O líder da concelhia socialista explica as quatro renúncias de eleitos do partido e a retirada da confiança política à vereadora Susana Pádua
Rodrigo Charrua mostra-se confiante num inédito triunfo do PS em Santiago do Cacém nas autárquicas de 2025, apesar da actual divisão interna no partido. Em entrevista a O SETUBALENSE, a que acedeu responder por escrito, o líder da concelhia salienta as ausências de Ricardo Cruz, Mário Ciríaco e Ana Bernardino das reuniões da Assembleia da União das Freguesias de Santiago do Cacém e diz que Artur Ceia não consegue trabalhar em equipa, apesar de lhe reconhecer competência. E lembra que interpôs uma queixa contra a vereadora Susana Pádua por difamação.
Como explica as renúncias de Ricardo Cruz, Mário Ciríaco e Ana Bernardino na Assembleia da União das Freguesias de Santiago do Cacém, que o acompanhavam na bancada do PS? Alegam falta de estratégia da concelhia a que preside…
Sempre mantive uma boa relação pessoal com os três camaradas, que estimo e considero, por isso o que direi a seguir apenas reflecte a questão política. Faço questão que isto fique claro, porque na política não pode valer tudo.
Debater e argumentar é positivo, mas não me revejo na discussão de assuntos internos de um partido em redes sociais, especialmente quando a mesma não é precedida de qualquer esforço prévio para conversa, discussão e concertação internas. Penso que, para as pessoas em geral, o mais importante será esclarecer alguns factos que lhes permitam formar a sua própria opinião. Por exemplo, o líder da bancada, Ricardo Cruz, que é por inerência membro da Comissão Política Concelhia, poderia, nessa qualidade, ter apresentado propostas de estratégia política, porém optou por nunca estar presente nas reuniões da concelhia.
Quanto às iniciativas promovidas, a ausência estende-se a todos os três camaradas. Em relação às reuniões na Assembleia da União das Freguesias de Santiago do Cacém, Santa Cruz e São Bartolomeu, lamento ter de o dizer, mas o líder da bancada faltou a metade das reuniões e, no ano passado, apenas esteve presente uma vez. Também outro dos elementos que agora renunciou esteve ausente em metade das reuniões e o terceiro faltou várias vezes. Ao longo deste mandato, a Secção do Partido Socialista de Santiago do Cacém teve de proceder a inúmeras substituições.
Portanto, estas renúncias parecem-me uma consequência normal de três anos de ausências, camufladas por alegadas discordâncias nunca assumidas no momento ou local próprio, visto que nunca sequer nos foi solicitada qualquer reunião.
Antes Artur Ceia renunciou ao mandato de vereador e alegou também divergências políticas consigo. Já são quatro renúncias. O que lhe diz isto?
Pessoalmente, lamento este desfecho. Sempre considerámos o camarada Artur Ceia um bom elemento, com capacidade política para representar e defender os ideais do partido em prol do município. Infelizmente, e temos de o assumir com frontalidade, a avaliação que fizemos no Secretariado, desconhecendo ao certo os motivos, é que, não obstante a sua competência individual, o Artur não conseguiu trabalhar em equipa. Apesar de existirem algumas dificuldades de comunicação, tentámos trabalhar com o camarada Artur Ceia de forma leal e pró-activa, até ao dia em que o nosso antigo vereador decidiu sair do grupo de coordenação política. Existem outros aspectos que não correram bem e que se encontram documentados internamente.
Além disso, é público que discordamos do voto favorável ao Orçamento e Grandes Opções do Plano do PCP, mas acredito que devemos sempre agradecer aos eleitos que, de forma voluntária e sem contrapartidas pessoais, aceitam a responsabilidade e dão o seu melhor ao partido e à população. O camarada Artur Ceia pertence a esse grupo e, apesar das divergências, agradecemos o seu esforço e dedicação.
De permeio, foi retirada a confiança política à vereadora Susana Pádua, que se diz alvo de acusações infundadas…
Acusações infundadas? Apenas imaturidade política poderia considerar infundada uma retirada de confiança política quando se vota a favor do Orçamento e das Grandes Opções do Plano do PCP. Como tem existido demasiado ruído sobre este assunto, é importante os leitores saberem que a retirada da confiança política foi votada favoravelmente por 88% dos presentes na Comissão Política Concelhia. A percentagem podia até ter sido superior, se os elementos do secretariado que tomaram posse nessa noite não estivessem impedidos estatutariamente de votar. Apenas 8% votaram contra. Foi um resultado claro e inquestionável.
Porém, a situação da vereadora Susana Pádua não é comparável com nenhuma das anteriores, pois trata-se da anterior presidente da concelhia. Se recuar no tempo, durante o acto eleitoral em 2022, procurou dificultar o voto aos nossos militantes que se encontram inscritos nas Secções de Santiago do Cacém, Ermidas Sado e Cercal do Alentejo, tentando que, pela primeira vez na história do PS no nosso concelho, tivessem de se deslocar a Vila Nova de Santo André para votar. Por exemplo, quem é do Cercal, em vez de ir ao centro da sua localidade, no Largo dos Caeiros, teria de fazer 84 km (ida e volta).
