26 Junho 2024, Quarta-feira

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Pensar Setúbal: Os 50 anos do 25 de Abril de 1974 (Parte VI): Nambuangongo

Pensar Setúbal: Os 50 anos do 25 de Abril de 1974 (Parte VI): Nambuangongo

Pensar Setúbal: Os 50 anos do 25 de Abril de 1974 (Parte VI): Nambuangongo

, Professor
8 Abril 2024, Segunda-feira
Professor

“Em Nambuangongo, tu não viste nada, não viste nada desse dia longo, longo; a cabeça cortada e a flor bombardeada, não tu não viste nada, em Nambuangongo(…)”

Manuel Alegre, “Nambuangongo, meu Amor”

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Desde 2023, que o Coro Setúbal Voz, a que pertenço, tem vindo a interpretar uma música da autoria do maestro e compositor Jorge Salgueiro, com letra de Manuel Alegre intitulada “Nambuangongo, meu Amor”, poema retirado de um livro que reúne todos os seus poemas, em torno da temática da guerra, e da guerra colonial em particular.
Da guerra em Angola ao posterior exílio em Argel, onde foi dirigente da Frente Patriótica de Libertação Nacional, a voz de Manuel Alegre converteu-se, aos microfones da emissora Voz da Liberdade, num símbolo de resistência e liberdade.
Publicou os seus primeiros livros que, apreendidos pela censura, passaram de mão em mão em cópias clandestinas, manuscritas ou dactilografadas. Poemas seus, cantados por Zeca Afonso e Adriano Correia de Oliveira, tornam-se emblemáticos da luta pela liberdade e contra a guerra em África.
Nambuangongo, é uma vila localizada num planalto a cerca de 200 quilómetros de Luanda
Durante a Guerra Colonial, foi nesse local, a 15 de Março de 1961 que ocorreu um dos mais sangrentos episódios do conflito, quando guerrilheiros da União das Populações de Angola (UPA; depois FNLA), o movimento independentista de Holden Roberto, atacaram as fazendas da região, mataram numerosos fazendeiros e levaram à fuga dos restantes, ocupando depois Nambuangongo e declarando a localidade como capital do “Estado Livre de Angola”, a primeira experiência de um território libertado angolano.
Os colonos que conseguem escapar aos massacres deixam o Norte. A maior parte das fazendas fica ao abandono.
Nambuangongo foi imediatamente transformada no quartel-general da UPA.
A resposta militar portuguesa é lenta. Apenas em finais de Abril, o pequeno contingente da província, calculado em 1.500 militares, começa a ser reforçado com tropas enviadas da metrópole. A partir de Nambuangongo, a guerrilha domina as povoações mais próximas e ameaça outras mais distantes como Ambriz, Carmona e até mesmo Luanda.
Os guerrilheiros da UPA dominam uma vasta região desde as margens do Rio Zaire até ao Sul dos Dembos.
Salazar nomeia o general Carlos da Silva Freire na dupla função de governador e comandante-chefe, recebendo ordens de Lisboa para andar depressa – e bem. É criada a Zona de Intervenção Norte (ZIN). A manobra militar tem vários objectivos: interditar a fronteira, atacar a guerrilha, abrir itinerários, dar segurança às populações e restabelecer a administração civil.
O governo de Lisboa exige a vitoria em menos de três meses.
Para esse efeito, é criada a denominada “Operação Viriato”, cujos objectivos são, para além da conquista de Nambuangongo, apoiar a reocupação militar do Norte.
O mês de Julho já ia a meio e o Governo de Lisboa exigiu aos altos comandados de Luanda a vitoria total até meados de Setembro – antes do início da época das chuvas e antes da reabertura da Assembleia Geral da ONU. Não havia tempo a perder.
Os guerrilheiros angolanos acreditavam na ressurreição: mesmo que fossem mortalmente atingidos voltariam a viver, e isso dava-lhes coragem para efectuar ataques frontais.
Nesse sentido, os comandantes portugueses receberam instruções para decapitar os guerrilheiros mortos e espetar as cabeças em estacas.
Os combatentes da UPA, estavam convencidos de que não ressuscitariam se lhes fosse amputada uma parte importante do corpo. A exibição das cabeças decepadas servia para lhes provar que morriam de cada vez que atacavam os militares portugueses e não podiam ressuscitar
Na tarde do dia 10 de Agosto de 1961, Nambuangongo foi reconquistada.
Inúmeras vítimas jaziam no solo. De ambos os lados.
“Em Nambuangongo olhei a morte e fiquei nu, tu não sabes, mas eu digo-te, dói muito em Nambuangongo, há gente que apodrece”
Seja ontem, hoje, ou amanhã, a guerra é a barbárie. Não há culpados, nem inocentes; apenas vítimas.
Não existem heróis, nem coragem, nem cobardia; apenas mortos e feridos. Física e psicologicamente.
Nambuangongo constitui-se também como o início do fim do Estado Novo.
O 25 de Abril procurou resgatar todos aqueles que morreram na Guerra Colonial.

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