26 Junho 2024, Quarta-feira

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Jorge Pisco: “O Orçamento do Estado não traz nada de novo para a região de Setúbal”

Jorge Pisco: “O Orçamento do Estado não traz nada de novo para a região de Setúbal”

Jorge Pisco: “O Orçamento do Estado não traz nada de novo para a região de Setúbal”

O responsável critica o Governo por não acolher nenhuma medida a pensar nas micro, pequenas e médias empresas. E diz que é impossível ao sector sobreviver com a actual carga fiscal

 

Jorge Pisco, 65 anos, presidente da Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas (CPPME), sediada no Seixal, considera que o Orçamento do Estado tem algumas medidas com impacto apenas para os grandes grupos económicos. Em entrevista a O SETUBALENSE e à Rádio Popular FM, o empresário faz o diagnóstico à situação empresarial no distrito, realça o papel da CPPME, apela a um maior contributo dos municípios e revela que o ministro da Economia vai estar no próximo dia 17 em Grândola para participar na conferência promovida pela CPPME e Pela CIMAL.

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Jorge Pisco deixa ainda escancarada a porta para se candidatar a um terceiro mandato na presidência da CPPME em 2024.

Os últimos tempos foram ou têm sido marcados por uma pandemia e pela guerra na Europa. Neste quadro que balanço faz do trabalho da CPPME, tendo em conta os resultados atingidos?

É de muita actividade desenvolvida nos últimos três anos, para não falar dos últimos 38 que são os anos que a CPPME leva de existência. A confederação tem tido um papel preponderante na defesa das micro, pequenas e médias empresas, que são 99,9% do tecido empresarial português. Assim que foi decretada a situação de covid apresentámos um conjunto de medidas importantes para a defesa dos interesses dos micro, pequenos e médios empresários e, a partir daí, tivemos um papel muito intenso junto do Governo, das autarquias, do Presidente da República, para alertarmos para a situação em que viviam milhares de microempresas e os seus trabalhadores.

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Considera que os resultados foram totalmente positivos?

Nunca podemos dizer que na totalidade são positivos. Nem sempre conseguimos aquilo a que nos propomos. Se as propostas que apresentámos ao Governo fossem contempladas, aí sim, a CPPME estaria satisfeita com todo o trabalho que faz. O Governo não tem vindo a ter em conta as propostas que a CPPME tem apresentado, tendo em conta aquilo que é o dia-a-dia deste tecido empresarial, como se viu durante a covid e neste momento com o próprio Orçamento do Estado.

Que peso assumem as micro, pequenas e médias empresas no contexto da nossa economia?

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Os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística [INE] são de Março de 2022. Os 99,9% do sector das micro, pequenas e médias empresas referem-se a 1 milhão e 301 mil empresas. Microempresas, as que têm de 1 a 9 trabalhadores, são 1 milhão e 250 mil; pequenas empresas, de 10 a 50 trabalhadores, são 42 mil; depois com mais de 50 e até 250 trabalhadores temos as médias, que são 6 500 empresas. Com mais de 250 trabalhadores, as grandes empresas – a quem o Governo presta vassalagem – são apenas 1 047. As micro, pequenas e médias empresas dão trabalho a mais de 3 milhões e 400 mil pessoas, representam 77% do total de trabalhadores a nível nacional e o volume de negócios produzido é superior a 300 milhões de euros.

A realidade a nível mundial são as micro e pequenas empresas. Não é só uma realidade portuguesa, é uma realidade mundial.

A atribuição, em Junho passado, da Ordem de Mérito Empresarial pelo Presidente da República à CPPME reconhece o papel que a confederação assume…

… Verdade. O Presidente da República honrou-nos com a distinção no 38.º aniversário da CPPME e mais: no seu discurso salientou que não há confederações de primeira nem de segunda. Isto tem a ver com o reconhecimento do trabalho da CPPME.

Que análise faz às medidas do Governo na proposta do Orçamento do Estado (OE) para 2024 com impacto para o sector empresarial?

