Nasceu para a pintura e cerâmica com os ares do oceano no concelho de Almada e ‘abraçou’ o Seixal com uma Oficina de Artes
Manuel Cargaleiro, pintor e ceramista, morreu aos 97 anos na manhã do passado domingo, “tranquilo, rodeado pelos seus. Adormeceu”, disse, à agência Lusa, a sua mulher, Isabel Brito da Mana. A confirmação da morte do “pintor das cores” e que vivia das cores por “muito olhar para a natureza”, como o próprio se definia, foi dada em nota de pesar publicada no site da Presidência da República.
Amanhã, terça-feira, 2 de Julho, em que se realizam as exéquias do Mestre Manuel Cargaleiro, foi declarado Dia de Luto Nacional pelo Conselho de Ministros. A cerimónia está marcada para as 12h00, na Igreja Paroquial de S. Tomás de Aquino, e o funeral às 13h00, reservado à família, no cemitério da Costa de Caparica, em Almada.
Natural do concelho de Vila Velha de Rodão, onde nasceu em 1927, passou a sua infância na Caparica e manteve ligação a Castelo Branco onde fundou a fundação com o seu nome.
A viver em paris desde 1957, Manuel Cargaleiro “nunca deixou que o cosmopolitismo significasse desenraizamento. Prova disso é a memória das imagens e das cores da Beira Baixa na sua obra, nomeadamente a lembrança das mantas de retalhos; prova disso igualmente a empenhada presença do artista na região onde nasceu, através da Fundação e do Museu Cargaleiro”, disse o Presidente da República na mensagem de pesar da Presidência da República. Marcelo Rebelo de Sousa que o condecorou em 2017 com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique e, em 2023, com a Grã-Cruz da Ordem de Camões.
Com obras e talento reconhecido em vários países, o mestre que “dominou a cor e a geometria de forma marcante, imprimindo à arte contemporânea portuguesa um traço inconfundível”, como disse o primeiro-ministro, Luís Montenegro, em comunicado, deixou também marcas da sua obra no concelho de Almada e, mais tarde. no do Seixal.
É no Seixal, na Oficina de Artes Manuel Cargaleiro, instalada na Quinta da Fidalga, que se “guardam memórias e vivências da sua infância e juventude, quando residiu na margem sul em virtude de o pai ter sido administrador da Cooperativa Agrícola de Almada e Seixal e o primeiro Provedor da Santa Casa de Misericórdia do Seixal”, lembra a Câmara do Seixal, através de nota de Imprensa onde manifesta “profundo pesar pelo falecimento” do mestre.
Em 1999, Manuel Alves Cargaleiro foi distinguido pela Câmara Municipal do Seixal com a Medalha de Honra e, em 1994, o nome do artista foi atribuído à Escola Secundária do Fogueteiro, que passou a designar-se Escola Secundária Manuel Cargaleiro, e para a qual o mestre viria a criar um painel de azulejos.
Em 2018 foi inaugurada a Oficina de Artes Manuel Cargaleiro, em homenagem ao artista, sendo este um equipamento cultural de referência, projectado pelo arquitecto Álvaro Siza Vieira.
Uma oficina desejada pelo próprio Cargaleiro. Escreve o jornal “Público” que, Siza Vieira disse quando assinou o projecto para a Oficina de Artes dedicada ao artista no Seixal: “Trabalhar com Manuel Cargaleiro era receber o contributo, para o nosso próprio trabalho, do seu entusiasmo, da sua vitalidade”. Foi o próprio mestre que contactou Siza Vieira para a criação de um novo pavilhão na Oficina de Artes. “Nunca o vi sem que estivesse a pensar num novo projecto”, era neste espaço que queria que a sua colecção de arte fosse acolhida, e assim veio a acontecer.
Em Fevereiro de 2024, alguns bens artísticos pertencentes ao mestre foram doados à Câmara Municipal do Seixal, através do Termo de Doação de Obra de Arte assinado entre o artista e o município. “São sete obras, no valor global de cerca de 500 mil euros, que foram doadas a título gratuito ao município”, descreve a mesma nota de Imprensa.
Na Oficina de Artes Manuel Cargaleiro, na Quinta da Fidalga, foram exibidas várias exposições de sua autoria, como, por exemplo, A Essência da Forma, Entre o Seixal e Castelo Branco, A Essência da Cor e Gesto no Tempo, entre muitas outras.
O mestre na arte da cerâmica e vivacidade das pinturas, caracterizado por um uso vibrante da cor e uma sensibilidade única, sempre transcendeu as fronteiras da arte tradicional, enchendo de vida e emoção todos os espaços por onde as suas obras passaram.
Embora a viver em Paris, tendo recebido a Medalha Grand Vermeil, a mais alta condecoração da capital francesa, os primeiros passos de Manuel Cargaleiro no caminho da arte foram dados na Caparica. “O lugar onde tudo começou”, diz a Câmara de Almada em nota de Impressa onde “lamenta profundamente a partida do mestre”.
Foi no Monte de Caparica que, em 1945, iniciou as primeiras experiências de modelação de barro, na olaria de José Trindade. Depois, estudou em Lisboa onde frequentou a Escola Superior de Belas Artes para se dedicar às Artes Plásticas.
Entre o muito em que participou em Portugal antes de se mudar para França, no caso de Almada, em 1950 organizou com a Comissão Municipal de Turismo do Concelho de Almada o “I Salão de Artes Plásticas da Caparica”, em 1955 realiza painéis de cerâmica para o Jardim Municipal de Almada ( Jardim Alberto Araújo) e em 1958 participa na “III Exposição de Artes Plásticas”, no Convento dos Capuchos. Em 1990 concebe um painel de azulejos para o edifício “Papo-Seco”, na Costa da Caparica. Manuel Cargaleiro acompanhou de perto a obra de conservação e restauro da fonte do Jardim Alberto Araújo entre 2020/2021.
Na grande ligação que teve com o concelho almadense, em 1960 foi vereadora na Câmara Municipal e, em 1994, foi agraciado com a Medalha de Ouro da Câmara de Almada.
NR: No título, onde se lia hoje, deve ler-se amanhã. Corrigido às15h55