Maria das Dores Meira: “Setúbal está embaciada e nós queremos que volte a brilhar”

Maria das Dores Meira: “Setúbal está embaciada e nós queremos que volte a brilhar”

Maria das Dores Meira: “Setúbal está embaciada e nós queremos que volte a brilhar”

A ex-presidente garante que a candidatura independente que vai encabeçar à Câmara de Setúbal em 2025 engloba listas para todos os órgãos autárquicos do concelho. Diz-se perseguida por elementos do PCP, partido que hoje, sublinha, já não é o que era. E arrasa a gestão da CDU liderada por André Martins

Pela CDU, presidiu à Câmara Municipal de Setúbal entre 2006 e 2017 e, neste exercício autárquico, foi vereadora em Almada. No dia 26 de Abril passado, renunciou ao mandato, desvinculou-se do PCP e, mais recentemente, anunciou que irá voltar a candidatar-se, agora como independente, à presidência do município setubalense nas autárquicas do próximo ano. Maria das Dores Meira explica a ruptura com o PCP, aponta o dedo a elementos da concelhia e carrega nas críticas à gestão de André Martins. E denuncia estacionamento indevidamente tarifado na cidade.

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O que a leva a candidatar-se à Câmara como independente? Já não acredita no PCP?
Candidato-me como independente por considerar que tenho experiência autárquica, força anímica e paixão suficientes, pela cidade e pelas pessoas, para dizer que Setúbal não está a ir pelo melhor caminho. Setúbal, que estava numa rota muito interessante de desenvolvimento, de progresso, de protagonismo, de visibilidade nacional e internacional, de repente estagnou. Há gente que não gosta da palavra, mas é o que está a acontecer. Estagnou! Tenho ali escritório, tenho ali também uma habitação e estar todos os dias a ver aquela cidade parada, muito maltratada, sem rumo, deixou-me verdadeiramente inquieta.

Mas o que mudou para acabar por se desvincular do partido?
Já não me revia no PCP há algum tempo. Disse ao PCP durante vários anos com o que não estava de acordo. Fui manifestando nos organismos certos o meu desagrado em relação a uma série de atitudes que algumas pessoas do PCP tomavam. Muitas vezes assisti a discussões – no sentido de troca de ideias e, algumas vezes, até acesa – de que algumas coisas não estavam a ser feitas de forma correcta. Havia um desapegar em relação às populações. Não há proximidade com as populações, ponto. Entrei no PCP no dia 1 de Janeiro de 1976 e saí no dia 26 de Abril de 2024. Trabalhei muito no PCP, dei muito ao PCP, dei muito às populações dentro dos projectos ou dos objectivos a que nos propúnhamos. Estive à frente de uma comissão de moradores, estive à frente da organização dos Pioneiros de Portugal.

E o PCP não lhe deu nada?
Não. Deu-me aprendizagem, aprendi muito, deu-me experiência. Tenho muitos camaradas de quem gosto dentro do PCP. Trabalhei com Álvaro Cunhal, que foi o meu expoente máximo, aprendi muito com esse homem. Hoje não é o mesmo PCP, nem de perto nem de longe.

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Porquê?
Isso tem de perguntar ao PCP. Dar uma nota, o PCP é um partido extremamente importante, faz falta a Portugal, ao povo português. Neste momento, tem atitudes com as quais não me revejo. Esta minha saída teve muita informação prévia. Informei que ia sair.

Disse que já vinha a avisar o PCP há vários anos, mas acabou por candidatar-se a Almada. Tinha algum acordo com o PCP para voltar a Setúbal, caso não vencesse as eleições?
Não. Havia preocupações, que coloquei à direcção nacional do PCP. O partido estava convicto da vitória em Almada. Eu estava preocupada, o PCP dizia “há um conhecimento do teu trabalho”… Mas achei sempre que [isso] podia não ser suficiente, para cerca de 200 mil habitantes. Pese embora o facto de eu ter tido mais 500 votos do que o Judas teve nas eleições anteriores, por exemplo, não foi suficiente para ganhar a Câmara da Almada. E eu previa isso.

