Recurso do Clube da Arrábida teve provimento parcial. Pedido de suspensão da empreitada volta à primeira instância
O Tribunal Central Administrativo (TCA) deu provimento parcial ao recurso apresentado pelo Clube da Arrábida e manda o Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada (TAF) apreciar novamente o pedido de suspensão do contrato de empreitada para o porto de Setúbal.
A decisão do TCA assenta no facto de a empreitada ter sido adjudicada, pela Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS), dona da obra, à empresa Mota Engil, sem ter havido lugar à audiência prévia dos cidadãos interessados, prevista no artigo 4.º do decreto-lei 83/95 de 31 de Agosto.
Na primeira instância, a falta de audiência prévia à adjudicação foi considerada insuficiente para dar provimento à providencia cautelar por o Tribunal de Almada entender “ser improvável que o pedido de declaração de nulidade do contrato venha a ser julgado procedente com fundamento na alegada violação do dever de audiência prévia, pelo que não se verificava o requisito fumus boni iuris”.
Com este entendimento, o TAF de Almada concluiu que não existia dever de audiência prévia.
Ao contrário, o acórdão do TCA considera que, “em função do relevante impacte no ambiente da obra em causa”, existe esse dever de audiência prévia a cidadãos interessados e entidades defensoras dos interesses que possam vir a ser afectados, pelo que manda repetir a apreciação da providencia cautelar.
“Perante a factualidade indiciariamente assente e as considerações que se deixaram expostas, na situação dos autos é de afastar, como se entendeu na sentença sob recurso, a improbabilidade da aplicação ao caso do citado artigo 4.° da Lei n.° 83/95, de 31 de agosto. Com efeito, ao contrário do vertido na decisão sob recurso, não vemos que a circunstância do Plano Estratégico dos Transportes e Infra-estruturas aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.° 61-A/2015, de 20 de agosto, ter sido precedido de debate e consulta pública surja como factor determinante no juízo de improbabilidade que ali se faz quanto ao pedido de declaração de nulidade do contrato vir a ser julgado procedente com fundamento na alegada violação do dever de audiência prévia. Nem que tal debate e consulta pública, tal como as consultas que antecederam a Declaração de Impacte Ambiental, se substituam ao direito de audiência prévia estabelecido naquele artigo 4.°.”, lê-se no acórdão assinado pelos juízes Pedro Nuno Figueiredo, Carlos Araújo e Paulo Pereira Gouveia.
“Temos, assim, por verificado o requisito fumus boni iuris, dada a aparência do bom direito, consubstanciada na provável violação do direito de audiência prévia. Em suma, o recurso procede quanto a esta questão.”, conclui o acórdão de que o Clube da Arrábida foi notificado ontem.
Os ambientalistas que avançaram com a providencia cautelar dizem que esta decisão judicial é uma nova esperança para travar as dragagens no rio Sado.
“Este acórdão é uma confirmação do que temos vindo a dizer, que este processo está inquinado desde a primeira pedra. Todas as fases têm sido muito obscuras e o TCA vêm dar-nos razão, pelo que esta é uma vitória e uma esperança para todos os que estão a lutar pelo rio Sado.”, disse Pedro Vieira.
O Clube da Arrábida tinha apresentado este recurso junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada no dia 5 de Março, depois do mesmo tribunal ter indeferido, a 17 de Fevereiro, dois pedidos de providência cautelar, apresentados em Setembro de 2018 por esta associação.
A primeira providencia cautelar, contra a Declaração de Impacte Ambiental (DIA) foi chumbada, por ter sido apresentada fora de prazo, mas a segunda, contra a empreitada, terá de ser reapreciada, após o acórdão do TCA agora conhecido.
O SETUBALENSE – DIÁRIO DA REGIÃO questionou ontem a APSS mas, até ao fecho desta edição, não obteve reação à decisão do TCA.
Lídia Sequeira revela que relação laboral não tinha contrato
Presidente da APSS estive em audição na Assembleia da República
A relação laboral no porto de Setúbal, anterior à recente greve que paralisou os terminais durante semanas, não tinha contrato, revelou na quarta-feira a presidente do Conselho de Administração do Porto de Lisboa (APL) e dos portos de Setúbal e Sesimbra (APSS), Lídia Sequeira, na audição conjunta aos administradores dos portos do país na Assembleia da República.
“As relações laborais entre operadores portuários e os trabalhadores portuários são relações que não estão directamente cometidas às administrações, o que […] não impede que as administrações portuárias tenham a preocupação de acompanhar esse processo”, afirmou Lídia Sequeira.
A responsável referiu que, quando assumiu funções em Lisboa, “tinha havido uma longa greve de cerca de quatro anos que perturbou profundamente todo o trabalho e desenvolvimento da atividade portuária”, tendo, por isso, o início do seu mandato ficado marcado pela mediação do conflito laboral.
“Igualmente em Setúbal devo dizer-vos que foi minha preocupação […] constatar que no porto não havia nenhum acordo nem contrato coletivo de trabalho. Havia uma relação laboral cujo contrato tinha caducado e não havia nenhum acordo entre as partes. Não havia situação de conflito, mas não havia esse laço legal […] e, portanto, foi minha preocupação reunir com entidades patronais e fomentar início de negociações com sindicato”, concluiu.
As administrações portuárias do Douro, Leixões, Viana do Castelo, Madeira, Lisboa, Setúbal e Sesimbra garantiram, no parlamento, que não ignoram os problemas dos estivadores, vincando, porém, que não são a entidade patronal destes trabalhadores.
As responsáveis destas administrações estiveram numa audição conjunta na comissão parlamentar de Trabalho e Segurança Social, na sequência de um requerimento do Bloco de Esquerda (BE), sustentado por um conjunto de denúncias que apontavam para violações da lei laboral, abuso do trabalho precário e descriminações sindicais.