A Cultura está já habituada a levar pancada. E os últimos tempos certamente não têm sido diferentes: para além de ser o setor com a 2ª menor dotação do Orçamento de Estado para 2023 – 0,43%, mais perto do zero do que o 1% tão reivindicado e justo – os artistas sofreram uma valente razia nos mais recentes concursos dos apoios sustentados às Artes. Milhares de profissionais estão assim em risco de desemprego e estruturas histórias correm mesmo o risco de fechar portas.
Perante o ciclo de apoios de 2020, o ministro Adão e Silva reconheceu os valores drasticamente abaixo do necessário e do aceitável, comprometendo-se a um reforço de quase 80 milhões em 2022. Mas essa verba concentrou-se apenas na modalidade dos apoios quadrienais, resultando numa das maiores assimetrias de sempre. Os resultados da modalidade bienal revelaram um assolamento abismal: o insuficiente investimento público fez com que centenas de estruturas, candidaturas elegíveis com pontuações acima dos 60% e até 70%, ficassem de fora do acesso ao financiamento.
Estão em causa projetos que dinamizam o interior. Estão em causa postos de trabalho permanentes. Estão em causa espaços de debate, de partilha e de criação. Estão em causa trabalhos experimentais de artistas emergentes. Estão em causa estruturas que durante décadas que construíram um Portugal um pouco menos inculto. Está em causa o contributo social imensurável de artistas da dança, do teatro, da música, das artes de rua, do circo, da fotografia, das artes plásticas, e de tantas outras disciplinas.
Os profissionais da Cultura saíram em protesto no passado dia 11 de janeiro em frente à Assembleia da República, onde o ministro era ouvido na comissão parlamentar sobre o fiasco. Revindicaram justiça e correção. Adão e Silva respondeu com falta de humildade, descrevendo a devastação do setor como “danos colaterais”. Na realidade, são escolhas erradas que condena as artes ao desaparecimento.
O ministro rejeitou-se a reforçar os concursos, afirmando que tal seria péssimo para o setor, criaria instabilidade e precariedade. A Iniciativa Liberal chamou a centenas de profissionais em protesto à porta da Assembleia de subsídio-dependentes. O PSD, como manda a tradição da direita portuguesa, tem anos de histórico no sufoco do setor. Enfim, todo um setor em desespero, e a direita e o PS só dão música.
O modelo de avaliação agarrado ao Excel e de análises frias e meramente técnicas retira qualquer perceção sobre o conteúdo artístico dos projetos e das missões das entidades culturais. A arte, meio de excelência da expressão, da história, do pensamento social, é um serviço público. A Cultura é um direito e um pilar da sociedade. Os artistas estão em luta por um novo modelo de apoio às Artes, e o Bloco está com eles.