Esta proposta de Orçamento nada traz de novo, nem responde às preocupações que as micro, pequenas e médias empresas têm. Tivemos uma reunião com a ministra do Trabalho [Ana Mendes Godinho] antes da apresentação do OE, apresentámos as propostas que considerámos que deviam ser contempladas, as quais fazem parte de uma “carta reclamativa” com 26 pontos para a legislatura 2022-2025, entregue ao Governo, e nenhuma dessas propostas foi contemplada no Orçamento do Estado para 2022, 2023 e 2024. As medidas que têm algum impacto são apenas para os grandes grupos económicos e para os grandes consumidores energéticos e isso, para nós, não traz de novo, antes pelo contrário, nem ajuda ao desenvolvimento da economia nacional.

Tem assento no Conselho Estratégico para o Desenvolvimento da Área Metropolitana de Lisboa (AML) e também na Comissão Executiva do PEDEPES, da Associação de Municípios da Região de Setúbal (AMRS). Ao olhar para este OE vê ou não o Distrito de Setúbal devidamente contemplado?

Não. Não traz nada de novo para as necessidades e o desenvolvimento da região de Setúbal. A região precisa de bastante desenvolvimento, precisamos de ter aqui verbas ou apoios. E isto não passa só pelo OE, passa também pelo Plano de Recuperação e Resiliência [PRR] que está completamente desfasado, os projectos que existem acabam por não ter a dimensão adequada para as micro e pequenas empresas. Se formos a outros aspectos, os fundos do [Portugal] 2020, que já deviam estar fechados e pagos, estamos em Outubro e o IAPMEI não fez esses pagamentos e não sabe ainda quando serão feitos. Andamos aqui a empurrar com a barriga. No âmbito da covid, as empresas tinham apoios financeiros a taxas de juro a 0%. Neste momento as taxas de juro dos spreads são de 4%. É impossível que as empresas possam sobreviver. Quando analisamos este OE, com as taxas de juro que existem, com os custos do actual contexto, com os custos da energia é impossível as empresas terem uma situação fácil de viver.

E o aumento do salário mínimo é comportável para as micro, pequenas e médias empresas?

Sempre temos defendido que quanto mais alto forem os salários, melhores condições as micro e pequenas empresas têm. Terão capacidade para pagar se existirem condições, por isso é que defendemos que elas têm de ter os apoios necessários: menos carga fiscal, menos despesas de contexto, que é aquilo que o Governo não aplica relativamente às microempresas. A carga fiscal que existe, os impostos que temos em relação à energia, aos combustíveis, é uma situação que tem de ser minorada. As empresas estão numa situação muito complicada.

De 1 a 10, como classifica o estado em que se encontram as micro, pequenas e médias empresas no Distrito de Setúbal?

Considero um 3, na situação em que se encontram neste momento.

É uma nota muito baixa.

É. A situação do distrito não é diferente da situação a nível nacional. O problema é que aquilo a que assistimos no dia-a-dia é que tudo isto aparece com uns tons muito rosa, tudo muito pintadinho. Nós estamos cá, no terreno, no dia-a-dia, e é o que constatamos quando falamos com os nossos colegas empresários, seja no comércio, na restauração, nas oficinas, na indústria… é a realidade que temos. Dou-lhe um exemplo concreto, no sector dos moldes temos neste momento 38 empresas na Marinha Grande em risco de fechar. Um sector em que Portugal deu algumas cartas. E depois fala-se muito na questão da exportação.

Qual a área do sector empresarial que, neste momento, o deixa mais tranquilo e, em sentido inverso, a que lhe gera maior preocupação?

Nenhuma me deixa tranquilo. Todas elas me deixam preocupado.

Nem mesmo o turismo?

A questão aqui é: o que é o turismo? O turismo pode ser muita coisa, as viagens, a restauração, o alojamento… É preciso é ver como as coisas vão fluindo e a realidade que temos não nos dá tranquilidade. Não é cenário negro, mas também não é um cenário rosa como nos querem pintar.

