Rui Canas, presidente da União das Freguesias de Setúbal
A União das Freguesias de Setúbal organizou a Semana do Mar e do Pescador em parceria com a Câmara Municipal desde “a primeira hora do projecto”. Rui Canas relembra o início do certame e até os tempos anteriores em que se comemorava o Dia do Pescador com uma missa em homenagem aos homens do mar, romagens aos cemitérios e deposição de flores.
“Reunimos com a Câmara, mostrámos este projecto da Mostra das Tradições Marítimas, que é um projecto da junta, realizámos outras actividades, até chegarmos a este ponto, em que temos esta programação variada”, refere. Remar dentro de barcos tradicionais, ver pescadores a coser redes, a calafetar e a carpinteirar barcos de madeira e conhecer apetrechos marítimos, sem esquecer a visita a uma exposição de pequenas embarcações e a degustação de sabores do mar, são algumas das actividades em destaque.
Para o presidente da União das Freguesias de Setúbal, este evento tem como objectivo valorizar as comunidades piscatórias que há muito tempo se sediaram na zona do Troino e bairros circundantes e nas Fontainhas: “Começaram a viver fora das muralhas e a cidade ganhou vida e forma a partir destas duas comunidades”. Mas também as de hoje, parte da cultura setubalense, porque “não vivemos só do passado. O passado é importante, são as nossas raízes mas temos de olhar para o futuro.
Temos que olhar para a pesca como o desafio que é hoje”, considera, acrescentando que “a melhor coisa que podemos fazer neste sentido é valorizar quem vive hoje da pesca, quem teimosamente continua a apostar na pesca como uma forma de vida, não como uma profissão, porque andar no mar e na pesca não é uma profissão. É uma forma de vida e os pescadores sabem-no bem”. O autarca diz ainda que “este é um evento que vai deixar cada vez mais a sua marca” e que com o tempo “teremos que caminhar para um grande evento ligado às coisas do mar em Setúbal”.
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Crise da pesca em Setúbal
“A tradição da pesca, das conservas, do sal. Tudo isto foram, durante muitos anos, até 1960/1970, factores importantíssimos da vida de Setúbal, que era um dos principais portos de pesca do país”, recorda o presidente da União das Freguesias de Setúbal, Rui Canas, proveniente de uma família ligada ao sector das pescas, acrescentando que “a Semana do Mar e do Pescador tem como objectivo mostrar o que a pesca foi para Setúbal, a importância que teve, mas também mostrar o que ela é e há-de ser, passando-a às novas gerações, às crianças e a todos os que se identificam com esta forma de estar”.
Das memórias e tradições que mantém presentes em si até hoje, Rui Canas fala sobre a beleza do mar, o contacto com a natureza e os momentos de liberdade que este proporciona e deixa o alerta para o facto de “a pesca viver dias muito difíceis”: “É preciso ser-se teimoso para ser pescador ou armador. Hoje, as restrições da União Europeia, a questão das quotas, as manobras navais e tantas outras limitações são tão fortes à comunidade piscatória que realmente é cada vez mais complicado. Quando era miúdo, Setúbal tinha mais de 40 traineiras. Hoje tem duas e isto é preocupante”.
Reunir todas as condições necessárias para uma embarcação e ter a devida credenciação para ir ao mar são alguns dos problemas com que os pescadores se deparam actualmente.
Nas palavras de Rui Canas, “ninguém pode andar ao mar sem ter a sua cédula mas hoje exige-se um conjunto de coisas que as pessoas que querem ir para o mar não estão em condições de ter: existem níveis de escolaridade obrigatória, é necessária formação, entre outras coisas, e as pessoas acabam por não ir”.
Estas questões, a par do envelhecimento da população que dedica a sua vida à pesca, faz com que toda uma crise se instale neste sector. “Há ainda a questão da incerteza. Estamos a falar de uma vida de desgaste profundo, de dias em que as pessoas vão ao mar e não ganham nada mas têm custos só pela saída”, frisa. “Uma pessoa vai para o mar e não sabe se ganha, ou se não ganha, e nem sempre é por apanhar mais que ganha mais. Muitas vezes, quanto mais pescado se apanha, dadas as grandes quantidades, mais barato vai para venda”, continua.