Novo espaço digital inclui roteiro das fontes de pesquisa da vida contemporânea
A Fundação Amélia de Mello (FAM) apresentou na última sexta-feira o site do seu arquivo histórico, situado no parque empresarial da Baía do Tejo, no Barreiro, que está agora disponível a todos online para visualização futura. Jorge Quintas, secretário-geral da instituição considera que a nova ferramenta disponibiliza um acervo documental considerado “muito rico”, que foi herdado do complexo da CUF – Companhia União Fabril –, pela Bondalti.
Neste repositório, tanto os investigadores como a população em geral podem encontrar a documentação doada pela empresa à fundação, constituída por 240 mil registos. “Em 2018 iniciámos um processo de tratamento arquivístico” e “procurámos em Portugal empresas que pudessem ajudar a fazer o tratamento de um mega-arquivo”. O responsável adianta que “selecionámos, inventariámos e classificámos todo esse trabalho com a colaboração científica da Nova SBE e de uma equipa que esteve envolvida” numa parceria que remonta a 1982, com os documentos mais antigos a remontar ao final do século XIX até 2007.
Com temáticas variadas, os cerca de três quilómetros e meio de documentação, parte dela já digitalizada e disponível, inclui um leque variado de ficheiros nos quais se incluem 55 mil fotografias em vários suportes e 135 mil plantas e desenhos produzidos pelos serviços técnicos do grupo CUF, que chegaram à fundação para preservação da memória daquele complexo.
“A memória para nós tem uma preocupação muito grande, porque serve para [apreciarmos] o conhecimento científico [a partir do qual se desenvolveu] o propósito da fundação”, acrescenta o responsável, para que todos possam aceder remotamente ao acervo e a tudo que integra este espaço. Em curso está ainda “a incorporação de outros fundos de natureza empresarial, como sejam documentos históricos da CUF, dos anos 90 e 2000”, sendo actualmente um grupo considerado relevante na área da saúde.
“Quando falamos do parque empresarial da Baía do Tejo, falamos da Cidade dos Arquivos, iniciativa promovida pela Câmara do Barreiro, a que aderiram os arquivos instalados neste parque”, sublinha Jorge Quintas, entre os quais a Associação Ephemera, o arquivo dos portos de Lisboa, Setúbal e Sesimbra (APLLS), o Espaço Memória e o próprio repositório daquele espaço. E acrescenta: “Quero deixar o convite aos investigadores e às pessoas interessadas que possam investigar, conhecer e olhar sobretudo para uma memória ao serviço do futuro e não do passado”.
Gilberto Gomes, do Arquivo CUF – Alfredo da Silva, por sua vez, lembrou que tudo começou com a necessidade de dar um futuro à documentação que estava um pouco espalhada pelas várias dependências, fábricas e serviços centrais do complexo. Isto numa altura em que foi formado um grupo de trabalho que teve por missão avaliar os acervos acumulados ao longo de 100 anos e apontar um conjunto de soluções para concentrar este espólio. “Foi decidido colocar os arquivos nas instalações das antigas fábricas do Barreiro”, recorda, num trabalho iniciado com uma avaliação do que existia e de uma metodologia para o seu tratamento.
Desde há quatro anos, a FAM aceitou o desafio de tratar, conservar, descrever e divulgar toda esta herança, proporcionando agora ao público o acervo do maior grupo empresarial que existiu em Portugal.
TESTEMUNHO: Três quilómetros de história contemporânea de Portugal
Criado em 2021, no âmbito das comemorações dos 150 anos do nascimento de Alfredo da Silva, neste espaço encontra-se o testemunho da maior empresa do sector químico desde o final do último século, com temas variados e “que são importantes para a história económica e empresarial”, assegurou Álvaro Ferreira da Silva, professor associado da Nova School of Business and Economics (Nova SBE).
“Se quisermos saber qual foi o impacto em termos de transformações tecnológicas e organizativas, das opções estratégicas de Alfredo da Silva, temos neste arquivo informação detalhada sobre essas opções”, adianta, considerando que o mesmo é “fundamental para conhecermos e compreendermos o papel [e] a acção de empresários industriais para a transformação do Portugal contemporâneo”.
A administração da empresa deparou-se no passado “com desafios novos no plano social” no domínio da habitação, saúde e do ensino, que marcaram gerações de trabalhadores da então vila do Barreiro e que são hoje essenciais a estudantes de doutoramento e mestrado, que podem encontrar online todas as funcionalidades arquivísticas de “Um Passado com Futuro”.
Após o trabalho de selecção, inventariação e catalogação, iniciado em 2018, a FAM “deu um passo decisivo para transformar este património [numa] fonte de conhecimento”, sendo raros os arquivos privados de empresas no País, assim como os que “alcançam esta dimensão e espessura temporal”. No local é ainda possível encontrar esporadicamente, documentação de outras empresas do grupo.