29 Março 2024, Sexta-feira
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De onde vieram os votos de André Ventura?

Em meados de Dezembro de 2020, o jornal O SETUBALENSE publicou um artigo, da minha autoria, com o título “De onde vêm os votos no Chega?”. Nesse artigo, depois de fazer uma comparação estatística entre os valores de uma pequena freguesia do Alentejo, onde aquele partido teve uma elevada votação, cheguei à conclusão de que a maior parte dos votos no Chega foram obtidos à custa de anteriores eleitores do PS e do PSD, e não da CDU, como em geral se apregoava.

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Agora, com as recentes eleições presidenciais e com elevada votação obtida pelo candidato André Ventura, novamente várias vozes se levantaram sobre a origem dos seus votos. Em geral, os palpites, pois estudar dá muito trabalho, como já o dizia Fernando Pessoa, são simples: se a CDU sempre teve boas votações no Alentejo, então foi essa coligação que perdeu mais votos para André Ventura. Apenas foi publicado um artigo equilibrado sobre o assunto, no jornal online Observador, mas passou quase despercebido, pois foi contra a corrente geral dos comentadores habituais. Mas na realidade, como se passaram as coisas?

Para este estudo escolhi duas pequenas freguesias do Alentejo: uma no distrito de Beja e a outra no de Portalegre. Precisamente as duas freguesias onde André Ventura teve as mais altas votações, em percentagem, de todo o País. Utilizei o mesmo processo que já tinha sido aplicado no artigo de Dezembro. Primeiro normalizei os votantes, nas eleições de 2016 e 2021, para ser possível a comparação dos resultados. Depois foram analisados resultados, mas com algumas precauções. Apenas os candidatos Marcelo Rebelo de Sousa, Marisa Matias e Vitorino Silva concorreram às duas eleições. Já pela CDU os candidatos foram diferentes. Depois temos, ainda, os candidatos que apenas concorreram a uma das eleições.

Começo pelo distrito de Beja, no concelho de Moura, com a freguesia de Póvoa de São Miguel. Nesta modesta freguesia, com apenas 329 votantes, André Ventura teve mais de 40% dos votos expressos, nos candidatos, enquanto Marcelo Rebelo de Sousa obteve apenas 30%, ficando em segundo lugar. De destacar que Sampaio da Nóvoa, em 2016, conseguiu 102 votos a mais do que os 100 votos obtido por Marcelo em 2021.

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Organizada uma tabela das variações dos votos nas duas eleições, verificou-se que André Ventura obteve 134 votos em 2021. Esses votos vieram de todos os candidatos das anteriores eleições, incluindo dos que se recandidataram, pois os 134 votos conseguido por André Ventura correspondem exactamente aos votos perdidos pelos restantes candidatos. Isto é, André Ventura recolheu votos de todas as origens possíveis.

Os números dos ganhos dos votos para André Ventura são bem expressivos. Assim, de 2016 para 2021, Marcelo Rebelo de Sousa deu-lhe 35% dos votos, Sampaio da Nóvoa 26%, Marisa Matias 11%, Vitorino da Silva 8% e João Ferreira (CDU) 2%, enquanto que os restantes candidatos de 2016 deram 18% dos votos. Podemos, assim, concluir que os grandes fornecedores de votos, em 2021, para André Ventura foram Marcelo Rebelo de Sousa e Sampaio da Nóvoa, seguindo-se os vários candidatos de pequenos partidos da eleição de 2016.

Passamos agora à freguesia de São Vicente e Ventosa, no concelho de Elvas, no distrito de Portalegre. Com apenas 266 votantes, André Ventura obteve uma expressiva votação, com mais de 40% dos votos, e ficou, assim, em primeiro lugar. O estudo comparativo mostrou uma variante em relação à outra freguesia. Com efeito, os candidatos Marcelo Rebelo de Sousa e André Ventura aumentaram a sua votação em 2021. Assim, André Ventura obteve 113 votos e Marcelo Rebelo de Sousa 110 votos, mais 34 do que em 2016. Esta nova situação significa que ambos os candidatos, em 2021, receberem votos dos outros candidatos das eleições de 2016 e de 2021.

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Feitas as contas, temos que Marcelo Rebelo de Sousa aumentou em 44% a votação. Quanto a perdas, para Marcelo Rebelo de Sousa e André Ventura, Sampaio da Nóvoa forneceu 52% dos votos, Marisa Matias 16%, o candidato da CDU, João Ferreira, 10%, os restantes candidatos de 2016 17% e Vitorino Silva uns 4%. Podíamos, ainda, ampliar o estudo para se encontrar a repartição dos votos para os dois candidatos vencedores, mas isso são contas já fora do âmbito deste trabalho.
Podemos concluir que nestas duas freguesias de expressiva votação no candidato André Ventura, este apenas conseguiu recolher votos aos candidatos do BE e da CDU, com valores de 2% e 10% para a CDU e de 11% a 16% para o BE. A grande maioria dos votos vieram dos habituais eleitores do PSD, PS e alguns do CDS. Afinal os que governam o País há dezenas de anos.

As populações do interior estão magoadas e revoltadas. Sentiram, ao longo dos últimos anos, a perda do serviço de comboio e a redução das carreiras de autocarros. A estação dos CTT e a filial da CGD certamente fecharam e, para fazer uma simples radiografia, têm de se deslocar dezenas de quilómetros. Entretanto, pela televisão, sabem de antigos políticos e banqueiros que são suspeitos do desvio de milhões de euros e ainda nem sequer foram julgados. Então apareceu alguém “contra o sistema”, com palavras simples, que apontava causas e propunha soluções rápidas e milagrosas para todos os seus males. Aqui está a origem dos votos no candidato André Ventura!

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