Espaço sadino não resistiu às contingências da pandemia e encerra portas três anos depois. O proprietário, no entanto, tem esperança num regresso
O bar Decibel, em Setúbal, toca hoje os últimos acordes e despede-se da mesma forma como viveu. Pensado por Miguel Gonçalves, de 42 anos, para ser um bar de música ao vivo, foi exactamente através dos sons e do ecletismo que o espaço fez sucesso na cidade.
Para o mentor da ideia, o bar veio para suprir uma ausência que o mesmo sentia. “Não havia nenhum espaço de música ao vivo em Setúbal, para um público mais velho em que este se pudesse sentir à vontade. O conceito foi acrescentar a Setúbal algo que não existia. Foi o meu primeiro negócio, aprendi tudo sozinho desde o início e, aos poucos, começou a crescer…”, afirmou Miguel Gonçalves a O SETUBALENSE.
Com a intenção de dar música “a todos os tipos de público”, o Decibel teve nas suas colunas “todos os géneros, do rockabilly ao metal, passando pelo fado”. “Tentamos chegar a todos os públicos. A música é de todos e todos têm direito a música ao vivo. Arranjamos dias para toda a gente”, garantiu.
E, nas palavras de Miguel, apesar de o bar “não ser muito conhecido no início”, foi rapidamente tomado por amantes da música e da noite, “muitos que já não acreditavam na noite de Setúbal e desde que surgiu o Decibel começaram a sair mais”. “Inicialmente tinha duos e trios acústicos, depois percebi que tinha de ter mais e melhores, bandas já com outra experiência. E isso tornou-se bom para nós”, explica.
De uma forma algo expectável, no entanto, a pandemia do Covid-19 roubou ao Decibel os maiores prazeres: os artistas, a noite, o público que esgotava recorrentemente a casa e, sobretudo, deixou de prestar-se ao gosto maior de ter as portas abertas a toda a gente.
“Como o Decibel é um bar não funcionámos durante cinco meses e, neste momento, funcionamos com muitas limitações. Recebíamos todas as noites uma média de 300 pessoas e agora temos setenta, com cinquenta pessoas sentadas e vinte pessoas em pé, colocadas estrategicamente. Não é um negócio rentável”, confessou.
Os cinco meses de renda em atraso revelaram-se fatais. “Se a música ao vivo já não é rentável, muito menos assim. É impossível pagar a renda e as em atraso. E agora temos as mesmas despesas, apesar de algumas atenções dos músicos, e trabalhamos menos. A nossa hora de rentabilidade era entre as 00h00 e as 03h00, agora é muito mais baixa. Não há possibilidades, por mais amor que tenha”, disse Miguel Gonçalves.
Mas hoje, pelo menos hoje, é dia de festa no Decibel, mesmo que seja pela última vez. Com casa esgotada há praticamente uma semana, com os cinquenta lugares sentados já ocupados pelos regulares amantes de música ao vivo, é ao som de uma banda de tributo a Queen, entre as 22h00 e as 24h00, que todos vão marcar novos momentos na memória. “Os One Vision são uma das maiores bandas de tributo do país e já tocaram umas seis ou sete vezes para nós. Já deixaram filas à nossa porta porque não cabia mais ninguém e havia mais gente a querer ver o concerto. E foram eles que guardámos para o último concerto”, explicou.
Em vésperas de dia da cidade, o Decibel despede-se alegre sempre, cheio como muitas vezes esteve, e naturalmente ao som da música. Diz adeus, pelo menos, esta versão do Decibel, porque ainda há esperança.
“A minha intenção é abrir o Decibel noutro espaço, com condições melhores. Criámos algo que era para ser pequeno e cresceu muito depressa, não tínhamos noção. Estar a pensar agora noutro investimento não é fácil, a empresa ainda é nova para os bancos emprestarem valores avultados, mas a intenção é reerguer. Não sei se conseguimos, mas a intenção é voltar em força. Tem é de ser bem delineado”, finalizou decidido.