As comemorações do centenário da morte do poeta em Setúbal, Lisboa e em várias cidades do Brasil, numa altura-chave para a afirmação do republicanismo, lembradas em livro
A obra “O Centenário de Bocage em 1905 (em Portugal e no Brasil)”, da autoria do historiador Álvaro Arranja, foi apresentada como “um marco na bibliografia passiva de Bocage” e “a consagração de um historiador de mérito”, nas palavras de Daniel Pires, presidente do Centro de Estudos Bocageanos (CEB). O lançamento do livro, editado pelo CEB, decorreu na Sala José Afonso, na Casa da Cultura, sábado à tarde.
Na obra, o professor e historiador Álvaro Arranja faz um “amplo relato” das comemorações do centenário da morte de Bocage (nascido em Setúbal em 1765 e desaparecido em 1805 em Lisboa) decorridas em Setúbal, Lisboa, Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco, situando os acontecimentos no período de afirmação do republicanismo que viria, em 1910, a pôr fim à monarquia portuguesa.
O centenário deu-se “na era final da Monarquia, do rotativismo monárquico e da ascensão do republicanismo. Tal como tinha sido o centenário de Camões em 1880 – um momento de afirmação do partido republicano – [Bocage] é muito colado com o movimento do partido republicano, que o apresenta como um poeta da liberdade, ‘querida e suspirada’, como diz um dos poemas”, explicou Álvaro Arranja.
Na obra relata-se o cortejo cívico que tomou conta das ruas de Setúbal, com “carros de instituições económicas e associações sindicais” e uma banda, as conferências que se fizeram e uma chegada de “comboios lotados” vindos de Lisboa, onde o Teatro Nacional D. Maria II teve em cena uma peça sobre Bocage. Em Setúbal, a famosa estátua só foi erigida em 1871, com dinheiros públicos angariados no Brasil.
Segundo Álvaro Arranja, “a figura de Bocage era quase tão popular no Brasil como cá” (mau grado o poeta só ter estado no Rio de Janeiro menos de dez dias em toda a sua vida). Houve ecos das celebrações do centenário na comunidade portuguesa e junto de poetas como Machado de Assis, Álvares de Azevedo e Olavo Bilac. Inclusive, na imprensa do Rio de Janeiro, com “destaques de primeira página”, tal como em títulos como o Diário de Notícias e a Ilustração Portuguesa, na altura a primeira revista de fotografia.
O historiador fez um levantamento exaustivo de recortes de imprensa da época para documentar e ilustrar a obra, o que para Daniel Pires, presidente do CEB, faz dela uma “iconografia de extrema relevância”. “São trazidos à consideração um número considerável de factos até agora desconhecidos dos biógrafos do escritor setubalense como é o caso, a título de exemplo, da fundação no Brasil da Associação de Socorros Mútuos em memória do poeta”, acrescentou.
Este é o segundo livro que Álvaro Arranja – vice-presidente do Centro de Estudos Bocageanos – escreve sobre Bocage, depois de ter publicado “Bocage – A Liberdade e a Revolução Francesa” em 2003. O livro – cuja capa mostra um rótulo de uma caixa de bolachas de uma empresa pró-republicana, em 1905 – vai estar à venda na Casa da Cultura.