Quando falamos de transferência de competências falamos da mais importante reforma administrativa dos últimos anos, por conceder, aos autarcas, as competências e a autonomia de que necessitam para dar respostas de proximidade às suas populações.
A transferência de competências em mais de 20 áreas da administração central para os municípios decorre desde 2018/19. Ainda que nos tenhamos visto a braços com uma crise pandémica, o processo de descentralização não parou.
Em áreas como a da Saúde, da Educação e da Acção Social, o prazo para aceitação estendeu-se até 31 de Março de 2022. O município de Setúbal, ao longo do tempo e para rejeitar as transferências, foi alegando implicações financeiras, humanas e organizacionais.
Na área social mantém-se o prazo de 1 de Abril para os municípios assumirem as competências, mas aqueles que não conseguirem, por se considerarem impreparados, podem, a título excepcional, adiar o processo para Janeiro de 2023, como é o caso de Setúbal. O certo é que, no dia 1 de Abril de 2022, novas competências na Educação e na Saúde são uma nova realidade para o município e Janeiro de 2023 está já ali ao virar da esquina.
Dado os sucessivos alargamentos do prazo que o executivo dispôs para preparar esta transferência de competências, Joel Marques, em nome dos vereadores do Partido Socialista, concluiu, na última reunião de câmara, que das duas uma: ou o executivo preparou, efectivamente, ao longo dos anos de que dispôs, a transferência de competências no domínio da Acção Social, sendo que, se o fez, não tem justificação para não assumir essas competências no final deste mês, ou o executivo não preparou a transferência de competências, adiando essa responsabilidade durante mais este período.
O certo é que, onde outros vêem problemas, conseguimos ver desafios. Colocar o foco nos desafios significa assumir a perspectiva de que algo precisa e deve ser feito, seja a boa administração dos valores financeiros a transferir, a (re)organização funcional, a responsabilidade, as condições efectivas que permitam fazer mais e melhor, porque o desafio crucial é, sem dúvida, apanhar o comboio na velocidade a que vai passar. Caso contrário podemos não chegar ao destino final ou chegar atrasados.
O destino final da transferência de competências, para quem apanhe este comboio, passa pela proximidade. Quem melhor do que as autarquias para conhecer o seu terreno? Os seus munícipes? Os problemas das populações? O seu diagnóstico e respostas necessárias? Há aqui uma simbiose entre os instrumentos que sempre estiveram ao serviço da população e a proximidade, que é marca do poder autárquico. O seu conhecimento e esta dupla situação do benefício só pode resultar em vantagem para os próprios cidadãos.
Este destino implica transparência, responsabilidade, pragmatismo, coragem, diálogo permanente com o Governo, Segurança Social, escolas, centros de saúde, IPSS’s, entre outros envolvidos. Implica desconstruir medos e inseguranças dos vários profissionais e instituições envolvidos nas transferências, que pouco ou nada sabem, e motivação, com consciência da dimensão do desafio, procurando, em diálogo, as soluções que se impõem.
E se não apanharmos o comboio? Ficaremos inevitavelmente reféns do agravamento de assimetrias regionais, ao comprometer a universalidade e igualdade no acesso das populações aos serviços prestados. Fazem falta políticas adaptadas e assentes nas características do território, das populações, da sua identidade social, que promovam a coesão social e territorial.
E para apanhar o comboio, se há vontade, não há desculpas.