Face aos resultados eleitorais, a camarada Susana Pádua manifestou o seu repúdio pela minha vitória. Um aspecto, que fora do conjunto poderia ser somente caricato, é que não me chegou a felicitar, como é vulgar suceder em qualquer acto eleitoral num país democrático. Nunca esteve presente em nenhuma das posteriores iniciativas da concelhia, nem sequer nos eventos de homenagem aos nossos antigos presidentes de junta de freguesia ou ao histórico camarada Carlos Amândio.
Nunca nos entregou qualquer documento do seu mandato, pelo que desconhecemos onde se encontra o expediente, as actas do seu secretariado e das comissões políticas concelhias, e onde está a documentação do processo autárquico de 2021, incluindo o dossier financeiro da campanha. Ou seja, tem sido alguém que nunca colaborou com a concelhia eleita, que lhe sucedeu, e que, desde essa altura, sempre buscou o conflito, criando inclusive situações que me levaram a apresentar uma queixa-crime por difamação.
Havia muito mais a dizer, mas sobretudo lamento que esta senhora, eleita com os votos dos socialistas do concelho, prefira alimentar guerrilhas no Facebook e intrigas internas do que centrar-se naquilo que mais importa, que seria fazer oposição ao PCP.
Apelo aos militantes que a têm apoiado para que se limitem a analisar os factos, sem preconceitos ou juízos de valor. Estou disponível, como sempre estive, para conversar pessoalmente com cada um dos militantes que possa estar menos esclarecido ou que deseje conhecer a outra face da moeda.
Não considera que todos estes episódios acabam por fragilizar o PS no concelho, a pouco mais de um ano de eleições? Na Câmara, por exemplo, o partido perde representatividade.
Concordo quando diz que o partido perde representatividade na Câmara. Repare, isso sucede logo porque a vereadora Susana, não obstante rejeitar trabalhar com as estruturas eleitas, opta por se manter em funções. Apesar de nunca podermos considerar positivo o que está a suceder, o PS de Santiago do Cacém irá sair fortalecido.
O espírito de união entre militantes é muito relevante e, todos os dias, sou também contactado por cidadãos independentes que me manifestam solidariedade e que nos motivam, rumo às eleições do próximo ano. 50 anos sempre com o mesmo partido no poder é excessivo. A população também reconhece o mérito e o valor dos nomes que nos apoiam, sabendo distinguir entre o importante e o meramente conjuntural. Comigo e com a minha equipa estão antigos presidentes de concelhia, antigos candidatos a presidente de câmara ou assembleia municipal e antigos vereadores, como Arnaldo Frade, Alexandre Rosa, Hugo Ferreira, Óscar Ramos, Francisco Carrajola, António Abreu ou Carlos Amândio, entre muitas outras personalidades.
A confiança do eleitorado no PS pode sair abalada ou não?
Tenho a certeza que não e estou a responder-lhe com toda a sinceridade. As eleições internas ocorreram muito recentemente, existiram férias, mas estamos a trabalhar com vista às autárquicas de 2025. É uma responsabilidade que assumimos com determinação, pois a população do concelho merece outro patamar de desenvolvimento. Precisa de esperança. De acreditar que é possível fazer mais e melhor. É com esse pensamento que nos levantamos todos os dias e que estamos a trabalhar. Vamos incluir independentes, iniciar um ciclo de workshops e promover contactos directos com o movimento associativo e com a população. O PCP é hoje um partido esgotado, que vive fora da realidade e cujo poder é prejudicial para o concelho, porque se centra na sua própria sobrevivência e não no desenvolvimento do território. Estou certo de que, no próximo ano, a população vai querer mudar.
O que diz a distrital sobre tudo isto? Tem sentido apoio da estrutura federativa?
A federação tem apoiado sempre a concelhia. A abertura da nossa sede em Santiago do Cacém é a melhor prova. Além da federação, é justo agradecer aos cerca de 12 camaradas que também colaboram com os seus donativos para o pagamento da renda e das demais despesas da sede. Regressando à questão, aproveito para elogiar e agradecer o trabalho do camarada António Mendes e, agora, da camarada Eurídice Pereira, ambos políticos com enorme experiência e dedicação à população do distrito de Setúbal e à nossa concelhia em particular. Mas, permita-me que fale do futuro. Em breve, iremos ter um novo presidente da federação, o camarada André Pinotes Batista, que conta com o nosso apoio. Confiamos na sua capacidade de diálogo e contamos com ele para nos proporcionar as melhores condições com vista à vitória nas autárquicas. Sabemos que o vai fazer.