Quais são as ambições e os interesses por detrás da sua candidatura, como disse o PCP?
São acusações infundadas, que o PCP nem sabe explicar, mete os pés pelas mãos e as mãos pelos pés, mas são graves. Ao mesmo tempo, é bom que a população saiba deste tipo de perseguição.
Eu não tinha ambições quando lhes dei três maiorias absolutas. Não tive ambições quando os representei, quando fui membro daquela comissão de moradores, quando estive na coordenadora nacional e no executivo nacional. Não tive ambições quando trabalhei e me dediquei tantos anos. Agora, estes tais quadros locais, que não têm história, são muito jovenzinhos, não têm experiência, não têm ligação com a população…

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Mas têm nome.
Têm, mas não vou dizer. Quem não tem projecto, quem não tem ambição, quem não sabe o que quer para o povo, quem não está próximo do povo, o mais fácil de fazer é criar suspeições infundadas sobre os outros. Eles que declarem exactamente quais são essas ambições, porque isto é uma perseguição, como estão a fazer a outras pessoas na Câmara. Quem põe “gostos” nas minhas publicações é perseguido. Quem fala comigo na rua, e se alguém vê, é perseguido. A dirigente local do partido manda um funcionário da Câmara, do PCP, ver quem é que está comigo a comer. As pessoas têm medo, falam comigo e fogem…

Antes não era assim, passou a ser agora esse tipo de prática no PCP? É isso?
Comigo não era assim. Algumas pessoas comentavam esse tipo de perseguições. Comentavam esse tipo de acusações, [que faziam] por detrás do pano. E eu achava incrível e achava que não era bem assim. Mais: quando a presidente da Junta de Freguesia de Azeitão se tornou independente, quando saiu do PCP, fui praticamente proibida de falar com essa senhora, minha amiga.

Proibida por quem?
Pela concelhia. Agora podem dizer que é mentira. Essa senhora e muitos camaradas sabem que é verdade. Mas nunca deixei de lhe falar, por achar que não era correcto.

Ao fazer essas afirmações, associa o PCP a uma espécie de regime de ditadura.
Não digo que seja o PCP, digo que são pessoas muito malformadas, pessoas que não têm consistência, não têm nada para dar, não têm nada para fazer, não têm experiência.

Apenas na concelhia?
Não sei. Eu vivi isto na concelhia. Não quero confundir a árvore com a floresta. Isto que estou a dizer é verdade. Há pessoas dentro do PCP, individualmente consideradas – não digo que é o PCP –, que perseguem, que estão atentas às minhas redes sociais para saber quem são os funcionários da Câmara que lá vão pôr “gostos”. Que fazem perfis falsos, que lançam mentiras, que perseguem. (…) Passar para a rua um comunicado já era expectável, o PCP não iria ficar calado face à saída de uma pessoa que militou 48 anos no partido. O PCP fez-me um grande favor. Posso falar do comunicado?

Com certeza.
Divide-se em três partes. Primeiro, não deixou dúvidas para algumas pessoas que diziam que [esta candidatura] era só fachada. Obrigada ao PCP por dizer, claramente, que há uma ruptura entre a Maria das Dores e o partido. Segundo, nunca disse em lado nenhum que fiz as obras sozinha. O que disse foi que, sob as minhas minhas presidências, Setúbal tomou um rumo de grande desenvolvimento, de grande progresso. O PCP diz isso no comunicado. E não foi só o colectivo. Foi Setúbal inteira. Foi o movimento associativo, as instituições, os trabalhadores da Câmara que se empenharam. Hoje está tudo desorganizado naquela Câmara. Hoje já é a ver quem faz menos. Alguns continuam a trabalhar, mas não há orientações. Agora é que se estão a definir algumas coisas muito à pressa para fins eleitorais. Foi também graças às juntas de freguesia, que tiveram um trabalho fantástico – e hoje até já há greves nas juntas –, também às instituições, ao movimento associativo, ao tecido empresarial, sem esquecer os comerciantes…

