja, tínhamos a missa ao domingo e depois até ao domingo seguinte havia zero, ou havia missa diária.

O “Hoje é Quarta” é uma forma de comunicar algo sobre vários temas que são apresentados sempre numa linguagem mais corrente, o que é muito importante para as pessoas perceberem. Até porque, quem está neste mundo da religião corre o risco de ter uma linguagem muito formatada, muito própria que mais ninguém percebe. E quando me preparo para falar para as pessoas, penso sempre o que é que elas vão estar a entender, a interpretar e tento trabalhar sempre um pouco essa área, porque a mensagem é tão importante que não pode ficar perdida.

Agora no tempo de preparação para a Páscoa, mudou de nome temporariamente para “Hoje é Quaresma”, onde damos o poder aos jovens para apresentarem o programa liderando uma entrevista. Já tivemos como convidados um risoterapeuta, para fazer rir e mostrar que é possível haver transformação na vida pelo riso e a jornalista Aura Miguel, da Rádio Renascença, que é uma perita em Papas.

Quais têm sido os apoios da paróquia nestes últimos tempos?

Não falo de dinheiro nas missas, não peço dinheiro descaradamente como alguns fazem. Mas uma coisa que é certa é que Jesus Cristo falava muito de dinheiro. Nós na igreja temos medo de falar de dinheiro, se calhar porque as pessoas quando ouvem falar de dinheiro pensam logo em algumas igrejas e seitas que andam por aí e então os padres bloqueiam um pouco nisso.

Mas, curiosamente, antes da pandemia, em Novembro de 2019 durante uma homilia falei abertamente de dinheiro e que havia várias formas de contribuir, porque quando nós contribuímos para a Igreja estamos a dar do que é nosso, mas aquilo que estamos a dar que é nosso na verdade não é nosso porque já tinha sido dado por Deus.

Depois em Março as igrejas fecham, mas as pessoas já estavam a ser generosas. Quando as pessoas percebem que o dinheiro não é usado para construir edifícios, mas para construí-las, ajudá-las a crescer, tornam-se automaticamente generosas. Quando as igrejas fecham, aqui em Palhais/Santo António, as pessoas continuaram a ajudar e passaram do dinheiro físico para o dinheiro digital. Já tínhamos tudo preparado num sistema de doações digitais e quem não estava nisso começou a estar, e nós na verdade sentimos essa grande generosidade das pessoas aqui à volta.

Sei que há muitas paróquias que estão a passar mal, com dificuldades, mas nós uma vez que começamos a sentir tanta generosidade começamos também a apoiar igrejas que mais precisam. No ano passado mandámos mais de €3.000 para Moçambique e mais de €3.500 para famílias apoiadas pela Cáritas em Angola, e apoiamos também várias iniciativas a nível local.

É uma questão de…

… De confiança, se confio mesmo em Deus posso dar e sei que não vai falhar depois, e a prova disso é que nós não tivemos falta porque houve sempre. Por isso, nós só temos a agradecer e continuaremos a apoiar as pessoas que precisem e a chegar a outras igrejas, outras paróquias que também estão a precisar.

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