Vanessa Amorim: “O nosso associativismo é muito quotidiano e informal”

Vanessa Amorim: “O nosso associativismo é muito quotidiano e informal”

Vanessa Amorim: “O nosso associativismo é muito quotidiano e informal”

A antropóloga faz parte do Grupo de Oficinas Colaborativas, que permite a concretização de “uma acção colectiva sobre o território” com que sonhava desde muito jovem

 

Filha de Setúbal e do Bairro dos Pescadores, para onde foi morar quando tinha apenas cinco anos, Vanessa Amorim percorre o território desde que se lembra e conhece-o como a palma da sua mão. “Tinha dificuldade em estabelecer fronteiras entre bairros. Estava tudo ligado, mas ao mesmo tempo cada um tinha uma identidade própria, o que despertou o meu interesse e me fez questionar: mas eu sou de onde? Sou um bocadinho disto tudo”, começa por dizer.

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No ensino secundário, fez o curso de Línguas e Humanidades, igualmente “determinante” no seu percurso. A escola foi “um grande escape e motivo de inspiração”. Os interesses de Vanessa Amorim não se centravam numa área apenas: “gostava muito de história, literatura e escrita e sobretudo tinha já um grande sentido de justiça social, que herdei da minha mãe”. Um livro de antropologia havia de lhe dar a descobrir que caminho seguir.

Entrou para o Iscte – Instituto Universitário de Lisboa em 2010 para fazer uma licenciatura em antropologia e logo nas primeiras aulas percebeu “que era isto que queria fazer. Antropologia conjuga uma série de áreas e permite compreender a condição humana, que era o que me fascinava. Antropologia ajudou-me a pensar, é sobretudo um modo de pensar”. Seguiu-se um mestrado na mesma área e na mesma instituição, que a trouxe de volta às raízes. “Cresci a ouvir conversas sobre pesca e mar, a perceber que havia sempre uma incerteza e instabilidade fruto dessa vida e essas histórias fantásticas ficaram em mim”, partilha. “Escrevi a minha tese sobre a comunidade piscatória de Setúbal, com foco nesta incerteza. Até então não existia nada em antropologia ligado à pesca na cidade e quero que de alguma forma a minha formação se repercuta no meio onde cresci”, justifica.

Nesta linha, tem desenvolvido trabalho em torno dos assuntos do mar e da pesca, também no domínio do teatro. “Pelos que andam sobre as águas do mar” e “A céu aberto”, com Raquel Belchior, “A Casa de Emília” e “À flor das águas”, com o Teatro Estúdio Fontenova, são alguns dos espectáculos em que participou na investigação e dramaturgia, e dos quais resultaram também livros.

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Ligada à pesca pessoal e profissionalmente, está no presente a terminar o seu doutoramento em antropologia e é membro do Conselho de Administração da Mútua dos Pescadores.

 

Moradores querem voltar a situar os bairros na cidade

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Desde cedo notou que “não havia grande organização de moradores” no sítio onde vivia. Quando em 2015, a Câmara Municipal de Setúbal decidiu reunir com os moradores do Bairro dos Pescadores, Vanessa não hesitou em participar. Com a continuidade destas reuniões, em 2017 nasce o Grupo de Oficinas Colaborativas (GO), projecto da autarquia implementado no território da Anunciada, onde se inclui o Bairro Grito do Povo e o Bairro dos Pescadores, no qual Vanessa Amorim se inclui até agora. “Desde logo começámos a pensar em formas de intervir no território, como é que as nossas ideias podiam de facto ter uma consequência, que vivências queríamos para os vários locais dos bairros”, partilha.

Para além da participação nas obras realizadas no âmbito do Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano, ao longo do tempo o grupo foi desenvolvendo um conjunto de iniciativas que visava projectar os espaços dos bairros e com a sua organização em colectivo já alcançou várias mudanças na vida de quem lá vive.

O livro “Caminhos com História – Memórias dos Bairros dos Pescadores e do Grito do Povo”, que Vanessa Amorim assina com a irmã Joana Amorim, é exemplo disto. Criado de forma colaborativa com os moradores participantes nas oficinas, faz-se de memórias sobre estes bairros, “de forma a registar quem são as pessoas que aqui vivem e têm tanto para dar”.

O GO assume, nas palavras da antropóloga, elevada importância enquanto “espaço e forma de organização que nos permite intervir e ter espaço para trabalhar em conjunto. É um compromisso colectivo, as coisas têm vindo a melhorar, o grupo mais fixo tem cerca de 20 elementos e o grande objectivo é conseguir envolver mais moradores”. Não integra o associativismo “no sentido clássico do termo”, mas não deixam de ser “uma forma de acção colectiva sobre um território”.

Para Vanessa Amorim, “o nosso associativismo acaba por ser uma coisa muito mais quotidiana e informal com uma força motora muito importante. Intervimos nos territórios onde moramos, tentando encontrar soluções e tendo uma visão crítica sobre o que nos rodeia e o que queremos fazer”, afirma, destacando “a vontade dos moradores de voltar a situar os bairros enquanto parte da cidade. Nem mais nem menos do que outros”.

 

Vanessa Amorim à queima-roupa

Idade 30 anos

Naturalidade Setúbal

Residência Setúbal

Área Antropologia

Discreta por natureza, nunca hesita em defender os valores da justiça, igualdade e solidariedade

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