E a terceira parte?
A terceira foi dizerem: “Estamos a fazer a continuidade”. Foi essa continuidade que eu pedi às pessoas, fiz uma grande campanha em Setúbal, para que a Câmara não mudasse de mãos, para que se mantivesse naquele colectivo. O PCP vem dizer que está a fazer a continuidade. O PCP não vem à rua com aquelas pessoas que escreveram aquilo [o comunicado], são as tais que estão no gabinete, não ouvem o que as pessoas dizem e não conhecem o que vem nas redes sociais, o que se vê na rua, o lixo… as luzes apagadas, será porquê? Se calhar não pagam à EDP, há muito tempo. Há uma estagnação, não há continuidade. É estranho, estavam lá todos, só saí eu e a continuidade não se deu. O sr. presidente veio dizer que não há estagnação. Que é uma opinião própria. Ele queria dizer opinião única, que era só a minha. Não é. O sr. presidente está mal assessorado e já o sabe há muito tempo. Devia ter mudado de assessores. Trouxe tanta gente de fora, teria sido uma boa oportunidade para ter mudado também os assessores.

Não são os mesmos que lhe davam assessoria a si?
Mas eu não pensava pela cabeça deles. Eu dizia em função daquilo que a minha inteligência me ditava, daquilo que eu sentia e daquilo que eu via, que vivenciava.

Tanta gente de fora, quer dizer gente do partido, é isso que está a insinuar?
Não sei se é do partido ou não, não lhes fui pedir o cartão. Consta nos corredores que são do partido, alguns conheço, são do partido. Os trabalhadores comentam muito isso: “Veio mais uma dos Verdes, mais um do PCP…” Podia ser feita uma boa auditoria para ver este tipo de coisas.

Qual é a sua relação hoje em dia com André Martins, tendo em conta que o apoiou? Não há relação?
O senhor presidente esteve comigo 20 anos. Então o comunicado do PCP diz que havia uma continuidade e o senhor presidente depois diz que não havia projectos? Convento de Jesus, não é continuidade?…

Em relação à Comenda já não é assim?
Espere, eu queria falar da Várzea, não é continuidade? A Praça do Brasil não é continuidade? A Comenda qual é a continuidade? É que não percebo essa. A Comenda tem um proprietário. A Câmara pôs uma acção pelo parque das merendas…

… E conseguiu uma vitória.
Tanto quanto sei, os proprietários estão a continuar a pôr acções. Não está decidido. Mesmo que tenha tido uma vitória, excelente. Mas, se tiveram a vitória por que não tratam da Comenda com dignidade. Por que deixam a Comenda entregue a pessoas que exploram o parque da Comenda? É estranho.

Chegou a sondar o PS para ser cabeça-de-lista pelo partido às próximas autárquicas?
Totalmente falso. Também alguns elementos do PS tentam fazer alguma chicana política à volta disto. Que eu convidei uma pessoa para a junta de freguesia, o que é mentira, ou que me convidaram a mim. Essa soube há bem pouco tempo.

Não teve nenhuma reunião com nenhum dirigente do PS?
Não. Nenhuma. Têm de dizer com quem, o local, factos. Vamos falar verdade, sério. Nunca fui convidada para cabeça-de-lista.

Nem se fez convidada?
Muito menos. Às vezes em brincadeira uma ou outra pessoa dizia assim: “Você deveria ser a nossa candidata”. E eu dizia: “Saindo do PCP não há mais nenhum partido em que eu vá militar.”

O estacionamento pago tem inevitavelmente a sua marca. O que pensa fazer sobre esta matéria se vier a ser eleita presidente?
O estacionamento pago não é deste executivo. Não tem a minha marca. Há aí uma grande confusão. Nem vou dizer que tem a marca do colectivo, porque essa tem sem sombra de dúvidas. Foi o colectivo que também discutiu, que também votou. Não há decisões destas sem uma votação na Assembleia Municipal e na Câmara. Votaram todos. O estacionamento tarifado começou a ser preparado em 1992 sob a presidência do professor Mata Cáceres. Tenho documentos, tenho os contratos de concessão. E foi implementado em 1994. Foi adjudicado por 20 anos. Pergunto, as pessoas tinham moedas para 20 anos? Agora andam a fazer o mealheiro para 40, mas já nessa altura tinham moedas para 20 anos. Estou a brincar…

