Com as eleições de março e após mudança de ciclo político, era expectável que o novo Governo, de imediato, anunciasse reformas estruturais na Saúde. Era conhecida a oposição do PSD, assim como da atual Ministra da Saúde, Ana Paula Martins, à organização do sistema de saúde em Unidades Locais de Saúde imposta por Fernando Araújo na Direção Executiva do SNS – até foi por isso que se demitiu da administração do Hospital de Santa Maria. Existiam dúvidas, também, sobre a continuidade da Direção Executiva do SNS, e, portanto, eram esperadas novidades sobre estes temas. Já se passaram quase três meses desde a tomada de posse e, ao contrário do que ocorreu nas áreas da Educação, das Infraestruturas e, até, da Justiça, nada de estrutural foi anunciado na Saúde. Embora a área da Saúde seja complexa e os interesses instalados sejam fortes, a sua importância não é comparativamente superior às outras. Então, por que é que, apesar das várias promessas feitas antes e durante a campanha eleitoral, ainda está tudo na mesma?
Antes de responder a esta pergunta, reconheço que foi apresentado um plano de emergência para o SNS, assente em cinco eixos (de forma simples, recuperação de listas de espera, maternidades, serviços de urgência, médicos de família e saúde mental), que está (ainda) a permitir o funcionamento dos serviços de urgência e o seu encerramento com previsibilidade e que começa a apresentar resultados na redução das listas de espera. Igualmente, reconheço que, não sendo uma negociação fácil pela concorrência do setor privado e da emigração, as negociações com os profissionais de saúde existem, continuam e parecem ser uma prioridade. No entanto, nada disto tem carácter estrutural. São medidas conjunturais e, mais cedo ou mais tarde, os seus efeitos irão terminar e os problemas mitigados irão regressar. Até a questão salarial dos médicos, caso a negociação seja bem sucedida, irá esgotar-se a prazo, em consequência da falta de condições de trabalho no SNS que continua por resolver.
Tudo ia mudar, mas afinal ainda está tudo na mesma. Os problemas da governação socialista, com especial impacto no distrito de Setúbal, mantêm-se. Tudo ia mudar, mas as urgências de obstetrícia ou de pediatria de Almada, do Barreiro, ou de Setúbal continuam a encerrar. Claro que podem dizer que esses encerramentos são conjunturais e que resultam do recurso a horas extraordinárias obrigatórias estar a chegar ao fim. Podem dizer que o plano de emergência, na parte das urgências, ainda não está totalmente implementado. Podem dizer ainda que o Governo tem três meses. A tudo isso, digo que compreendo, mas há outro argumento que responde à questão que fiz anteriormente: nas políticas de Saúde, pouco ou nada distingue o PSD do PS. O PSD poderá ter menos pudor em recorrer ao setor privado e social, mas só o considera, também, de forma suplementar e apenas quando o SNS falha. No essencial, na manutenção do SNS, ou seja, do Estado, como prestador universal de cuidados de saúde, PSD e PS convergem.
Já o escrevi antes, o modelo atual está esgotado. E o PSD, ao manter o SNS focado na estrutura e não nas pessoas – dando-lhes liberdade para escolher o prestador de cuidados de saúde que mais lhes convém, seja público, privado ou social – restringe o acesso à Saúde. E esta é a mudança estrutural que a Saúde precisa e à qual PSD e PS são avessos.
Afinal, será que tudo mudou para ficar na mesma?