Desde tempos imemoriais que a escravatura fez, infelizmente, parte intrínseca da história humana. Desde o Egipto, a Grécia, o Império Romano, Ásia, África (quer perpetrada pelos brancos, pelos negros e pelos árabes) e em toda uma miríade de locais, essa forma sub-humana e indigna de relacionamento humano, foi sempre uma constante.
A nossa velha Europa, em particular, deve constituir-se como uma referência cultural, democrática, tolerante e respeitadora. Deve saber receber e incluir todos aqueles que, provenientes nos mais variados locais, nos procuram na demanda de melhores condições de vida. Os filhos devem frequentar a escola e os pais devem trabalhar em locais que tenham condições dignas, seguras e que recebam o seu ordenado, que lhes permitam não somente subsistir, mas sobretudo prosperar. Em paz e tranquilidade.
É isso que todos nós devemos procurar atingir como sociedade.
A Europa tem de ser sinónimo de Humanismo.
Mas, infelizmente, não é isso que tem acontecido e em Portugal temos assistido à utilização escrava de trabalhadores, principalmente no sector da Agricultura, onde a sazonalidade das próprias produções, a isso induz. E potencia.
Criminosamente. Perante a nossa indiferença e complacência.
Este é já um tema antigo e recorrente. Somente agora é que o país parece ter descoberto, o que há muito conhecia ou pelo menos tinha fortes motivos para desconfiar, ou seja: em Portugal, centenas de imigrantes vivem em condições desumanas, empilhados em contentores e sujeitos a práticas que julgávamos extintas, como a escravatura ou o tráfico de seres humanos.
Só no passado mês de Março, foram abertas novas investigações contra entidades patronais e seus titulares, segundo o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), onde se configuram práticas de auxílio à imigração ilegal e falsificação de documentos, relacionados com relações laborais fraudulentas.
As vítimas são maioritariamente de países do Leste Europeu ou asiáticos (Roménia, Moldávia, Paquistão, Nepal e Índia), que vêm para Portugal atraídos pela promessa de um alojamento, alimentação, transporte e salário, bem como de um contrato, subsídio de alimentação, folgas, férias e a horários de trabalho.
Na realidade, nada disto acontece. Os trabalhadores recrutados são levados, na sua maioria, para casas arrendadas pelos empregadores, localizadas nas proximidades ou nas próprias explorações agrícolas, ficando na total dependência dos angariadores, mesmo no que se refere à alimentação. Além dos salários baixos, os alegados empregadores exigem ainda avultadas quantias aos trabalhadores para custos de acomodação, alimentação e transporte e ainda descontos nos vencimentos.
Sofrem inclusivamente ameaças aos familiares que ficaram nos seus países de origem, caso denunciem estas situações vergonhosas.
Chegam ao ponto de pedir-lhes dinheiro, dizendo-lhes que é necessário para obter documentação, um número de contribuinte e de utente da Segurança Social, com vista a um contrato de trabalho, contrato esse que nunca é concretizado.
Aqui, basicamente, é uma questão de princípios, atitudes e valores, quer dos empresários que gerem estas explorações agrícolas, quer dos nossos responsáveis que têm sido permissivos com tudo isto.
As injustiças e os abusos tornam-se recorrentes e insidiosos devido ao silêncio de uns, à actuação delinquente de outros, à complacência e conivência criminosa de muitos.
Por onde anda a Europa dos valores? Esta é uma nova forma de escravatura, aqui mesmo, perto das nossas casas.
Que vergonha!!!