São coisas bem diferentes.
São bem diferentes. No contrato de 1994 havia a concessão por 20 anos em contrapartida de quê? No contrato de 2021 tinha contrapartidas da construção de dois parques de estacionamento. Mais uma vez, as pessoas que estão a assessorar o senhor presidente fazem sair notícias, fazem podcasts ao senhor presidente que são uma vergonha, uma tristeza. Ouvir o senhor presidente a responder que se fizesse esse contrato, faria de forma diferente… Senhor presidente não leia, não diga, o que o seu assessor lhe diz para dizer. Tenha bom senso. Porque foi o senhor que começou a fazer todo o projecto em 2016. Saiu [publicado] n’ O SETUBALENSE. O senhor fez reuniões com a APSS a pedir para ser nossa parceira no projecto. Lembra-se? Como é que agora diz que faria de forma diferente?

Não se arrepende e nem esta medida seria para mexer?
Qualquer cidade tem estes contratos. Eu queria lembrar que Lisboa tem contratos de concessão de 90 anos, de quando esteve sob gestão do PS. É só lá ir saber. Agora a Câmara fala na revisão do contrato, passados três anos. É muito tempo para pensar… É que se tivesse sido outra força política que chegasse à Câmara, a ver tudo de fio a pavio…

Admitiria uma revisão do contrato?
Não sei o que a Data Rede está a incumprir. Não sei o que a Câmara está a incumprir. Há incumprimentos de parte a parte. Há que rever. Mesmo que não houvesse estes incumprimentos, as pessoas não foram a uma discussão pública, não participaram, os partidos não participaram na discussão pública e depois vêm para a rua dizer ‘não queremos isto’. É preciso discutir, então vamos discutir. Há, por exemplo, zonas que no contrato não têm tarifação e hoje continuam de forma encapotada a ser tarifadas. O espaço que foi cedido pelo senhor Fernando Artur, por detrás do parque das escolas, para nós o asfaltarmos enquanto ele não fazia um projecto para aquele espaço. Fizemos ali, provisoriamente, um parque de estacionamento. Foi imediatamente tarifado. Chamei a atenção de que aquilo não estava no contrato. Mas, se você for lá pôr o carro, não é multado. Está a ver a técnica? A seriedade da Câmara passava por dizer à Data Rede para tirar de lá os parquímetros. Não tirava, a Câmara ia lá e selava-os. Mas, continua a pingar todos os dias.

A sua candidatura vai contemplar listas a todas as juntas de freguesia do concelho?
A todas as juntas de freguesia e à Assembleia Municipal.

Já tem todas as listas formadas?
Tudo, há mais de um mês.

Quem a acompanha na lista candidata à Câmara?
Não posso ainda dizer. No dia 21 de Setembro, em princípio, vamos solicitar vários espaços para a apresentação pública da candidatura e vão ser apresentados os cabeças-de-lista à Assembleia e à Câmara.

O cabeça-de-lista à Assembleia Municipal é independente?
É. É uma pessoa que esteve ligada a um partido, mas já há alguns anos que não faz parte desse partido. É uma pessoa de grande prestígio na cidade, toda a gente conhece. É um homem.

Quem convidou para encabeçar as listas às juntas de freguesia?
Também não vou dizer.

Tem consigo alguém que tenha apoiado o actual executivo da CDU?
Muita gente.

Se pudesse voltar atrás, aceitava candidatar-se a Almada pela CDU?
Não fazia sentido.

Venceu sempre com maioria absoluta em Setúbal, menos do que isso em 2025 é para si uma derrota?Não, não é. A conjuntura é outra. Há mais partidos a concorrerem, com certeza, vai haver aqui uma grande fractura com a CDU. Estou convicta de que esta candidatura independente vai vencer. O nosso sonho é pôr outra vez Setúbal nos carris. Vamos fazer uma grande onda de gente, de colectivo, desta vez sem partido, uma grande acção cívica, que tem já pessoas de todos os partidos, não é só da CDU. E o grosso são pessoas sem partido. Setúbal está embaciada e nós queremos que volte a brilhar.

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