Director do Serviço de Cirurgia diz que os principais problemas do Centro Hospitalar de Setúbal resultam, principalmente, das políticas de saúde que têm sido seguidas a nível nacional
Os médicos demissionários do Centro Hospitalar de Setúbal (CHS) defenderam hoje a reclassificação urgente daquela unidade hospitalar, e alertaram para a falta de cerca de 70 médicos e para a reforma de 20% a 25% dos clínicos nos próximos cinco anos.
O alerta foi deixado por uma delegação de quatro médicos do CHS, constituída por Isabelle Cremers, José Poças, Luís Cortez e Carlos Ribeiro, que foi ouvida na Comissão Parlamentar de Saúde da Assembleia da República, a pedido do Bloco de Esquerda.
“A classificação do hospital é um aspecto que é pouco conhecido. Se de todos estes assuntos só pudéssemos lutar por um, seria a reclassificação do hospital [do grupo C para o grupo D], passarmos para o grupo seguinte, porque seriamos financiados de outra forma”, disse Isabelle Cremers, médica do serviço de gastroenterologia do CHS.
“Nós temos uma área de atracção – Setúbal, Palmela e Sesimbra – que tem à volta de 250 mil habitantes, mas, na prática, recebemos também os doentes (cerca de 100 mil) do Litoral Alentejano, que nos foi retirado por uma decisão política, mas que na verdade, historicamente, sempre pertenceu ao Hospital de Setúbal, ao Centro Hospitalar de Setúbal. E os utentes do Litoral Alentejano consideram que são do Centro Hospitalar de Setúbal”, justificou.
Por outro lado, segundo Isabelle Cremers, o CHS recebe ainda muitos doentes da área do Centro Hospitalar do Barreiro e Montijo e até de Almada, porque ao longo de décadas se foi diferenciando, “pelo gosto e vontade dos médicos, mas, sobretudo, por necessidade dos doentes que atende”.
“A reclassificação permitiria um melhor financiamento ao hospital, renovar e modernizar os nossos equipamentos”, sublinhou.
Para o director do Serviço de Cirurgia, Luís Cortez, os principais problemas do CHS resultam, principalmente, das políticas de saúde que têm sido seguidas a nível nacional e esses problemas não podem, por isso, ser resolvidos a nível local, pelo Conselho de Administração do CHS.
“Quando se levanta a questão dos recursos humanos, de como captar profissionais, não é só uma questão do sector hospitalar, é uma questão do Serviço Nacional de Saúde. E há várias causas para isto”, disse Luís Cortez, que entre outras questões apontou a inexistência de uma “diferenciação entre o sector público e o sector privado” na área da saúde.
“Não há distinção, assistimos a saídas de recursos humanos [do sector público para o privado] consecutivamente, sobretudo nas especialidades mais carenciadas, que são as mais aliciadas pelo sector privado. É necessário definir uma política relativamente a isto, que poderá passar, ou não, pela dedicação [exclusiva]”, disse.
Além da falta de cerca de 70 médicos para dar uma resposta urgente à falta de pessoal no CHS, Luís Cortez alertou para a previsível aposentação de muitos médicos do actual quadro de pessoal, ao longo dos próximos cinco anos.
“Nós fizemos um levantamento e pensamos que, neste momento em termos de recursos médicos, há uma falta de cerca de 70 médicos. E, relativamente às aposentações, penso que nos próximos cinco anos são cerca de 20% a 25% dos actuais médicos do CHS que se irão reformar, o que aumentará a necessidade de recursos humanos”, indicou.
Para um Conselho de Administração, acrescentou, é muito difícil “conseguir captar recursos humanos quando eles são aliciados facilmente para outros sectores”, havendo ainda muitos casos de jovens que emigraram para outros países.
O médico José Poças, director do serviço de Infecciologia, que desde há muito tem vindo a dizer que o CHS está a caminhar para um “abismo”, lamentou que, neste momento, não se saiba sequer quem são os interlocutores e os prazos de resposta para os 87 médicos demissionários, que se solidarizaram com o pedido de demissão do director clínico.
“Temos um Conselho de Administração em que o presidente atingiu o limite de idade e é público que se irá aposentar, a mesmo coisa para o director clínico. E temos um dos elementos do Conselho de Administração do CHS com uma situação grave de saúde e, portanto, também não pode dar o seu contributo. E eu pergunto: o que vai ser feito deste hospital, quem são as suas hierarquias, com quem vamos poder dialogar?”, questionou José Poças.
Na audição da Comissão Parlamentar de Saúde, os médicos defenderam ainda que a ampliação do Hospital de São Bernardo, tal como foi apresentada aos médicos, é insuficiente para incorporar o Hospital do Outão, intenção que foi anunciada pelo actual Governo do PS, mas que nunca agradou aos profissionais de saúde do CHS.
GR / Lusa