Em Dia do Mundial do Ambiente, o presidente do ICNF responde sobre as principais questões ambientais desta altura, no distrito
As maiores ameaças às zonas protegidas do distrito e o futuro do turismo de natureza em tempos da pandemia Covid-19, são alguns dos temas abordados pelo presidente do Conselho Directivo do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), que neste Dia Mundial do Meio Ambiente deixa vários recados a todos os leitores de O SETUBALENSE.
Quais as maiores ameaças, neste momento, às zonas protegidas da península de Setúbal, entre os rios Sado e Tejo?
As pressões a que as áreas naturais estão sujeitas estão em linha com o contexto que se verifica a nível nacional, na dualidade entre um litoral fortemente urbanizado e albergando uma parte significativa da população, por contraponto ao interior desertificado e quase vazio de população. No caso concreto, os valores naturais em presença continuam a revelar um bom estado de conservação e as medidas de ordenamento tomadas ao longo dos anos, designadamente através dos planos de ordenamento das áreas protegidas têm conseguido conter os efeitos mais negativos e garantir que os espaços naturais mantêm o seu equilíbrio e o seu valor. Este valor é também um activo estratégico da região, que encerra um potencial de aproveitamento, em termos dos serviços dos ecossistemas existentes que são disponibilizados à sociedade, que pode ser transformado em valor de várias formas, nas quais o turismo de natureza pode ter um papel de destaque.
Como vê o futuro deste tipo de turismo no pós-pandemia?
Nestes tempos marcados pelo desconfinamento e pela dificuldade em viajar para fora de Portugal, prevê-se que haja um aumento da procura do turismo da natureza em Portugal. O ICNF criou a marca Natural.PT “Património Vivo”, com vista a promover de forma integrada o território e os serviços existentes na Rede Nacional das Áreas Protegidas (RNAP) e sua envolvente. Adicionalmente, foi criada recentemente uma aplicação móvel – NaturalPTrails – os melhores percursos de Portugal Natural –, que pretende divulgar alguns dos mais importantes percursos pedestres, cicláveis, equestres e de automóvel na RNAP, assim como os melhores produtos e serviços dos aderentes à marca em todas as áreas. Esta aplicação permite uma visitação orientada das Áreas Protegidas, promovendo o que de mais belo a natureza oferece. A combinação entre a visitação e a conservação dos valores naturais encontra aqui um instrumento privilegiado de utilização para todos. Estamos certos de que a experiência será sustentável e muito positiva.
De que forma é assegurada a monitorização dos recursos naturais na região e que medidas promove anualmente o ICNF neste âmbito?
O ICNF mantém uma presença activa no território, através das suas estruturas locais em vários pontos da região, onde desenvolvem actividade um conjunto de técnicas e vigilantes de natureza, para além de outros trabalhadores. Esta presença sente-se não apenas nas acções mais comuns de vigilância preventiva e fiscalização, mas também em matéria de regulação das actividades pela pronúncia do Instituto em processos de tomada de decisão e através do desenvolvimento de actividades de monitorização de espécies e habitats, com natural destaque para a comunidade de Golfinhos-roazes residentes no estuário do Sado, ou das espécies de aves que ocorrem nas extensas áreas da Reserva Natural do Estuário do Tejo, mantendo Estações de Esforço Constante em matéria de avifauna.
O Instituto considera que os meios no distrito são suficientes para enfrentar incêndios durante este Verão?
Não sendo o combate aos fogos rurais uma matéria da responsabilidade do ICNF, o conhecimento do trabalho de coordenação realizado pela Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil (ANEPC) faz-nos acreditar que estão asseguradas todas as condições para fazer face a eventuais ocorrências que se verifiquem.
Que trabalho está a ser realizado ao nível da formação e fiscalização?
Sobre esta matéria importa dizer que, sob a coordenação nacional da GNR, as acções de vigilância na região serão asseguradas por equipas diversificadas, quer com a participação de Vigilantes da Natureza e membros do Corpo Nacional de Agentes Florestais do ICNF, quer por patrulhas da GNR e com o apoio complementar de equipas de militares, através de um protocolo financiado pelo ICNF e que envolve na vigilância um conjunto de patrulhas do Exército e da Marinha.
Que atenção é dada às matas das zonas costeiras?
O Instituto mantém nos espaços sob a sua responsabilidade, o cumprimento dos planos de gestão aprovados para esses locais, garantindo a intervenção em matéria de prevenção estrutural e silvicultura preventiva. Não há risco zero, mas com o conjunto de medidas tomadas e com o esforço integrado de vigilância, e com o envolvimento e cuidado dos cidadãos, conseguiremos manter os nossos espaços florestais com as condições ideais de conservação e sustentabilidade.
O aeroporto do Montijo valerá os alegados riscos ambientais que os especialistas apontam?
O Aeroporto do Montijo foi sujeito a um processo de avaliação conduzido segundo a legislação em vigor, pelo que num estado de direito democrático, o que deve acontecer foi o que aconteceu. O que o ICNF pode assegurar, e que foi expresso no parecer emitido em sede de Avaliação de Impacte ambiental é que foram estabelecidas todas as condições para que deste projecto não decorram impactes negativos significativos que ponham em causa os valores naturais em presença. A abordagem do ICNF neste projecto foi, como é público, inovadora, introduzindo um mecanismo nunca antes utilizado em Portugal, que reforça a garantia de cumprimento das medidas a que o promotor está obrigado, reduzindo a margem de incumprimentos de forma a proteger os valores naturais sem onerar os contribuintes, com os custos daí decorrentes.
Que medidas estão previstas para a pesca lúdica na península?
A pesca lúdica tem vindo a manter o número de praticantes ao longo dos anos na região, pela proximidade de dois rios importantes como o Tejo e o Sado, e é naturalmente um critério de promoção desta actividade. Aproxima os cidadãos dos espaços naturais e, se realizada no cumprimento das regras estabelecidas, tem um potencial de envolvimento ainda que indirecto, destas comunidades no desafio da preservação de espécies e habitats. Diversos pescadores lúdicos, reportam frequentemente descargas ilegais de esgotos e outros resíduos para o meio hídrico, o que ajuda as autoridades a intervir e solver diversos constrangimentos ambientais a que as nossas massas de água estão ainda sujeitas.
Que mensagem quer deixar nas comemorações deste ano do Dia do Meio Ambiente?
O desafio que está lançado aos cidadãos e às comunidades implica todos numa tarefa de olhar para os nossos valores naturais – espécies e habitats – e adaptar a vida do dia-a-dia no respeito por estes valores. Se há conclusão que se pode tirar destes tempos de incerteza em que vivemos, é o facto de a vida humana não poder desligar-se da qualidade do habitat que suporta a presença do homem na Terra, e só a conservação das espécies e dos habitats e a manutenção do equilíbrio ecológico conseguirá assegurar a continuidade desta existência. Na região esses valores assumem um papel essencial no equilíbrio ecológico e o contributo de todos no dia-a-dia é determinante para assegurar esta tarefa que partilhamos.