Autor dos disparos que vitimaram Gurpreet Singh disse, em tribunal, que queria assustar os moradores daquela casa por assediarem a mãe
Ângelo e Fábio Guterres, irmãos de 31 e 25 anos, começaram a ser julgados no Tribunal de Setúbal pelo homicídio qualificado motivado por ódio racial de Gurpreet Singh, indiano de 24 anos, em Novembro de 2023 a tiro de espingarda numa casa onde residiam seis cidadãos indostânicos.
Em tribunal, Ângelo, autor dos disparos disse que queria assustar os moradores daquela casa por assediarem a mãe. “Eu estava muito drogado. Nunca fui racista, sempre trabalhei com indianos e nepaleses, sempre me dei bem com essa gente”. O irmão, acusado por fazer de vigia durante o crime, não prestou declarações.
O Ministério Público (MP) sublinha que o arguido não sabia quem tinha assediado a mãe e que quis “tirar a vida a qualquer cidadão indiano que ali morava”. O crime aconteceu na noite de 5 de Novembro de 2023, na Rua Engenheiro Ribeiro da Silva, na localidade de Praias do Sado, em Setúbal. A vítima mortal, Gurpreet Singh, 24 anos, estava no quarto quando foram disparados dois tiros de espingarda pela janela, atingindo-o no peito. Major Singh, um dos seis moradores, foi atingido no braço, num segundo momento, na cozinha e conseguiu retirar a arma ao arguido já na rua.
De acordo com o MP, o arguido, embriagado, saiu de um café onde discutiu com outros cidadãos indianos por julgar que tinham assediado a mãe e dirigiu-se a casa de um amigo, que residia junto a uma casa onde moravam vários indianos na Rua Engenheiro Ribeiro da Silva. “Aí avistou Major Singh e suspeitando que tinha sido um dos que tinha importunado a mãe, tentou falar com ele, mas este não percebeu o que disse”. Ângelo avistou outros indianos dentro de casa, saiu e disse que voltava, fazendo sinal da cruz no peito e benzeu-se.
O arguido ligou ao seu irmão, Fábio, pediu-lhe a espingarda ilegal e contou o plano, a que o irmão acedeu. “Os arguidos queriam tirar a vida a qualquer cidadão indiano que ali morava”, pode-se ler na acusação.
Lá chegados, levantaram o estore de um dos quartos onde estava Gurpreet, voltaram a fechar e Ângelo disparou duas vezes, atingindo fatalmente o indiano no peito. Depois acedeu ao pátio das traseiras pelas garagens e encarou Major Singh, disparando outras duas vezes. Atingiu-o no ombro. Os dois voltaram a encarar-se na frente da habitação e o ferido conseguiu tirar a arma a Ângelo, que depois fugiu com o irmão. O MP concluiu que “os arguidos decidiram matar Gurpreet Singh e Major Singh por se tratarem de indivíduos de nacionalidade indiana e como retaliação contra indivíduos daquela nacionalidade e para causar temor naquela comunidade”.
Em tribunal, Ângelo negou a versão do MP e disse que quando estava com o seu amigo foi atacado por um dos indianos. “Não lhe disse nada e um deles agrediu-me com um pau e esfaqueou-me no peito. Saí e não fiz qualquer sinal de cruz”. Ângelo contou não foi esta agressão que o moveu de regressar com uma espingarda, mas sim o que aconteceu com a mãe. “Nunca os tinha visto, mas pela descrição que a minha mãe deu, percebi que eram eles”.
O arguido disse que pediu ao irmão a espingarda, mas que agiu sozinho. “Entrei pela garagem e disparei contra uma janela, depois saí para a rua e quando estava de arma apontada a uma janela, fui agarrado e a arma disparou duas vezes”. Ângelo explicou que nesse domingo estava muito drogado. Só os queria assustar por terem assediado a minha mãe, não quis matar ninguém”.
Ângelo está acusado de, momentos antes do crime, ter ameaçado com uma espingarda um amigo para o acompanhar à casa dos indianos. Queria “comparsas”, aponta o MP.