O que pode e deve fazer a nossa região para ter uma economia mais robusta?

Não é só a nossa região, isto é um problema geral. Ao longo destes últimos 38 anos, as autarquias locais têm sido nossas parceiras preferenciais. As autarquias têm aqui um papel preponderante nesta situação. Não é só aqui na nossa região, é a nível nacional, quando licenciam grandes superfícies estão a dar cabo do comércio local.

Mas o comércio local também não deveria reinventar-se para responder a esse novo sinal dos tempos?

Pois deveria e tem de se reinventar. Têm de se criar as condições para se reinventar. Mas quando se fala nesses apoios, o que vemos são apoios à digitalização, às novas tecnologias e não é isso que é necessário para esses empresários, muitos deles com idades muito avançadas. Temos de encontrar um equilíbrio entre aquilo que é a mercearia, a drogaria, e a grande superfície. É mais fácil irmos a uma grande superfície, termos estacionamento e a oferta de “tudo e mais um par de botas”, do que irmos [ao comércio local] e termos a dificuldade de estacionar dentro da cidade, termos de o pagar e depois termos a dificuldade de comprar no comércio local.

Temos visto municípios a apostarem em incubadoras de empresas, em “startups”, na nossa região. Como avalia o contributo dos municípios?

Acho que têm um papel fundamental, mas têm de melhorar muito. Não é com “startups” que lá vamos. Isso é uma coisa que nasce agora e que passado um ou dois anos desaparece. As câmaras municipais e não só, também as juntas de freguesia, têm aqui um papel fundamental. E por vezes os autarcas nas juntas de freguesia esquivam-se muito a ir junto dos empresários, junto da oficina, daquelas indústrias que existem e são necessárias conhecer. Era importante as juntas, as câmaras municipais, promoverem pequenas reuniões com esses empresários, conhecerem as dificuldades que têm esses empresários, mesmo por áreas de actividade.

A CPPME vai promover em Grândola a 17 de Novembro, em parceria com a Comunidade Intermunicipal do Alentejo Litoral (CIMAL), uma conferência sobre o futuro das pequenas e médias empresas. Qual é o objectivo principal desta acção, despertar consciências?

Despertar consciências e chamar a atenção para o maior volume de fundos que está previsto aplicar na área industrial no nosso país. É para esta região [Alentejo Litoral] que está previsto o maior fluxo de apoios para a indústria. E é preciso chamar a atenção para a repercussão que a aplicação desses fundos comunitários terá nas micro, pequenas e médias empresas. O objectivo desta nossa conferência é fazer uma avaliação e as implicações que estes fundos poderão ter. O Instituto Politécnico de Setúbal vai apresentar um estudo que fez sobre a realidade da força de trabalho das micro, pequenas e médias empresas no Alentejo Litoral. Vamos ter a intervenção do presidente comissão nacional do PRR, Pedro Dominguinhos, da parte do IAPMEI, sobre o resiliência das micro, pequenas e médias empresas. Ou seja, vai dar nota daquilo que são os fundos estruturais para a região. Vamos ter também uma conversa com empresários do Alentejo Litoral. Está garantida a presença da secretária de Estado [do Desenvolvimento Regional] Isabel Ferreira e a sessão de encerramento será presidida pelo ministro da Economia, António Costa Silva.

Está disponível para se recandidatar à presidência da CPPME, para um terceiro mandato, em 2024?

Neste momento estamos já a trabalhar para o próximo mandato. Se serei ou não presidente, dependerá da lista que iremos constituir. É uma questão que iremos avaliar do ponto de vista do colectivo. Da minha parte e, penso eu, da parte também dos meus colegas que compõem a direcção estaremos disponíveis. Mas teremos de fazer essa avaliação, não só do trabalho que realizámos como também do trabalho que nos propomos vir a realizar. Penso que estaremos disponíveis, a ver vamos, assim os associados queiram que continuemos.

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