24 Abril 2024, Quarta-feira
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Revolução silenciosa

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Revolução silenciosa
Mário Moura - Médico
Mário Moura –
Médico

 

Que se passa verdadeiramente no mundo cristão? Se olharmos à nossa volta apercebemo-nos de mudanças radicais? Nas celebrações oficiais da nossa diocese, das nossas paróquias, apercebemo-nos de mudanças recentes? Á minha observação e à minha sensibilidade – certamente por desatenção – de pouco ou nada me apercebo .   Nos tempos recuados do bom Papa João, nos tempos de JOÃO XXIII, senti a sua preocupação com os graves problemas da nossa sociedade e dum desfasamento da Igreja Católica com o mundo que se transformava com enorme rapidez – e vivi intensamente , mesmo com a censura salazarista  a notícias sobre o Concílio, pelo menos ao acabar da missa em latim com o sacerdote de costas para a assembleia dos leigos ( quando queremos dizer que alguém não sabe nada de determinado assunto, dizemos :”é um leigo na matéria”, e nessa altura os cristãos dividiam-se em dois estratos: os leigos e os sacerdotes). Mas ,na realidade, do Concílio saiu uma enorme resolução : a centralidade do “povo de Deus” na nossa Igreja. Na nossa diocese, com o nosso primeiro Bispo, D. Manuel Martins, tivemos a experiência duma democraticidade com representantes das paróquias eleitos e com a constituição duma “Assembleia Diocesana” para discussão com o nosso Bispo dos problemas candentes que se viviam então na península de Setúbal. Foram tempos de grande fervor e de grande atividade dos cristãos duma região muito avessa politicamente aos princípios religiosos.  Foi “sol de pouca dura”, como se usa dizer. Uma resistência surda envolveu a iniciativa e o nosso Bispo, acabando por vencer tal “modernidade”! Em Roma o Papa Paulo VI navegou entre a continuidade das mudanças e a força dos tradicionalismos. Depois o Papa João Paulo II durante o seu longo pontificado , viajando muito e reunindo multidões, não deixou de travar os “devaneios” de teólogos que apareciam discutindo assuntos muito arreigados ás ancestrais e rígidas normas. No nosso ponto de vista a evolução da Igreja Católica pouco se alterou. E a realidade é que o número de cristãos no ocidente europeu ia diminuindo e perdendo força e presença – mantinha-se bem viva pelas Américas do Sul  e igualmente continuava a expandir-se por outros continentes onde o Islão era força predominante.  O Papa Bento XVI, que fora o braço forte de Roma para manter a “pureza doutrinal” (!)  distingue-se pela inédita resolução de abdicar, e é escolhido pelo Conclave dos Cardeais o cardeal Bergoglio, oriundo da América do Sul e que toma duma maneira significativa o nome de Francisco, lembrando um outro Francisco de Assis que vivia a pobreza e amava a natureza. E este Francisco de Roma inicia pelo seu comportamento e pelas suas palavras e atitudes  uma verdadeira revolução pacífica mas radical. Mas será que à nossa volta se notam os efeitos da conduta e das palavras, plasmadas em várias encíclicas do atual Papa, mesmo passados que são já quase meia dúzia de anos?   A passividade, a indiferença, os silêncios, no mundo católico, e até mesmo uma surda oposição declarada, tentam travar as mudanças. Talvez seja uma das vozes vindas de Roma mais ouvidas e elogiadas pelo mundo em que vivemos. E a sua palavra clama por uma Igreja “em saída”, por uma Igreja tipo “hospital de campanha” que aparece e se arma onde é necessário ajudar os excluídos , os pobres e os doentes, aponta o dedo às agressões à nossa “Mãe Terra” e á nossa organização social onde manda “um capitalismo globalizado” que “mata” – mas nem por isso se nota uma mudança atuante nas nossas comunidades, ditas cristãs. Mas onde Francisco pode mexer a “revolução” vê-se: uma Cúria, em Roma pois claro, mais simples e…com leigos, homens e mulheres, e transforma a tutela das Ordens e Congregações, igualmente com a presença de mulheres, alterando assim uma verdadeira e velha misogenia que reinava no Vaticano. E pede aos Bispos que se preocupem essencialmente com a evangelização  e a recristianização  dos fieis das suas dioceses, a quem pede que vivam uma verdadeira “revolução da ternura”. Quando sentiremos à nossa volta os efeitos desta necessária e urgente revolução?